Em feira vitrine na Expointer, cavalo da raça crioulo chega a R$ 22 milhões

Em um leilão reunindo animais de quatro cabanhas, a venda de 5% do cavalo Jacinto Cala Bassa TE quebrou uma marca que durava mais de uma década: a de animal mais caro da raça do cavalo crioulo. O cavalo de pelagem colorada, de 6 anos, tem avaliação estimada agora em R$ 22 milhões.

O leilão ocorreu na quinta-feira (29) dentro da Expointer, em Esteio, região metropolitana de Porto Alegre. Em meio a máquinas, produção de agricultura familiar e animais da pecuária, a feira de agronegócios é a grande vitrine do cavalo crioulo e referência importante para o mercado da raça.

Desde 1982, a feira virou palco do Freio de Ouro. Para vencer o prêmio, o cavalo precisa ter bom desempenho em sete provas funcionais, depois de passar por fases classificatórias. Ter um cavalo ou égua com esse título ou filhos de campeões valoriza a genética de uma cabanha e mexe nos preços. O mesmo vale para cavalos premiados na morfologia, avaliação da parte anatômica e estética dos animais.

Jacinto é filho de dois grandes campeões, AS Malke Sedutor e Dinastia Cala Bassa, uma égua conceituada entre criadores. Depois de três anos em ascensão em disputas, em abril, ele venceu o Bocal de Ouro, disputado apenas por conjuntos inéditos no ciclo do Freio, contra Jalisco da GAP São Pedro, o cavalo que se sagrou campeão na final do próprio Freio neste sábado. Jacinto terminou com o bronze.

''A valorização da raça hoje se deve pela exigência de criadores e usuários. Todo mundo quer cavalo bom e bonito. Jacinto é reservado Grande Campeão de Esteio (segundo lugar), e se tornou um dos cavalos bonitos e funcionais da raça. O suprassumo de todo criador'', diz Santiago Fonseca Macedo, dono da Macedo Leilões Rurais, casa responsável pela venda.

O cavalo Jacinto Cala Bassa TE, avaliado em R$ 22 milhões na Expointer de 2024, com seu dono, o criador e ginete Marcelo Rezende Móglia
O cavalo Jacinto Cala Bassa TE, avaliado em R$ 22 milhões na Expointer de 2024, com seu dono, o criador e ginete Marcelo Rezende Móglia Imagem: Fernanda Canofre/UOL

O cavalo mais caro é resultado de anos de trabalho de Marcelo Rezende Móglia, criador e ginete que disputou provas do Freio com ele. A família de Móglia trabalha com cavalos há 85 anos, e ele criou a própria marca, a Cabanha Cala Bassa, há 30.

''Ao nascer, ele já era bonito e a gente sempre acreditou nele. Temos uma equipe que cuidou dele desde pequeno. Na primeira saída dele na Expointer, já nos deu alegria e foi reservado Grande Campeão 2020. Esse ano, no Bocal de Ouro, ele foi o ganhador com pontuação recorde. Então, é um cavalo que foi desenvolvido, trabalhado para chegar nesse potencial que ele tem hoje'', afirma Móglia.

Preço da genética

Além da performance do próprio Jacinto em provas de morfologia e funcionais, outro fator que valorizou seu passe no mercado dos cavalos crioulos são os feitos de seus filhos. A prova da potência genética foi o fiel da balança para que JLS Hermoso, um cavalo mouro, hoje com 27 anos, fosse avaliado em cerca de R$ 17 milhões e levasse a marca de mais caro por mais de uma década, até esta semana.

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Entre a prole de Hermoso há dois ganhadores do Freio de Ouro, dois Grandes Campeões de Esteio e um Grande Campeão da FICCC, exposição itinerante da raça, que ocorre a cada três anos, entre criadores de Brasil, Uruguai, Paraguai e Argentina, além de uma neta Freio de Prata.

''Tudo isso vai somando e vai agregando a ele, para você querer ter essa genética no teu plantel'', afirma o proprietário dele, Lauro Varela Martins, da Cabanha Porto Martins. ''O Hermoso, como indivíduo, foi um cavalo normal. Ele se super valorizou como pai. É um cavalo importante e todo criador que faz investimento genético quer ter na sua manada uma filha, um filho, uma neta.''

O cavalo crioulo mais caro vendido até hoje foi Equador de Santa Edwiges, que foi arrematado aos dez anos por quase R$ 7 milhões, em 2017. Em um golpe de azar do negócio, ele morreu um mês depois de uma infecção no intestino.

Já o valor de Colibri Matrero, da cabanha uruguaia La Pacifica, cavalo que se tornou lendário depois de vencer três Freios consecutivos, feito inédito e ainda sem ser superado, não é conhecido. Ele nunca foi posto à venda, nem por cotas, e ofertas por ele sempre foram rejeitadas.

A comercialização dos cavalos da raça pode se dar em vários valores e formas. O animal inteiro ou o direito a uma cota, como o caso de Jacinto Cala Bassa, o que permite um número determinado de coberturas por ano. Por cobertura, o sêmen de um garanhão. Por barriga, quando se vende uma gestação e a genética de uma égua para ser cruzada com o cavalo que o comprador escolher. Ou ainda de embriões, a combinação de pai e mãe já determinada.

A ABCCC (Associação Brasileira de Criadores de Cavalos Crioulos), porém, limita o número de coberturas anuais para evitar a vulgarização da genética de um animal. Os chamados cavalos sem mérito podem ter 150 coberturas registradas por ano, enquanto cavalos com mérito podem chegar a 180.

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''Nunca tivemos tantos sócios, temos hoje mais de cinco mil, 30% deles fora do Rio Grande do Sul pela primeira vez. Nos últimos dois anos, crescemos significativamente e fora do estado, o que mostra que o trabalho de expansão e desenvolvimento da raça está OK", diz César Hax, presidente da ABCCC.

Os eventos da associação também ajudaram a impulsionar o mercado da raça nos últimos anos. Em 2023, segundo Hax, um leilão foi realizado a cada dois dias.

Em meio à comoção nacional em torno do cavalo Caramelo, sem raça definida, resgatado em cima de um telhado cercado por água, em Canoas, na região metropolitana da capital gaúcha, a associação se mobilizou para ajudar a encontrar cavalos perdidos, criando grupos no WhatsApp, e coordenando ações de apoio.

''Todos da Grande Porto Alegre e centro do estado perderam, o que resta saber é se mais ou menos. A gente sabe de criadores que perderam muito, outros perderam tudo, casa, animais, estrutura. É muito difícil, mas a gente traz para a Expointer uma esperança de recomeço e reconstrução'', diz Hax.

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