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Haddad tem vitória em teste de influência sobre Lula antes de negociação do arcabouço fiscal

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente Lula em evento no Palácio no Planalto - 12.jan.2023 -Sergio Lima / AFP
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o presidente Lula em evento no Palácio no Planalto Imagem: 12.jan.2023 -Sergio Lima / AFP

Bernardo Caram

Em Brasília

28/02/2023 15h16Atualizada em 28/02/2023 15h16

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, teve uma vitória tática nas negociações sobre a tributação de combustíveis, com o anúncio da reoneração a partir de março sendo recebido com surpresa por agentes do mercado, enquanto membros da equipe econômica celebravam a decisão nos bastidores.

Com definição da medida, cujos detalhes ainda vão ser divulgados com a promessa de recuperar em 100% a arrecadação prevista pela Fazenda, a pasta poderá centrar esforços nas tratativas para apresentar ainda em março o novo arcabouço fiscal, que também atravessará temas politicamente sensíveis.

A Reuters mostrou na semana passada que a equipe econômica contava com a reoneração imediata, mas ainda temia uma guinada do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, já que ele se inclinou à ala política ao prorrogar o benefício em janeiro.

Com a concretização do cenário defendido por Haddad, uma fonte do Ministério da Fazenda afirmou se tratar de uma vitória importante, destacando que o resultado dá um impulso de confiança para as negociações em torno do novo arcabouço fiscal que substituirá o teto de gastos.

"Bom resultado para o país. Agora é seguir o trabalho com foco nas reformas estruturais", ressaltou uma segunda fonte, sob condição de anonimato.

O economista da XP Tiago Sbardelotto afirmou que a instituição espera que o déficit primário do governo neste ano fique em 84 bilhões de reais com a reoneração dos combustíveis. A inflação é projetada em 5,7% em 2023 já com o impacto da elevação dos tributos sobre os preços, acima do teto da meta, mas com chance de melhora das expectativas futuras, afirmou.

"A maior parte do mercado não apostava que haveria essa volta agora. De fato, surpreende positivamente, a expectativa majoritária era que haveria uma volta, mas que seria postergada ou gradual", disse, ponderando ainda ser necessário saber os detalhes da medida.

Para o economista-chefe do Banco Original, Marco Caruso, é preciso aguardar a oficialização da medida para entender se haverá algum mecanismo diferenciado ou uma tributação mais alta sobre a gasolina para permitir um benefício maior para o etanol. De qualquer forma, segundo ele, a decisão gera saldo positivo para Haddad.

"Foi uma surpresa positiva do ministro Haddad contra o que os jornais chamam de ala política", disse.

Após Haddad ser derrotado em janeiro, quando Lula determinou a prorrogação do benefício até fevereiro para gasolina, álcool, querosene de aviação e gás natural veicular e até dezembro para diesel e gás de cozinha, houve divergência pública entre a equipe econômica e aliados políticos do presidente.

Haddad manteve sua posição contra a manutenção das desonerações a esses insumos, inclusive inserindo em seu plano de ajuste fiscal apresentado em janeiro a previsão de recuperar quase 29 bilhões de reais neste ano com a retomada dos tributos de combustíveis a partir de março.

A equipe da Fazenda também vinha se posicionando contra essas isenções tributárias com o argumento de que conceder benefícios a combustíveis fósseis contraria os princípios do governo de defesa do meio ambiente.

A ala política, no entanto, demonstrava preocupação com o efeito inflacionário da recomposição dos tributos, com a disputa ganhando publicidade após a presidente do PT, deputada Gleisi Hoffmann (PR), ter se colocado contra a reoneração.

A deputada disse em redes sociais na sexta-feira que antes de retomar tributos sobre combustíveis, seria preciso definir uma nova política de preços para a Petrobras. Segundo ela, retomar os tributos agora ?é penalizar o consumidor, gerar mais inflação e descumprir compromisso de campanha?.

A decisão final também tenta atender parcialmente a ala política, já que o governo negocia com a Petrobras uma possível redução nos preços de combustíveis para amenizar o impacto da reoneração, minimizando o efeito sentido pelo consumidor.

Interesses políticos

Foco da equipe econômica juntamente com a reforma tributária, a definição do arcabouço fiscal também vai esbarrar em interesses de políticos e promessas de campanha de Lula, já que compromissos como a política de valorização do salário mínimo, a ampliação de gastos sociais e a concessão de reajustes ao funcionalismo geram novas despesas continuadas.

Em entrevista à Reuters neste mês, o secretário do Tesouro, Rogério Ceron, afirmou que o novo arcabouço fiscal precisará ter uma regra de controle do crescimento dos gastos, especialmente os permanentes.

A própria equipe de Haddad tem defendido, por outro lado, que a nova regra fiscal tenha certa flexibilidade para permitir gastos maiores em áreas consideradas estratégicas pelo governo e que também preveja um mecanismo para autorizar gastos maiores em situações de choque econômico.

O teste da influência de Haddad sobre Lula também está em foco porque a Fazenda precisará negociar com o Planalto indicações para diretorias do Banco Central, que vinha sendo alvo de críticas do presidente enquanto Haddad exibia tom conciliador com a autoridade monetária. Os embates públicos do presidente com o BC cessaram recentemente —a diretriz no governo é retirar Lula dessa linha de frente, deixando-a a cargo do PT.

Os mandatos dos diretores de Política Monetária e de Fiscalização da autarquia terminam nesta terça-feira e o mercado aguarda as indicações de Lula para entender se serão apresentados nomes que poderiam atuar como contraponto às visões do presidente do BC, Roberto Campos Neto.

Haddad, que já antecipou que os nomes não serão revelados nesta semana, afirmou neste mês que debateu com Campos Neto nomes técnicos para ocupar as vagas e que levaria sugestões a Lula, a quem cabe a definição.