Novo bilionário, Ricardo Faria tem R$ 17 bilhões com império de ovos

"Foi surpreendente, porque eu nunca fiz as contas", diz Ricardo Castellar de Faria, fundador da Granja Faria, sobre a entrada na lista de bilionários da revista Forbes. Com patrimônio estimado em R$ 17,45 bilhões, ele assume o posto de 21ª pessoa mais rica do Brasil. Em entrevista exclusiva, o dono da maior produtora de ovos do país, com mais de 15 milhões de aves em 24 granjas, conta que a trajetória de empreendedor começou na infância, relata a estratégia de expansão dos negócios, comenta os entraves na Justiça e rechaça o apelido de "Rei do Ovo".

Castellar recebeu o UOL no escritório da Granja Faria em Barueri, na Grande São Paulo. A parede da sala de reuniões trazia um banner da Ares do Campo, marca do grupo focada na produção com galinhas livres. Na mesa, quatro ovos fritos decorativos com gemas de diferentes tonalidades ilustram o carro-chefe da empresa.

Quem é Ricardo Castellar

Novo bilionário descobriu a paixão pelo empreendedorismo na infância. Nascido em Niterói (RJ), ele se mudou para Santa Catarina aos três anos e garante ter descoberto logo em seguida que trabalharia por conta própria. "Com cinco ou seis anos eu juntava papelão e vendia para uma reciclagem. Eu ia para o sítio do meu pai, juntava laranja e caqui e vendia na frente da casa", conta Castellar. Aos oito, vendia picolé durante as férias de verão e nos jogos do Criciúma.

Eu sou filho de um médico e uma engenheira. Sempre tive uma vida de classe média, mas esse espírito empreendedor vem desde moleque.
Ricardo Castellar, fundador da Granja Faria

Ricardo Castellar
Ricardo Castellar Imagem: Arquivo Pessoal

Cogitou carreira na medicina para seguir os passos do pai. Mas mudou de ideia durante um intercâmbio para a Califórnia, quando teve contato com o potencial agrícola da região. "Quando eu voltei, com 16 anos, comuniquei meus pais que não iria mais fazer vestibular para medicina e tentaria agronomia", diz ele.

Família era dona de confecção em Santa Catarina. O empreendimento foi a porta de entrada para vida de empresário de Castellar. Durante a faculdade, convenceu o pai que poderia comandar a produção de uniformes industriais. No período, ele recorda as negociações com uma fabricante de alimentos e a entrada nas montadoras do ABC Paulista como divisor de águas. "A empresa mudou de patamar, porque a indústria automobilística era enorme e empregava muitas pessoas", observa.

Lavebras

Criou divisão para aluguel de roupas aos 20 anos. Com a inspiração das concorrentes, o empresário viu na locação uma oportunidade de aceitar um risco para ampliar o projeto. "Eu já tinha a experiência na produção de roupas. Mas, ao invés de vender, passei a locar", destaca ele. Fundou a Baslave, que depois se tornou a Lavebras.

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Enquanto as multinacionais ficavam nas capitais, a gente levou a montanha até Maomé e começou a abrir lavanderias nas redondezas dos frigoríficos.
Ricardo Castellar, fundador da Granja Faria

Inovação contribuiu para expansão da lavanderia. Ele relata que o sucesso da mudança resultou na terceirização do modelo para mais de cem frigoríficos em um período de 15 anos e limitou a concorrência. Com a consolidação do negócio, Castellar comprou a participação do sócio e assume 100% da lavanderia. Sete anos mais tarde, nomeou Edson Bueno, fundador do Grupo Amil, como novo sócio para ampliar as aquisições. "Adquirimos 30 lavanderia em 36 meses", pontua.

Lavebras foi vendida por R$ 1,3 bilhão para a francesa Elis. A transação foi realizada em 2017, quando a companhia ocupava o posto de maior lavanderia da América Latina. "Em 20 anos, a empresa nasce pequeninha, cresce e é vendida para uma multinacional", declara Castellar.

Granja Faria

Maior produtoras de ovos do Brasil surge em 2007. Castellar disse que usou os clientes e a estratégia da Lavebras para a construção do novo empreendimento. "O camarada que tem o frigorífico e lava roupa também compra pintinho e ovos", disse Castellar.

Compra da Avícola Catarinense amplia presença da granja. Ele recorda a negociação de 2013 como o "primeiro episódio que muda a vida da companhia". "A gente deixou de ser um parceiro das indústrias e passa a ser um player no que se refere a ter independência em todos os pontos da cadeia".

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Internacionalização vem com surto global de gripe aviária. Castellar afirma que o contágio de 2014 abriu caminho para o mercado mundial de ovos férteis e deu origem às exportações da Granja Faria. "Tínhamos nos estruturado para um crescimento rápido na Avícola Catarinense e nos deparamos com o mundo de portas abertas e nós cheio de produto para vender."

