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Com lockdowns na China, exportações do Brasil ao país caem 11% neste ano

Portos chineses estão recebendo menos minério de ferro do Brasil, em função dos lockdowns  - Jason Lee/Reuters
Portos chineses estão recebendo menos minério de ferro do Brasil, em função dos lockdowns Imagem: Jason Lee/Reuters

Fabrício de Castro

Do UOL, em Brasília

16/06/2022 04h00

O fechamento de cidades na China nos últimos meses, em função da pandemia de covid-19, já tem reflexos para a balança comercial do Brasil. De janeiro a maio, o volume total de produtos exportados do Brasil para a China recuou 11,2% na comparação com o mesmo período do ano passado. No caso do minério de ferro —produto mais afetado—, a queda foi de 7,76%.

Os dados da Secex (Secretaria de Comércio Exterior), do Ministério da Economia, mostram que as exportações de minério de ferro do Brasil para a China somaram 77,62 milhões de toneladas no acumulado de janeiro a maio deste ano. No mesmo período de 2021, o volume havia sido de 84,15 milhões de toneladas.

Considerando todos os produtos exportados, o volume dos cinco primeiros meses de 2022 foi de 124,92 milhões de toneladas. No mesmo período de 2021, a soma foi de 140,61 milhões de toneladas.

A seguir, é possível verificar os volumes mensais de minério de ferro e soja (os dois principais produtos) embarcados para o país asiático e as exportações totais (considerando todos os produtos).

Impactos do lockdown

Maior cidade da China, com 25 milhões de habitantes, Xangai ficou por dois meses em lockdown (confinamento). Neste período, a população era orientada a ficar em casa, e o governo manteve um controle rígido sobre a circulação. As restrições foram suspensas em 1º de junho para cerca de 22,5 milhões de pessoas.

Em 9 de junho, no entanto, a administração de Xangai voltou a fechar sete distritos, após o surgimento de novos casos de covid-19. Apenas um dos distritos reunia 2,5 milhões de moradores, o que dá uma ideia do impacto da medida para a população em geral e para a atividade econômica.

Além de Xangai, a capital Pequim foi alvo de lockdown nos últimos meses, assim como outras dezenas de cidades chinesas. O fechamento das cidades foi consequência da política de "covid zero" implementada pelo governo.

Especialista em Economia Internacional, o professor Simão Davi Silber, da USP (Universidade de São Paulo), afirma que o fechamento de cidades chinesas, que impacta a atividade econômica no país, acaba afetando o comércio com o Brasil.

O lockdown prejudica o Brasil, porque a China terá um crescimento menor este ano com o abre e fecha nas cidades. Como a cada surto há o fechamento dos portos chineses, tanto para exportar quanto para importar, isso atrapalha duplamente o Brasil: na venda e na compra de produtos.
Simão Davi Silber, professor da USP

Os lockdowns têm reduzido as expectativas para a economia da China em 2022. Silber lembra que a estimativa de crescimento do governo chinês para o PIB (Produto Interno Bruto) este ano era originalmente de 5,5%.

"A última estimativa é de que, em vez de crescer algo em torno de 5,5%, a China crescerá 4,7% ou 4,8% em 2022", diz o professor.

A economista Lia Valls, pesquisadora associada do Ibre FGV (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), no Rio de Janeiro, também cita a diminuição das projeções para o PIB chinês.

A China havia crescido muito em 2021, um percentual de 8,1%. O governo já estava esperando por um pouco de desaceleração. Só que o compromisso que o partido chinês havia estabelecido, que seria de PIB de 5,5% em 2022, está mais difícil de ser alcançado. Na medida em que a China fecha as cidades, ela reduz a atividade. Até porque o país já estava em um processo de mudar seu modelo de desenvolvimento, do investimento em infraestrutura para uma economia pautada no mercado interno.
Lia Valls, pesquisadora do Ibre FGV

Minério de ferro

Com as cidades fechadas, a China paralisou obras em geral —da construção de pontes ao erguimento de prédios. Assim, o país passou a comprar menos minério de ferro, um dos principais produtos exportados pelo Brasil.

