'Entrei na rotina de pai', diz chefe da Amazon; 92% apoiam licença maior

A esmagadora maioria da população (92%) apoia o aumento da licença-paternidade, que por lei hoje é de apenas cinco dias corridos. É o que mostra uma pesquisa realizada pela Copai (Coalizão Licença Paternidade), entidade que trabalha pela extensão da licença.

O que diz a pesquisa

Maioria apoia aumento da licença para pelo menos 30 dias. A pesquisa, divulgada pelo UOL com exclusividade, mostra que 92% apoiam uma licença de ao menos 15 dias, enquanto 63% apoiam uma licença de ao menos 30 dias.

Uma parcela relevante também apoia períodos ainda maiores de licença-paternidade. Dentre os entrevistados, 35% apoiam 60 dias de licença, 25% apoiam 120 dias, e 12% apoiam mais de 120 dias de licença.

Apoio a extensão da licença é maior entre os jovens. Na faixa etária entre 18 e 34 anos, o apoio ao aumento da licença é de 97%. Na faixa entre 35 a 44 anos ele fica em 95%. O apoio cai para 87% na faixa etária de 45 anos ou mais.

Mudança cultural

Resultado mostra que há uma mudança cultural em curso. Para Camila Bruzzi, presidente da Copai, os resultados do levantamento mostram uma mudança na mentalidade do brasileiro.

Estamos vendo um amplo entendimento da população de que esse é o papel do pai, de que o homem tem toda a capacidade de cuidar, de que é importante ele estar em casa. É um tema que tem apoio de 92% da população. O que tem esse apoio na sociedade hoje em dia? Essa é uma causa que une o Brasil e a pesquisa reforça isso.
Camila Bruzzi, presidente da Copai

Empresas dão licença estendida

Algumas empresas têm estendido a licença-paternidade por conta própria. O presidente da Amazon no Brasil, Daniel Mazini, tirou licença estendida quando seu segundo filho nasceu. A empresa dá licença-paternidade de seis semanas.

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Entrei completamente na rotina como pai. Minha esposa estava cansada, eu dava o mamá noturno, ajudei bastante em casa, e criei um vínculo muito bom com meus filhos. Hoje saio com eles sozinho no fim de semana, levo para a escola de manhã ponho para dormir.
Daniel Mazini, presidente da Amazon no Brasil

Licença aproxima homens da realidade das mulheres. Mazini diz que as lideranças da empresa incentivam que os funcionários tirem a licença estendida, e que o período ajuda a aproximar os homens da realidade das mulheres no mercado de trabalho. "Temos um exemplo muito forte da liderança. Eu tirei a licença e a liderança mais sênior também tirou. Quando chegam [inseguranças com o período longe do trabalho], eu digo: 'Bem-vindo ao mundo das mulheres'. Elas tiram pelo menos quatro meses e têm essa mesma ansiedade", diz.

Na Diageo, a licença é de seis meses e ajuda na retenção de talentos. A empresa de bebidas oferece licença-paternidade de seis meses desde 2019. Segundo Viviane Besani, diretora executiva de RH, a política ajuda a reter talentos e a criar "uma cultura empresarial mais inclusiva e equilibrada".

Gerente de finanças aproveitou período para dar atenção ao filho mais velho. César Silva, gerente-sênior de finanças, acaba de voltar de licença. Ele tirou seis meses quando sua segunda filha nasceu e, além de cuidar da bebê, pôde dar atenção ao filho mais velho. "Pude ajudar minha esposa, aprendemos muito, consegui dar atenção ao meu filho mais velho e dividir as tarefas com a pequena. Hoje tenho certeza de que não vou ser um estranho dentro de casa para meus filhos", diz.

Na Docusign, o pai pode se colocar como cuidador principal e tirar até seis meses. Se for o cuidador secundário, a licença é de até 40 dias úteis (cerca de dois meses corridos).

Cuidador principal, gerente de marketing optou por licença de seis meses. Rafael Aragão, gerente de marketing da Docusign, se colocou como cuidador principal do filho e está de licença. Ele divide os cuidados do bebê, de quatro meses, com o marido. "É muito importante não ter a cabeça dividida entre o trabalho e o bebê. Ele precisa de atenção 100% do tempo", diz.

