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Como valor do salário mínimo é definido e por que não é de R$ 6.500?

Maria Luiza Pereira

Colaboração para o UOL, em São Paulo

02/05/2022 04h00Atualizada em 06/07/2022 16h18

O salário mínimo no Brasil em 2022 é de R$ 1.212. Segundo cálculos do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), o valor deveria ser de R$ 6.527,67 em junho para suprir as necessidades básicas de uma família de quatro pessoas.

O salário mínimo oficial é determinado por lei e abrange todo o território nacional, incluindo trabalhadores rurais e urbanos. Mas por que ele não chega a esse valor do Dieese. Como ele é determinado?

Fatores econômicas determinam valor

"O salário mínimo é determinado por fatores econômicos e políticas sociais. No Brasil, por exemplo, até 2019, levava em consideração o Produto Interno Bruto (PIB) do ano anterior e a inflação no país de acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) do mesmo período. A partir de 2020, passou a ser reajustado apenas pelo INPC", diz o advogado Francisco de Assis Brito Vaz, sócio da área trabalhista do escritório SiqueiraCastro.

Cada país determina uma regra sobre o seu salário mínimo. O do Brasil foi criado em 1940, no governo de Getúlio Vargas. O objetivo era dar condições às famílias de comprar o mínimo de alimentos e manter outros gastos, como moradia e transporte. Ao longo dos anos, podem ocorrer perda do poder de compra, por causa da inflação, que nem sempre é reposta.

Os especialistas dizem que a economia do país limita os aumentos. Nem as empresas nem o governo conseguiriam manter os gastos com um salário mínimo muito alto, segundo eles.

Empresas demitiriam se salário fosse maior

Para os analistas, um aumento considerável do valor do salário mínimo acarretaria em mais demissões, pois as empresas não teriam dinheiro para pagar os funcionários.

"O dilema do salário mínimo é que, caso ele seja muito baixo, precariza as relações de trabalho. E um salário mínimo muito alto tem o mesmo efeito, por causa das demissões e da informalidade de trabalho", diz o economista Marcelo Neri, da FGV (Fundaçao Getulio Vargas). A informalidade é a contratação de trabalhadores sem carteira assinada. Nesse caso, a empresa evita pagar o salário mínimo.

Para Paulo Feldmann, professor de economia na USP (Universidade de São Paulo), é possível aumentar o salário mínimo somente quando a economia está bem, porque isso evitaria demissões.

"O aumento do salário mínimo foi muito grande entre 2007 e 2010, e isso foi ótimo naquele momento, pois o desemprego estava em queda e o consumo estava aumentando. As empresas tinham condição de pagar seus funcionários. Mas foi um momento econômico muito diferente do atual", diz.

Salário impacta também as contas públicas

O salário mínimo não afeta só as empresas privadas. Vários gastos públicos estão ligados a ele, como aposentadorias do INSS e benefícios sociais para famílias pobres.

"O nosso salário mínimo tem um grande impacto sobre a previdência, porque o rendimento dos aposentados também é regulado pelo seu valor. Quando aumenta o salário mínimo, o governo tem que aumentar o valor da previdência", explica Feldmann.

"Fora isso, um sério problema para as contas do governo são as pessoas que nunca contribuíram com a previdência e que hoje recebem um salário mínimo."

Além de aposentadorias, diversos benefícios e políticas de transferência de renda também sobem quando o salário mínimo é reajustado, como o BPC (benefício de prestação continuada, pago a idosos e deficientes de baixa renda), seguro-desemprego e abono salarial.

O salário mínimo ideal pode ser uma realidade?

Segundo Feldmann, os cálculos do Dieese levam em conta os gastos básicos, mas estão distantes da realidade.

"Apesar de ser bastante válido o cálculo, os valores são completamente diferentes do que é hoje o salário mínimo. E cerca de 70% dos brasileiros não ganham nem sequer R$ 3.000 por mês. A proposta do Dieese é mostrar que a renda do Brasil é muito baixa, embora o valor que eles sugerem não seja viável economicamente porque as empresas não teriam condição de pagar nem a metade disso", declara.

Alternativas para a situação

Não há uma solução fácil e rápida quando se fala em aumento do salário mínimo sem ter como contrapartida o crescimento do desemprego e a alta inflacionária, mas os especialistas analisam os diversos fatores econômicos envolvidos nessa questão.

"Para se chegar a um patamar de salário mínimo mais digno sem ter como consequência esses efeitos colaterais, seria necessário aumentar a produtividade de modo proporcional, o que depende, entre outros fatores, de políticas públicas capazes de alavancar a economia, reduzindo as desigualdades sociais, começando pela melhoria na educação e buscando uma maior qualificação da mão de obra.", afirma Brito Vaz, da SiqueiraCastro.

Para Juliana Inhasz, coordenadora do curso de Economia do Insper, a primeira medida seria o governo ajustar a dívida pública e controlar a inflação.

"O governo precisa analisar os problemas estruturais da economia com bastante atenção. É só resolvendo essas questões que o Brasil vai crescer economicamente, e é crescendo economicamente que vamos ter condições de pagar um salário mínimo maior."