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ENTREVISTA-Não tem como Alckmin ser reformista aliado ao blocão, diz assessor econômico de Marina

17/08/2018 09h41

Por Iuri Dantas

SÃO PAULO (Reuters) - O mercado financeiro comete uma "contradição lógica" ao apostar no tucano Geraldo Alckmin (PSDB), pois "não há hipótese" de ele promover reformas, como a da Previdência, depois de se aliar ao chamado blocão, grupo de partidos que sempre resistiu a essas reformas, disse à Reuters o economista André Lara Resende, que aconselha a presidenciável Marina Silva (Rede).

Formado por PP, DEM, PR, PRB e Solidariedade, o blocão agrupa o mesmo establishment político que impediu a reforma da Previdência elaborada por Lara Resende durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, depois que o tucano se submeteu às demandas dos partidos para obter apoio para aprovar a emenda constitucional permitindo reeleição do presidente, segundo o assessor de Marina.

O ex-ministro da Fazenda e candidato Henrique Meirelles, do MDB, tampouco conseguiria promover as mudanças, pois também se alia a "forças fisiológicas" que não têm interesse em reformas constitucionais necessárias para ajustar as contas públicas, na visão de Lara Resende.

"Não consigo entender a lógica de chamar de candidato reformista aquele que está aliado com todas as forças antirreformistas, explica como isso pode ser possível", questionou Lara Resende, PhD em economia pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT) e um dos pais do Plano Real.

"Explica como o Meirelles e o Alckmin vão fazer as reformas se estão aliados, na partida, para se eleger, com todas as forças mais fisiológicas e antirreformistas?"

A aliança com o blocão rendeu a Alckmin o maior tempo de TV durante o período de campanha eleitoral, além de uma eventual base de sustentação no Congresso, mas também vem provocando críticas de adversários.

Vale ressaltar, porém, que desde a chegada de Michel Temer ao Palácio do Planalto, o blocão votou a favor de uma emenda constitucional que limita o crescimento das despesas do governo, o chamado teto de gastos, e da reforma trabalhista.

POLARIZAÇÃO

Segundo Lara Resende, o eleitor brasileiro está polarizado entre candidatos que representam práticas de negociação com o Congresso que resultaram no mensalão e na Lava Jato --como Alckmin, Meirelles e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT-- e outros que tentam romper com este sistema, notadamente Marina e o deputado Jair Bolsonaro (PSL).

"A premissa para viabilizar reformas é não representar estas forças fisiológicas do presidencialismo de coalizão", disse Lara Resende.

"Acho uma contradição lógica imaginar que o candidato que se associe a estas forças, são as forças que sempre impediram as reformas e que provocam o déficit fiscal, possa ser o agente das reformas."

Segundo institutos de pesquisa, Bolsonaro e Marina estão na frente da corrida presidencial sem a presença de Lula, cuja candidatura deve ser barrada devido à Lei da Ficha Limpa.

Um eventual governo de Marina Silva teria início com um programa de reformas tributária e da Previdência, e busca de um superávit primário da ordem de 1,5 a 2 por cento do PIB no curtíssimo prazo, segundo Lara Resende.

POUQUÍSSIMA DIFERENÇA

Lara Resende enfatiza o constrangimento e compromissos criados por alianças eleitorais porque há "pouquíssima diferença" entre as ideias defendidas por economistas que auxiliam Marina Silva e Geraldo Alckmin. Pérsio Arida, com quem Resende trabalhou sob FHC e na gestão José Sarney (1986-1990), trabalha as propostas do PSDB para a economia.

"A abordagem destes temas básicos --reforma fiscal, da Previdência, simplificação, desburocratização-- entre grande parte dos economistas que estão hoje assessorando os candidatos é muito parecida", afirmou.

Alguns pontos do programa de Marina, por outro lado, sobressaem como únicos entre os concorrentes ao Planalto. Segundo Lara Resende, a candidata pretende adotar "exigências ambientais altas", ressaltando que investidores temem mais a indefinição de regras do que regras rígidas de proteção ao ambiente.

Esta mudança seria feita por meio de novos marcos regulatórios, em especial nos setores de geração de energia elétrica e petróleo, explicou, citando alterações na atuação do Banco Central como parte do processo para deixar o Brasil "pronto para o século 21", após quatro anos de mandato presidencial.

"A competição não é resultante de 'laissez-faire', mas resultado de regulação inteligente", afirmou o economista, defendendo a retirada de eventuais bloqueios à atuação das empresas de tecnologia financeira, as chamadas fintechs, como forma de reduzir a concentração bancária no sistema de pagamentos e no crédito.