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Rafael Aragão (esq), gerente de marketing da Docusign, com o filho e o marido
Rafael Aragão (esq), gerente de marketing da Docusign, com o filho e o marido Imagem: Arquivo pessoal

Como é a licença hoje

Hoje a licença-paternidade é de cinco dias corridos. Se a empresa estiver cadastrada no programa Empresa Cidadã, o prazo será estendido para 20 dias (cinco dias, prorrogáveis por mais 15 dias).

Um projeto de lei em discussão na Câmara visa aumentar a licença. O PL 6216/2023 propõe um aumento progressivo da licença ao longo de quatro anos, iniciando com 30 dias, depois 45 dias, até chegar a uma licença de 60 dias. O texto aguarda para ser votado no plenário. Há outro projeto semelhante em discussão no Senado.

A ideia é que a licença seja bancada pelo governo, assim como ocorre na licença-maternidade. Hoje a licença-paternidade é custeada pelas empresas. O custo da medida para os cofres públicos deve ficar entre R$ 3,7 bilhões (licença de 30 dias) e R$ 5,8 bilhões (licença de 60 dias), segundo os cálculos apresentados no projeto de lei em tramitação na Câmara.

Prazo de cinco dias era provisório e ficou. A Constituição de 1988 estabeleceu que a licença-paternidade é um direito do trabalhador. O tema deveria ser regulamentado em lei posterior. Até a regulamentação, a duração da licença seria de cinco dias. Como a regulamentação não aconteceu, o prazo provisório permanece até hoje.

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Licença atual cria barreiras para participação dos pais, diz presidente da Copai. "A primeira barreira é a mensagem que ela passa, de que o homem não é importante nesse momento de cuidado do filho. A segunda é a prática. A mãe fica quatro meses entendendo o que é ser mãe, conhecendo o filho, aprendendo a cuidar dele, enquanto o pai trabalha, e muitas vezes fica inseguro sobre como fazer esse cuidado", diz.

Pesquisa mostra visão da paternidade

Homens e mulheres devem compartilhar as tarefas da criação dos filhos. Dentre os entrevistados no levantamento da Copai, 80% concordam que ambos devem cuidar dos filhos. Ainda que alta para os dois sexos, a proporção é um pouco maior entre as mulheres. Entre elas, 84% concordam com a frase, ante 77% de concordância entre os homens.

Dentre os entrevistados, 80% concordam que um pai presente é importante para o desenvolvimento da criança. Na divisão por sexo, a frase tem a concordância de 81% das mulheres e de 78% dos homens.

Para 79%, o apoio do pai à família é importante nos primeiros dias e semanas de vida do bebê. Entre as mulheres, 82% concordam com a frase, ante 75% dos homens.

Para 78%, homens e mulheres deveriam ter as mesmas oportunidades no mercado de trabalho. A diferença entre a visão de homens e mulheres também aparece aqui. Dentre as mulheres, 82% concordam, ante 73% de concordância entre os homens — é a maior diferença de visão entre homens e mulheres entre as frases apresentadas pela pesquisa, com nove pontos percentuais de diferença.

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Dentre os entrevistados, 77% concordam que a mãe necessita de auxílio do pai nas primeiras semanas de vida do bebê. Entre as mulheres, 81% concordam com a frase, ante 73% dos homens. Para 77%, o pai tem capacidade de aprender a cuidar dos seus filhos. O índice é de 79% para as mulheres e de 76% para os homens.

Motivos para apoiar

A pesquisa também perguntou sobre os motivos que levam as pessoas a apoiar uma licença maior. Dentre os entrevistados, 71% dizem que uma licença paternidade maior fortalece os laços da família. A mesma proporção acredita que a licença maior garante o direito da criança de ter pai e mãe presentes, além de permitir que o pai dê mais suporte à saúde emocional e física da mulher.

Menos sobrecarga para a mulher e maior divisão do cuidado. Dentre os entrevistados, 69% dizem que a licença paternidade maior reduz a sobrecarga da mulher. A mesma proporção acredita que a licença estendida estimula a divisão do cuidado dos filhos e permite que o pai apoie a mulher em um momento "especial e difícil".

Redução da evasão escolar e e da violência doméstica. A maioria dos ouvidos na pesquisa (68%) diz ainda que a licença paternidade maior pode reduzir a evasão escolar, a deliquência juvenil e os problemas relacionados a drogas e violência doméstica. A mesma proporção concorda que os homens devem ter uma licença maior para estarem presentes neste momento importante.

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O levantamento ouviu mil pessoas com 18 anos ou mais. As entrevistas ocorreram online e foram feitas em abril de 2024 pela QuestionPro.

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