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Lideranças Mura relatam ameaças em meio a pressão por aprovação de mina de potássio na Amazônia

Indígenas Mura posam para foto em área desmatada de terra indígena não demarcada na floresta amazônica perto de Humaitá, no Amazonas - 20.ago.2019 - Ueslei Marcelino/Reuters
Indígenas Mura posam para foto em área desmatada de terra indígena não demarcada na floresta amazônica perto de Humaitá, no Amazonas Imagem: 20.ago.2019 - Ueslei Marcelino/Reuters

Ana Mano

Em São Paulo

28/04/2023 21h11Atualizada em 28/04/2023 21h53

Líderes do povo indígena Mura disseram nesta sexta-feira que as tensões aumentaram onde vivem, na região de Autazes, no Estado do Amazonas, após a visita de uma equipe da Funai para discutir a possibilidade de demarcação de sua terra ancestral, que se sobrepõe a uma área onde uma empresa canadense quer construir uma mina de potássio.

Duas lideranças Mura disseram, em entrevista coletiva organizada pelo Ministério Público Federal do Amazonas, que suas comunidades receberam novas ameaças depois da visita da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) à região, no final de março, para iniciar as discussões sobre a demarcação do território Soares/Urucurituba, onde a Potássio do Brasil planeja construir o projeto de 2,5 bilhões de dólares.

Sérgio, uma liderança Mura, disse que depois da visita da Funai, informações falsas começaram a circular, incluindo a de que "a Funai ia tomar terra de fazendeiro". Sérgio disse que a missão da Funai ocorreu apenas para explicar uma possível demarcação futura, o que seria um longo processo. A área, no entanto, está repleta de conflitos, e tribos amazônicas sofrem há décadas com fazendeiros invadindo suas reservas.

Uma segunda liderança Mura, Adnelson, relatou ameaças "antes e depois" da visita da Funai, incluindo um bilhete deixado no conselho indígena local dizendo que "se (o projeto da) Potássio não acontecer, algum de vocês vai rodar".

A Potássio do Brasil, que pertence à Brazil Potash, com sede em Toronto, já havia negado qualquer coação aos indígenas Mura, e sempre disse que segue o protocolo de consulta à risca.

Em nota, o presidente da Potássio do Brasil, Adriano Espeschit, disse ter tomado conhecimento posterior da coletiva de imprensa.

"Ocorre que, em que pese a Potássio não ter sido convidada a participar, teve conhecimento sobre as acusações realizadas, fortemente estimuladas e incitadas pelo Procurador Federal que acompanha o caso judicialmente, não restando outra alternativa para a empresa a não ser a busca incansável por justiça", disse o presidente, na nota.

O procurador federal Fernando Soave afirmou que as consultas em andamento com o povo Mura não têm sido nem "livres" nem "de boa fé", citando ameaças contra os indígenas desde que a empresa iniciou a tentativa de aprovar o projeto de mina.

O procurador reiterou que as consultas com o povo Mura devem ser suspensas até que os estudos de demarcação sejam concluídos. Aguarda-se decisão judicial a respeito desse pedido.

"Quando começou a consulta, o caos se instalou", disse Soave, acrescentando que entrou em contato com os serviços de proteção à pessoa do Estado para amparar a comunidade indígena.

A Potássio do Brasil precisa de três anos para construir as instalações da mina e pretende iniciar a produção de potássio em 2026.

O Ministério Público Federal do Amazonas já fez vários questionamentos em relação ao projeto da Potássio do Brasil na Justiça Federal, onde existem duas ações civis públicas em trâmite relacionadas ao empreendimento.

O MPF defende, por exemplo, que a competência para o licenciamento ambiental da mina é do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), e não do Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam).

O MPF também pede que o processo de demarcação do território indígena Soares/Urucuritiba, que será afetado pelas atividades da empresa, seja concluído pela Funai antes que as consultas ao povo Mura possam prosseguir.