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Pão por unidade? Jovens se espantam ao saber que venda nem sempre foi em kg

Jovens nas redes sociais se dizem espantados que o pão de sal tenha sido vendido por unidade até 2006 - iStock
Jovens nas redes sociais se dizem espantados que o pão de sal tenha sido vendido por unidade até 2006 Imagem: iStock

Weudson Ribeiro

Colaboração para o UOL, em Brasília

01/06/2022 15h00

Foi durante um café da manhã com o namorado que a ciberativista Carolline Sardá, 24 anos, conta ter descoberto que, até a primeira metade dos anos 2000, o pão francês era vendido por unidade no país. "A gente falava sobre como o pão está caro e ele disse sentir saudades de quando ia à padaria com R$ 2,50 e voltava com 10 pães para casa", disse ela ao UOL.

O debate, levado por Carol ao Twitter, viralizou e marcou mais um choque entre gerações nas redes sociais. "Tem gente que acha que está muito velha por eu não me lembrar dessa transição, que rolou quando eu tinha 9 anos", brinca.

Carol integra a chamada geração Z, de jovens nascidos entre 1996 e 2012. O namorado, o tatuador Guilherme Romero, 27 anos, é um millennial. "Ele fez parte desse grupo que ia à padaria quando era criança e se lembra dessa mudança de como pães eram vendidos — que eu não testemunhei", disse.

Ao UOL, Romero afirmou ter ficado surpreso com a repercussão do tweet da namorada. "Nós fomos criados em Estados diferentes. Eu nasci no Rio, e ela, em Santa Catarina. Acredito que isso tenha influenciado essa percepção", afirma o tatuador.

Mas, é por quilo ou por unidade?

Pelas redes sociais, consumidores relatam que há cidades em que algumas lojas físicas vendem o produto com preços que vão de R$ 0,40 a R$ 1 por unidade. Mas a prática é proibida, segundo o Procon (Programa de Proteção e Defesa do Consumidor).

De acordo com o órgão, a venda por unidade é passível de multa, que pode chegar a R$ 100 mil. A determinação vale para qualquer tipo de estabelecimento. A regra foi implantada para padronizar o quanto o consumidor deve pagar pelo produto que leva para casa (leia mais abaixo).

E nas vendas online?

O UOL consultou o site de supermercados dos três maiores grupos varejistas que operam no Brasil: Carrefour, Assaí e GPA (Grupo Pão de Açúcar). Desses, só Extra e Pão de Açúcar, ambos da rede GPA, oferecem a opção de compra de pães de sal por unidade, com preços de R$ 0,94 a R$ 1 para cada 50g do produto.

No iFood, o preço cobrado pela unidade do pão francês integral passa de R$ 1. Inmetro não especifica se regra sobre pesagem vale para apps - Reprodução/iFood - Reprodução/iFood
No iFood, o preço cobrado pela unidade do pão francês integral passa de R$ 1. Inmetro não especifica se regra sobre pesagem vale para apps
Imagem: Reprodução/iFood

A reportagem também tentou efetuar compras por meio dos aplicativos iFood, Zé Delivery e Rappi. Nesse caso, só o iFood tem lojas cadastradas que vendem pães com valores que vão de R$ 1 a R$ 1,89 por unidade, sem especificar o peso do produto.

Em abril de 2021, o Inmetro (Instituto Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial) definiu que o pão francês deve ser comercializado só pelo peso —e não por valor unitário. Ao UOL, o órgão informou que a regulamentação metrológica em vigor não faz distinção entre pontos de venda físicos ou virtuais. "Assim, o comércio virtual deve atender às mesmas especificações estabelecidas para os pontos de venda físicos, não havendo nenhum tipo de exceção", afirmou.

Questionadas sobre quais medidas têm tomado para obedecer a determinação de pesagem do Inmetro, as empresas citadas também não haviam se posicionado até a última atualização desta reportagem. O texto será atualizado em caso de eventuais manifestações.

Mudança de regras para venda por quilo

Mas, afinal, quando o pãozinho começou a ser cobrado por quilo? Até 2006, o pão francês era vendido de acordo com regulamento de uma portaria do Inmetro publicada em 1997, que estabelecia que o produto poderia ser comercializado a peso ou em unidades de peso nominal definido, que variava de 50 g a 1 kg.

Segundo a norma, para unidades com peso inferior a 30 g, a venda só poderia ser realizada por pesagem, na presença do consumidor. O problema, segundo o presidente da Abip, Paulo Menegueli, é que, para evitar problemas com a fiscalização, a panificadoras produziam pães com gramas a mais — excedente que, em geral, não era repassado ao cliente.

"Por outro lado, alguns comerciantes aumentavam a fermentação e vendiam o pão a preço de 50g. Então, o consumidor pagava caro por um produto oco. Com a atualização da norma, o consumir passou a pagar um preço justo", afirma.

Para tentar diminuir o nível de erros e trapaças na pesagem do pão francês vendido por unidade, outra portaria do Inmetro definiu, em 2006, que padarias e supermercados só poderiam vender pão francês por quilo. Foi nessa época que o tamanho do pão de sal começou a minguar — resultado de uma tentativa das padarias para evitar o aumento no preço do produto.

O método de cobrança foi escolhido por meio de uma consulta pública promovida pelo Inmetro durante dois meses. Segundo a pesquisa, mais de 70,3% dos 1.041 entrevistados disseram preferir comprar o pão por quilo.

A mudança, que recebeu o apoio dos sindicatos e associações do setor de panificação do país, na prática, desagradou alguns consumidores que passaram a gastar mais com o produto.

Professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e pesquisador do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), o economista André Modenesi diz que é difícil estimar quanto o pão custaria hoje, considerando ajustes inflacionários, se a cobrança fosse mantida por unidade.

"O pão tem formas, pesos e tamanhos diferentes em um mesmo estabelecimento. Não é comparável a uma televisão, por exemplo, cujo preço é passível de ser controlado a depender de quantas polegadas tem cada aparelho. No caso do pão, a venda a quilo visa a coibir estratégias que vendedores de má-fé poderiam usar para maquiar o preço. É uma medida de proteção ao consumidor", analisa.

Conflito na Ucrânia encareceu o pãozinho

Levantamento da Abia (Associação Brasileira da Indústria de Alimentos) mostra que o preço do trigo teve alta de 2,3%, de março a abril de 2022, influenciados pelo conflito entre Rússia e Ucrânia, iniciado em fevereiro.

Considerando a variação anual (abril de 2021 a abril de 2022) no mercado interno, a tonelada do cereal subiu 18,5%, chegando a R$ 1.903.