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Flexibilização do BCE acarreta resultados indesejados para compradores de ações de empresas europeias

Sofia Horta e Costa

07/09/2015 15h28

(Bloomberg) - O programa de estímulo de Mario Draghi não obteve muito sucesso na tentativa de liberar pela Europa o instinto animal desejado. Eis a prova: após seis meses, 96 por cento das empresas no Euro Stoxx 50 Index ficaram mais baratas em relação aos lucros.

O plano do Banco Central Europeu de inundar o sistema financeiro com dinheiro através da compra de bonds deveria ter desencadeado o mesmo ímpeto de assumir riscos provocado nos EUA seis anos atrás. Na verdade, aconteceu o contrário, culminando na eliminação de até US$ 526 bilhões do valor das ações no mês passado.

O fracasso da flexibilização quantitativa europeia para aumentar a confiança nas ações é um sinal preocupante para os altistas em um momento em que vários mercados, de Xangai a Nova York, estão sofrendo as piores corridas para venda desde 2011. Em vez de distinguir a Europa como refúgio, o programa de Draghi tem sido marginalizado no mercado acionário por acontecimentos como o impasse com o crédito da Grécia. O Euro Stoxx 50 perdeu 9,2 por cento em agosto em meio à preocupação de que a economia da China reprima o crescimento mundial. O índice se recuperou 1,2 por cento nesta segunda-feira depois de uma queda semanal.

"As pessoas ficam muito nervosas quando sentem que já não restam alavancas políticas", disse Graham Secker, diretor de estratégia acionária para a Europa do Morgan Stanley, em entrevista por telefone, de Londres. "A confiança dos investidores está extremamente baixa neste momento, e todo mundo quer reduzir os riscos. Eles não veem que vai sair ao resgate".

Progresso sem efeitos

Segundo os dados econômicos, a Europa está progredindo. O desemprego na região caiu inesperadamente, e a produção industrial na Alemanha se expandiu a um ritmo mais rápido. Os economistas projetam que o PIB da Europa vai crescer 1,5 por cento neste ano, a taxa mais alta desde 2011. E os analistas continuam estimando que os lucros das empresas do bloco monetário aumentarão 12 por cento neste ano.

Os números não estão sendo de muita ajuda para as ações. Na última queda, as avaliações no Euro Stoxx 50 desabaram para 12,4 vezes os lucros projetados, em comparação com 15,3 vezes quando o programa de Draghi começou em março. Empurrado para baixo pelas ações de exportadores e comerciantes de commodities, o indicador despencou 13 por cento nas últimas quatro semanas - quase duas vezes mais que o Standard Poor's 500 Index, onde as razões entre preços e lucros estão cerca de 19 por cento mais altas.

As fabricantes de carros da Europa - as empresas mais beneficiadas pela desvalorização do euro - observaram uma queda de até 34 por cento em suas avaliações em relação ao pico deste ano. Um tombo similar ocorreu nas avaliações de ações de empresas de energia, e um indicador das ações de empresas de produtos químicos ficou 22 por cento mais barato. A Vinci SA e a Vivendi SA, da França, se destacam como as duas únicas companhias no Euro Stoxx 50 negociadas a múltiplos mais altos do que naquela época.

'Confuso'

"É muito confuso - não há nada no horizonte da economia ou dos lucros com um aspecto ruim para a Europa", disse Teis Knuthsen, chefe de investimentos da unidade de private banking do Saxo Bank A/S em Hellerup, Dinamarca. "A corrida para venda não foi estresse econômico, foi estresse financeiro. Agora, muitas companhias boas parecem baratas considerando-se que não houve muita mudança nos fundamentos".

O perigo é que elas permaneçam baratas, pois o Fed está se preparando para elevar as taxas de juros, embora o FMI tenha dito que a perspectiva para a expansão mundial é pior do que a prevista há menos de dois meses. Os traders estimam uma chance de 30 por cento de que as taxas aumentem neste mês.

"A China está ameaçando desacelerar o crescimento mundial em um momento em que o Fed vai ajustar", disse Luca Paolini, estrategista-chefe da Pictet Asset Management em Londres. "Esse ambiente não é nem um pouco bom. O BCE não pode sustentar a recuperação sozinho, e os fundamentos se deterioraram nitidamente. Os lucros europeus não estão a salvo disso".