Ainda a novela da desoneração da folha
O Ministro Fernando Haddad tem uma difícil tarefa neste ano: cumprir a meta fiscal estabelecida da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2024. A meta é de déficit zero ou de pelo menos 0,25% do PIB no intervalo inferior, algo próximo de R$ 28 bilhões.
Não se trata de um capricho. A sustentabilidade fiscal é condição necessária para o crescimento econômico. Em que pese isso, o ministro não conta com a colaboração de boa parte do seu governo e do Congresso. São sucessivas decisões que elevam gastos e reduzem receitas.
Um exemplo emblemático disso é o da desoneração da folha de pagamentos de 17 setores econômicos. Essa política foi adotada em 2011, mas sem qualquer comprovação de sua eficácia para elevar o emprego, foi sucessivamente prorrogada e consome bilhões de reais todos os anos na forma de renúncia de receita.
No fim do ano passado, o Congresso aprovou uma vez mais a prorrogação dessa política, a um custo de pelo menos R$ 12 bilhões, advindo do menor recolhimento de contribuição previdência pelos setores beneficiados. E como se não bastasse, reduziu a contribuição previdenciária dos municípios menores, a um custo de R$ 4 bilhões. A decisão provocou, portanto, uma perda de R$ 16 bilhões.
É papel do Congresso aprovar políticas públicas que julga adequadas para o país. Entretanto, as decisões precisam estar minimamente balizadas em estudos que comprovem sua eficácia. E uma vez comprovada, encontrar fontes adequadas de financiamento para não desequilibrar o orçamento. Mas nada disso foi feito e o orçamento federal de 2024 foi aprovado com esse rombo de R$ 16 bilhões.
O Poder Executivo Federal, por orientação da equipe econômica, até vetou a lei aprovada pelo Congresso, mas o veto foi derrubado. Nova tentativa foi feita com uma medida provisória que revogou a desoneração e introduziu outra, com um custo menor, de R$ 5,6 bilhões, em 2024, número esse decrescente nos anos seguintes.
Novamente, fortemente pressionado pelo Congresso e pelos lobbies dos favorecidos pelo benefício, o Poder Executivo Federal foi obrigado a substituir a medida provisória por um projeto de lei, sem vigência imediata, portanto, e sem prazo para apreciação.
O benefício aos municípios permaneceu revogado pela medida provisória, mas a pressão deverá restabelecer essa parte da desoneração também. É uma péssima política, pois os municípios com regime previdenciário próprio acabarão optando pelo regime geral, repartindo com todo país o custo da aposentadoria dos seus servidores.
Estamos, portanto, na estaca zero nesse tema, com um rombo de R$ 16 bilhões para equacionar. Vamos acompanhar o restante da novela nos próximos meses. Se essa política é intocável, então que pelo menos se aponte uma compensação para os R$ 16 bilhões. Com sorte, haverá alguma modificação na lei aprovada pelo Congresso para introduzir um cronograma de redução gradual da desoneração até sua extinção.
Da forma como está atualmente, a desoneração permanecerá intacta até 2027. É claro que, deste modo, veremos em 2026, exatamente o que aconteceu no ano passado: lobbies pelos corredores de Brasília, políticos preocupados com popularidade e mais anos de desoneração e isso se não tiverem a genial ideia de tornar a política permanente.
O país precisa amadurecer bastante nessa área fiscal. Decisões que custam bilhões precisam estar bem fundamentadas e não apenas servir a interesses. Os recursos necessários precisam ser claramente apontados. Do modo como se faz, a decisão é tomada e os custos recaem sobre toda a sociedade na forma de desequilíbrio fiscal e menor crescimento econômico.
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