PIB: O que esperar para agro, serviços e indústria em 2024
O IBGE divulgou nesta sexta-feira (1º) o crescimento de 2,9% do PIB brasileiro em 2023, acima das expectativas projetadas por analista de mercado.
O crescimento da agropecuária, acima de 15%, indica que a economia do país ainda é muito dependente do campo. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), celebrou o resultado, mas disse que são necessários investimentos em outras áreas.
Para 2024, a projeção é de uma desaceleração do crescimento da economia. O UOL conversou com especialistas de três das principais atividades —agronegócio, serviços e indústria— para entender o que esperar nos próximos meses.
Agro deve ter quebra de safra, mas setor ainda reina
Em 2024, o agronegócio brasileiro não deve repetir o sucesso do ano passado. A economista do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas), Juliana Trece, afirma que condições climáticas adversas, como excesso de chuvas e temperaturas altas, devem quebrar a próxima safra.
Não é que os números vão ser ruins, longe disso. É que 2023 foi um ano muito bom e é difícil crescer no mesmo ritmo. O sarrafo foi colocado lá em cima.
Juliana Trece, professora do FGV Ibre
A Conab (Companhia Nacional de Abastecimento) espera uma queda na produção de grãos. Em boletim de fevereiro, o órgão avalia que a produção da próxima colheita será de 299,9 milhões de toneladas, 20,1 milhões de toneladas (-6,3%) abaixo do que em 2023. Soja e milho, duas das principais cadeias de produção brasileiras, serão fortemente afetados, segundo as previsões.
"O impacto das mudanças climáticas na produção de alimentos pode gerar pressões inflacionárias ao longo de 2024", acrescenta Ahmed El Khatib, coordenador do Instituto de Finanças da Fecap (Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado)
Mas nem todos os analistas acreditam que o clima terá efeito devastador. Matheus Pereira, fundador da Pátria Agronegócios, declara que os efeitos do La Niña já foram sentidos em anos anteriores e que o agronegócio tem investido em tecnologia para reverter grandes perdas na cadeia produtiva.
Esses ciclos existem em recorrências, porém, com a evolução tecnológica da própria genética das culturas semeadas, como soja e milho, a própria tecnologia aplicada em insumos que ajudam a planta a necessitar de menos água, acaba que a recorrência desses problemas, que já foram observados diversas vezes no passado, vai se tornando menos danosa.
Matheus Pereira, fundador da Pátria Agronegócios
O preço dos produtos está em desequilíbrio no mercado internacional. O analista da HN Agro, Hyberville Neto, afirma que isso que conflitos como os que estão em curso Ucrânia e em Gaza influenciam diretamente nessa volatilidade.
Entretanto, ele traz um ponto positivo: o Brasil tem se destacado na exportação de commodities neste início de 2024. Um destaque é a compra de carne bovina pelos Estados Unidos, um dos principais parceiros comerciais. Além disso, o país abriu 16 novos mercados em 11 países no bimestre encerrado em fevereiro, o maior resultado da série histórica, segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária.
Indústria
O desempenho da indústria em 2024 será beneficiado pela queda dos juros. Em 2024, a indústria deve ter desempenho melhor do que em 2023, na visão do economista André Perfeito. "A indústria deve crescer mais do que em 2023, mesmo porque a base de comparação é muito baixa", diz. O crescimento do setor no ano passado foi de 1,6%.
A indústria também deve ser beneficiada pelas obras do PAC, diz Perfeito. "Esse ano devemos ver uma recuperação da capacidade ociosa da indústria e, com isso, uma volta do investimento", diz. O risco para o setor é se houver um descontrole fiscal que interfira na trajetória de queda dos juros, avalia o economista.
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Quero receberO desempenho do setor deve ser puxado pela indústria extrativa, em especial petróleo e gás. Em 2023, a indústria extrativa cresceu 8,7%. "A indústria extrativa está num caminho muito favorável, especialmente petróleo e gás, com o aumento da produção da Petrobras. A indústria extrativa foi o segundo maior crescimento em 2023, e em 2024 pode ser o maior crescimento no país", diz Sérgio Vale economista-chefe da MB Associados.
Ainda que seja beneficiada pela queda nos juros, a indústria de transformação continua sofrendo com problemas estruturais. Isso porque o setor tem dificuldades históricas para crescer, com pouca competitividade para a exportação, diz Vale. Em 2023, a indústria de transformação encolheu -1,3%. "O fato de termos uma economia extremamente fechada nos impede de ter crescimento industrial. Mesmo quando o país teve taxas de juros mais baixas a indústria estava parada. O mais relevante para esse setor seria ter mudanças estruturais", diz.
Serviços
O setor de serviços subiu 2,4% em 2023. O dado foi mais fraco em comparação a 2021 (4,8%) e 2022 (4,3%), anos em que o desempenho foi mais forte por causa da demanda reprimida da pandemia, após queda de 3,7% em 2020. Lucas Farina, analista econômico da Genial Investimentos, afirma que houve um esgotamento natural da recuperação em 2022, já que a demanda reprimida foi resolvida.
O setor de serviços deve continuar crescendo em menor ritmo em 2024. Silvia Matos, coordenadora do boletim macro do Ibre FGV, afirma que a queda de juros deve influenciar o movimento. Para ela, o comércio melhorou em 2023, influenciado pela indústria, e a expectativa é de que o movimento continue em 2024 — o setor foi beneficiado pela melhoria na indústria. Cortes na Selic têm reflexo nas taxas cobradas por bancos e lojas, o que ajuda a impulsionar o consumo das famílias. Esse efeito não é imediato, e os impactos mais relevantes serão sentidos pela população ao longo do tempo.
A política monetária vai ajudar mais o consumo de bens e comércio está [dentro do setor de] serviços, apesar de estar relacionado a bens.
Silvia Matos, coordenadora do boletim Macro do Ibre FGV
A sinalização de queda no consumo das famílias pode impactar negativamente o setor em 2024, segundo Farina. Houve uma queda de 0,2% no indicador no quarto trimestre de 2023, o que foi uma surpresa. "Nesse sentido podemos esperar algum arrefecimento de consumo de serviços ainda maior em 2024, com impacto limitado do crédito para poder impulsionar a performance tanto do comércio como do varejo", afirma Farina.
2023 foi um ano em que o governo federal deu diversos incentivos fiscais. Alguns deles são o aumento do valor do Bolsa Família para R$ 600 e a política de valorização do salário mínimo, que ajudaram a dar um "gás" extra para comércio e serviços. "Para termos um impulso da mesma magnitude, teríamos de ter uma ação do governo, um impulso fiscal igualmente ou até mais forte. uma política expansionista mais expressiva. No entanto, a ala econômica do governo está bem empenhada em perseguir o déficit zero e, por isso, o impulso fiscal deve ser bem menos significativa do que a gente já viu", afirma Farina.
A reforma tributária é outro ponto de atenção para 2024. A expectativa é de que o Congresso Nacional defina as regras da reforma e o setor de serviços deve ser um dos mais impactados. "Vão ser conhecidas as alíquotas que vão ser cobradas sobre cada setor. Isso pode paralisar alguns setores, que podem escolher esperar para ver o que vai sair antes de tomar uma decisão de negócios", afirma Farina.
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