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REPORTAGEM

Guerra na Ucrânia deixa voos mais longos; como é calculada rota de aviões?

Rota de Moscou para Cuba antes e depois da restrição imposta por diversos países para sobrevoo de aviões russos - Montagem/FlightRadar24
Rota de Moscou para Cuba antes e depois da restrição imposta por diversos países para sobrevoo de aviões russos Imagem: Montagem/FlightRadar24

Alexandre Saconi

Colaboração para o UOL, em São Paulo

11/03/2022 04h00

A guerra entre Ucrânia e Rússia tem afetado seriamente a aviação comercial mundial. Com diversas restrições ao espaço aéreo dos dois países, rotas precisaram ser replanejadas.

Voos estão precisando desviar após proibições de sobrevoo, e acabam levando mais tempo e gastam mais combustível, o que impacta no custo da passagem. As restrições começaram com a proibição de voos sobre a Ucrânia.

Em seguida, diversas empresas deixaram de voar sobre o território russo, e vários países acabaram proibindo que voos da Rússia sobrevoassem seus espaços aéreos.

Como é planejada a rota de um avião?

Segundo o piloto e advogado especializado em direito aeronáutico Paulo Calazans, dois fatores são determinantes para calcular a rota de um voo internacional. De maneira simplificada, o primeiro é se há as devidas autorizações para que a operação seja realizada sobre os territórios no caminho.

O segundo fator é determinar quais caminhos e altitude do avião. Nesse caso, busca-se fazer o caminho o mais reto possível entre os aeroportos de partida e de chegada, visando a redução do tempo de voo e economia de combustível.

Entretanto, isso nem sempre é possível, devido a várias restrições, como espaços onde é proibido voar, excesso de aviões em determinada região ou clima desfavorável. Assim a rota nem sempre consegue ser o mais reta possível.

É possível voar sobre qualquer país?

Os países mantêm acordos bilaterais ou multilaterais para determinar quando uma aeronave de outra nacionalidade poderá sobrevoar seu território. Nesses acordos, são negociadas as autorizações de uso do espaço aéreo conhecidas como liberdades do ar, tais como:

  • Mero sobrevoo
  • Escala técnica para reabastecimento ou reparos
  • Embarque e desembarque de passageiros

Os países ainda estipulam entre si regras, como horários em que isso é permitido, frequências de voos e obrigações de segurança.

Uma vez autorizado, qual caminho escolher?

Passada a fase de autorização, é necessário fazer o planejamento da rota em si, no qual as empresas determinam aspectos como caminhos do avião, velocidade e altitude.

Como há uma grande quantidade de aviões simultaneamente nos céus, foram criadas aerovias, que são caminhos específicos onde os aviões voam para que o tráfego aéreo seja organizado.

Essas estradas aéreas nem sempre são o menor caminho entre dois pontos, mas evitam congestionamentos e possíveis acidentes.

O que fazer quando há restrições?

Existem alguns tipos de restrição que precisam ser levados em consideração na hora do voo. Um deles é a meteorologia, que pode impedir o avião de passar por um determinado local.

Ela costuma ser menos problemática que as demais, já que bastaria o piloto se comunicar com os órgãos controladores de voo para avisar que terá de desviar seu caminho para garantir a segurança.

Outra restrição é específica de alguns espaços aéreos, muitas vezes relacionada à segurança nacional. No Brasil, locais como Barreira do Inferno (local de lançamento de foguetes), Hidrelétrica de Itaipu e Palácio do Planalto não podem ser sobrevoados abaixo de uma certa altitude para evitar atentados terroristas, por exemplo.

Nessas situações, os países mantêm uma lista atualizada das restrições do espaço aéreo, e os voos costumam passar longe desses locais.

Por fim, a restrição mais severa é em caso de guerras ou outros tipos de conflito, como o que está acontecendo na Ucrânia. Invadir um desses espaços pode acabar sendo fatal, mesmo com acordos internacionais proibindo o abatimento de aviões civis por aeronaves militares nessas condições.

Rotas afetadas

Com a guerra em curso, diversos voos que sobrevoavam o território russo foram afetados. O voo de Frankfurt (Alemanha) para Pequim (China) tinha duração média de 8h30min sobrevoando o território russo. Com a necessidade de dar a volta pela parte central da Ásia, o mesmo voo passou a durar cerca de 10h10min.

Voos russos também foram proibidos de sobrevoar o território dos Estados Unidos. Com isso, o voo de Moscou (Rússia) com destino a Cuba, que tem duração média de 12 horas, passou a levar mais de 14 horas para ser concluído devido à proibição de voar no espaço aéreo dos EUA.

Até mesmo voos dentro da própria Rússia acabaram sendo afetados, como aqueles entre Moscou e Kaliningrado, área russa entre a Polônia e a Lituânia.

Com as restrições de sobrevoo nos dois países, os aviões têm de decolar rumo ao norte, próximo a São Petesburgo, adentrar no mar Báltico pelo Golfo da Finlândia (que separa a Finlândia da Estônia), e se dirigir a Kaliningrado sem sobrevoar outro país, apenas águas.

Em linha reta, a distância entre as duas cidades é de pouco mais de mil quilômetros. Com o desvio, é preciso voar cerca de 1.600 km ao todo.

Uso de força militar contra aviões civis

Segundo Calazans, um dos pontos mais importantes sobre o fechamento de um espaço aéreo é a consequência de uma eventual violação por um avião civil. Isso se deve ao fato de que a comunidade internacional não admite o uso de força contra aeronaves civis.

Essa questão ganhou maior relevância com a derrubada do avião do voo 007 da Korean Airlines, que foi interceptado por aviões soviéticos na região russa das ilhas Sacalina em 1983. A bordo, estavam 269 pessoas que tinham partido dos Estados Unidos com destino à Coreia do Sul. Todos morreram no ataque.

Investigações apontaram que, um dia antes, um avião militar dos EUA havia feito a mesma rota do voo 007, o que teria motivado o ataque. Após esse caso, afirma Calazans, passou a ser expressamente proibido o uso da força contra aviões civis, em decorrência da adoção do protocolo de Montreal em 1984.

Mais recentemente, em 2014, um avião da Malaysia Airlines foi derrubado em uma região da Ucrânia controlada por separatistas pró-Rússia à época após ser atingido por um míssil disparado do solo. As 298 pessoas a bordo morreram, e as razões para o ataque ainda não foram completamente esclarecidas até hoje.

Em 2020, um avião ucraniano foi derrubado sobre o Irã. Segundo o governo daquele país, um militar tomou a decisão errada e disparou o míssil por engano, matando todas as 176 pessoas a bordo.