Em maio do ano passado, por exemplo, o Brasil havia exportado 16,48 milhões de toneladas de minério de ferro (minério de ferro e seus concentrados) para a China. Um ano depois, em maio de 2022, o volume foi de 15,92 milhões de toneladas, uma queda de 3,4%. "Isso já é reflexo um pouco da desaceleração do crescimento chinês", diz Lia Valls, do Ibre FGV.

O subsecretário de Inteligência e Estatísticas de Comércio Exterior do Ministério da Economia, Herlon Brandão, confirma que estão sendo identificados embarques menores de minério de ferro para a China.

"O que observamos é uma menor atividade da China, que pode estar associada à menor atividade do minério", disse o subsecretário na última segunda-feira (13), durante atualização dos números da Secex (Secretaria de Comércio Exterior) para a balança comercial brasileira.

Brandão afirma, porém, que a questão é conjuntural. Segundo ele, a China vai continuar a ser um grande parceiro comercial para o Brasil, "com importância crescente".

Não acreditamos que a queda das exportações para a China seja uma questão de mudança de tendência. A China tem passado por lockdowns, o que faz com que a atividade econômica diminua. Além disso, é esperado um crescimento de apenas 4,4% do PIB este ano, que em termos chineses é baixo. Uma atividade menor influencia a importação [pela China] tanto em volume quanto em valores.
Herlon Brandão, da Secex

De fato, os dados da Secex mostram que, em dólares, as exportações de minério de ferro também estão sendo afetadas. De janeiro a maio, os envios do produto para a China somaram US$ 6,87 bilhões. O valor é 30,3% menor que os US$ 9,85 bilhões dos cinco primeiros meses do ano passado.

Soja

Os embarques de soja —outro importante produto de exportação do Brasil para a China— também caíram no início de 2022.

Os números da Secex indicam que as exportações de soja em grão somaram 28,74 milhões de toneladas de janeiro a maio. O volume é 28% menor que os 40 milhões de toneladas registrados nos cinco primeiros meses de 2021.

Neste caso, conforme Brandão, a menor exportação não está ligada aos lockdowns na China. "O que explica a menor exportação de soja é uma oferta menor do Brasil. Os alimentos são sempre demandados no mundo, ainda mais em um momento de crise e de gargalos de oferta, com a guerra na Ucrânia", afirmou o subsecretário. "É apenas uma menor safra do Brasil."

Os dados mais recentes da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) revelam que a estimativa para safra atual de soja no Brasil é de 124,3 milhões de toneladas de grãos. O volume é 10% menor que os 138,2 milhões de toneladas da safra anterior.

Com menos soja disponível, o Brasil também tem feito menos embarques para o continente asiático.

PIB do Brasil será prejudicado?

Apesar dos impactos da desaceleração da China sobre o comércio com o Brasil e da safra menor de soja, os economistas ouvidos pelo UOL acreditam que os efeitos sobre o PIB não preocupam. A estimativa mais recente do Ministério da Economia para o crescimento do PIB brasileiro em 2022 é de 1,90%.

Silber, da USP, lembra que o Brasil também é grande importador de produtos chineses, incluindo insumos para a indústria. Mas ele acredita que os impactos nesse caso serão localizados.

"A exportação menor para a China não deve afetar de forma substancial o PIB", afirma o professor. "E a produção industrial brasileira deve ter crescimento de 1,5%. Ela não deve ser afetada pela China."

Lia Valls, do Ibre FGV, diz que o PIB brasileiro é mais dependente do mercado interno que das exportações. "A dinâmica da economia não é dada por exportação e, de qualquer forma, o Brasil continua produzindo superávits comerciais", afirma. "Lógico que a China pesa, mas ela continuará sendo nosso principal parceiro comercial."