Com aquisições, surge o Grupo Granja Faria. "A gente recria tudo aquilo que foi um sucesso", destaca Castellar. O empreendedor avalia que o Ebitda (Lucros antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização) atual do conglomerado é dez vezes maior do que da Lavebras quando foi vendida.

Lucro. No ano passado, a Granja Faria teve lucro líquido de R$ 204,6 milhões e Ebitda de R$ 645,9 milhões, altas de, respectivamente, 19,9% e 83% ante 2022.

"Império do Ovo" conta com 24 granjas e 4.000 funcionários. "A Granja Faria é a única presente nas cinco regiões do Brasil", destaca, usando as mãos para contabilizar a atuação em 10 estados.

O próximo passo idealizado é a expansão internacional da produtora, de 16 mil ovos diários. "O caminho da internacionalização é algo que a gente já vem construindo há quatro anos", ressalta.

Insolo

Entrada no mercado de grãos surge com a aquisição da Insolo, em 2020. "Eu, como engenheiro agrônomo de formação, não plantava nem um pé de batata. Isso me frustrava", conta Castellar ao recordar a compra da Insolo por R$ 1,8 bilhão. Ele diz ter observado a "janela de ter terras no Brasil se fechando". Ainda assim, identificava oportunidades mais acessíveis nos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia.

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Compra foi fechada em apenas três dias, destaca. "A gente começou a negociar em uma quinta-feira, chegamos a um acordo em comum de preço na madrugada de sexta-feira e assinamos um documento vinculante no sábado", relembra ao classificar a aquisição como o "maior negócio da vida". O foco da Insolo é a produção de soja, milho e soro.

Estamos superanimados com o nosso projeto de grãos. Não há partes relacionadas, de uma empresa vender para a outra, mas a nossa estratégia de produção de grão por conta de ser grande consumidor de grão, fica equilibrada, olhando principalmente do lado do acionista.
Ricardo Castellar, fundador da Granja Faria

Império bilionário

Entrada no ranking da Forbes foi inesperada, garante Castellar. "Foi uma surpresa, porque eu te confesso que nunca fiz as contas", garante. Ele entende que a motivação para a inclusão foi a listagem da Granja Faria na B3, a Bolsa de Valores do Brasil. "A partir do momento em que a gente lista a empresa, as nossas informações ficam extremamente públicas e, obviamente, o pessoal acaba fazendo as contas do resultado da companhia", entende ele.

Oferta de ações na Bolsa é descartada neste momento. Mesmo com a listagem já disponibilizada, o bilionário afirma que a distribuição das ações não deve ocorrer no mercado nacional. "A gente entende que o momento econômico não é o mais propício. Hoje não existe a certeza se faz sentido listar a empresa no Brasil ou em Nova York", explica.

Se me perguntasse isso há cinco anos, eu diria, tranquilamente, que listaria a empresa no Brasil. Hoje, existe uma dúvida na nossa cabeça.
Ricardo Castellar, fundador da Granja Faria

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Ações na Justiça

Empresa de Castellar foi um dos alvos da "Operação Dinheiro Sujo". Deflagrada pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) e pela MPDFT (Ministério Público do Distrito Federal e Territórios) em 2021, a ação foi cumprida para analisar fraudes e a cobrança de propina em contratações de lavanderias, incluindo a Lavebras, entre 2013 e 2016. No período, ele ainda comandava a companhia.

Além da Lavebras, a operação mirou as empresas NJ Lavanderia e Acqua Premium. As irregularidades envolvem contratações emergenciais das prestadoras de serviços em licitações firmadas com a Secretaria de Saúde do Distrito Federal para o Hospital de Base e as regionais do Gama, de Santa Maria e de Sobradinho.

Bilionário avalia que a investigação foi ocasionada pela aquisição da NJ. Castellar relata que a empresa incorporada pela Lavebras possuía contratos para a realização de serviços hospitalares para o governo do Distrito Federal. "O fato gerador é de 2011 e a gente compra a empresa no final de 2014", afirma. "Esses processos não têm nenhum acusação a meu respeito, foram em cima da companhia e dos antigos proprietários", completa ao ressaltar a absolvição dos citados.

Castellar responde por manifestações na Justiça do Trabalho. O nome é citado em processos referentes ao eventual descumprimentos das leis trabalhistas. A maioria das ações envolve os recolhimentos de FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), verbas rescisórias e 13º salário. "Tenho vários [processos], eu tenho 4.000 funcionários", rebate ao ser questionado sobre as ações.

Ele classifica as manifestações como "naturais". Ainda assim, afirma não conseguir se esquivar dos processos em empresas nas quais é dono como pessoa física. "O que eu faço é me defender, não posso ficar deprimido por causa disso. A gente entende qual é a reclamação e defende ou faz o acordo e resolve", afirma.

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