Tarcísio está correto no plano de ajuste fiscal
O anúncio de um plano de revisão de gastos públicos e renúncias tributárias (associadas a benefícios do ICMS) está na direção certa.
São Paulo, desde o governo Mário Covas, em 1995, reergueu suas finanças públicas para nunca mais ter problemas com o Orçamento e o financiamento de investimentos e políticas públicas em geral. A continuidade é o caminho correto.
O governador Tarcísio de Freitas comprometeu-se com cortes de gastos, em todas as pastas, indicando que haverá contenção de despesas com pessoal, inclusive. Em paralelo, minha sugestão é que encaminhe também uma reforma administrativa mais estrutural, para fortalecer as carreiras de estado e guarnecer áreas que precisam de modernização e suporte.
A revisão de gastos, conhecida na literatura acadêmica como "spending review", já era um plano do ex-governador Rodrigo Garcia, gestão em que trabalhei como secretário da Fazenda e Planejamento. Deixamos pronta uma minuta de decreto para esse assunto e folgo em saber que o tema ganha agora prioridade máxima do Governador Tarcísio. Todos os jornais do país destacaram o feito. Cito o excelente editorial da lavra do Estadão: "São Paulo aponta o caminho das pedras".
O corte de gastos não é um fim em si mesmo. Tenho escrito neste espaço: precisamos discutir uma reforma orçamentária mais ampla, e isso vale para qualquer governo, independentemente da coloração partidária. Não há outro caminho para a prosperidade a não ser a responsabilidade fiscal, o respeito ao dinheiro público e a permanente avaliação de cada centavo gasto com recursos arrecadados da população.
A revisão de benefícios tributários é um tema intrincado e também se insere na agenda fiscal. Em São Paulo, criamos, no meu período na Fazenda, algumas novidades:
- a) processo formal para tramitação de novos pedidos de benefícios tributários;
- b) organização para avaliação do estoque de pedidos, desovando demandas que estavam paradas há bastante tempo;
- c) elaboração de minuta para o Comitê de Avaliação de Benefícios Tributários (CABT), instalado recentemente na gestão atual;
- d) elaboração de um conjunto de indicadores para classificação, avaliação e monitoramento dos benefícios tributários, iniciativa apresentada por mim, à época, ao relator das contas do governador de São Paulo no Tribunal de Contas do Estado (TCE), o Conselheiro Antônio Roque Citadini;
- e) aumento da transparência, criando-se modus operandi para transmissão de informações relevantes aos órgãos de controle.
Vamos nos entender. Em meio à Guerra Fiscal entre os estados, não há como simplesmente abrir mão de todo e qualquer benefício. Mas é preciso avaliar e ter clareza sobre o que é necessário e gera resultado, em termos de novos investimentos e empregos, e o que está dependurado nos orçamentos apenas por inércia. A fala do Governador Tarcísio, na semana passada, foi nessa direção. Um grande acerto.
É preocupante que a reforma tributária aprovada pelo Congresso, a Emenda 132, de 2023, tenha preservado a Guerra Fiscal, já que os incentivos do ICMS persistirão ao menos até 2032. E tendem a aumentar, porque nada impedirá a chamada "cola", procedimento segundo o qual um estado da mesma região de outro copia um benefício vigente por lá. O ideal seria um programa de redução paulatina, com uma transição razoável, pagando-se o custo por isso.
No lugar dessa diretriz, adotou-se a tática de empurrar com a barriga. A transição dos impostos antigos - ICMS e ISS - só acontecerá a partir de 2029, terminando em 2032. A chance de dar errado é gigantesca. A pressão para prorrogação de prazos será enorme.
São Paulo está saindo na frente, como sempre, mostrando disposição em reduzir incentivos, sem jogar o bebê com a água suja do banho. Seria ideal que o governo federal seguisse o exemplo. Há mais de meio trilhão em benefícios tributários e regimes especiais em vigor no país, apenas no que se refere a tributos federais. O ministro Haddad modificou um deles, no ano passado. Escrevi aqui sobre isso: a dupla subvenção concedida em cima de benefícios do ICMS, que eram abatidos do lucro pelas empresas, erodindo o erário.
Quanto à renegociação da dívida do estado de São Paulo com a União, dou uma sugestão ao Governador Tarcísio. Entendo que não se trata de reduzir o indexador, hoje em IPCA+4% ou Selic (o que for menor). Esse indexador já está até mais baixo, em muitos casos, do que a remuneração ofertada nos títulos federais, que estão saindo a mais de 6% de juros reais, em razão da piora das perspectivas com a política fiscal combinada com o ambiente externo adverso.
Entendo que o melhor caminho para São Paulo é a flexibilização dos critérios hoje aplicados ao estado para avaliação de crédito e capacidade de pagamento. Explico. São Paulo tem uma dívida elevada porque investe muito. Há excesso de oferta de crédito, porque os projetos para o metrô, rodovias e investimentos em geral são consistentes e saem do papel. Não é à toa que o estoque de infraestrutura do estado dá de lavada nos demais.
Ocorre que, assim como os países ricos têm dívida alta, um estado como São Paulo também tem. Nada de errado, porque a capacidade de gerar renda e riqueza é alta. Só que ele enfrenta uma restrição, um limite restritivo para o chamado serviço da dívida. O serviço nada mais é do que o pagamento de juro acrescido da amortização, período a período.
Entendo que esse limite não tem qualquer cabimento para um estado que gera receita, cresce e carrega a economia do país nas costas. A melhor saída para São Paulo não é pleitear a redução do indexador, mas uma mudança no limite para o serviço da dívida. O risco de tomar novos empréstimos para aumentar ainda mais os bons investimentos será de São Paulo, e a União nada tem que ver com isso. Teria, sim, se o estado estivesse em maus lençóis.
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A herança recebida pelo atual governo paulista é bendita, fruto de uma sequência de gestões fiscais responsáveis. Lembro-me de como o ex-governador José Serra (2007-2010), por exemplo, expandiu fortemente os investimentos e cortou gastos de custeio, na linha do que o governador Tarcísio planeja fazer.
São Paulo saiu na frente e merece aplauso nesta temática. Certamente, colherá muitos bons frutos derivados da responsabilidade fiscal permanente como diretriz central de suas políticas públicas.
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