Raio-X: fundos, bancos e fornecedores 'micaram' com R$ 4 bi na Agrogalaxy
Dos R$ 4,6 bilhões da dívida que levou à Agrogalaxy à lona, R$ 4 bilhões estão na mão dos 100 maiores credores. São fornecedores de insumos da varejista, investidores de CRAs (certificados de recebíveis agrícolas), um título de dívida privada que majoritariamente foi parar em portfólios de fundos negociados com investidores, e os maiores bancos brasileiros.
O UOL analisou a lista de credores que a Agrogalaxy e suas subsidiárias entregou à Justiça de Goiás na última quarta, como anexo ao seu pedido de recuperação judicial. Trata-se do maior baque sofrido pelo mercado de capitais brasileiro desde a descoberta da fraude contábil das Americanas, que contaminou o mercado de títulos de dívida corporativa no país, em 2022.
Agora, a Justiça de Goiás vai decidir se a companhia atende ou não aos requisitos do processo de recuperação judicial. Neste cenário, a empresa vai tentar renegociar as dívidas com os credores e tentar aprovar um plano de reestruturação das dívidas para continuar em atividade.
A primeira vitória parcial a Agrogalaxy obteve com uma liminar (decisão provisória) da juíza Alessandra Gontijo do Amaral, da 19ª Vara Cível e Ambiental de Goiânia, suspendeu a execução de dívidas da empresa por 45 dias, a contar da última quarta, até a decisão do mérito. Como o UOL antecipou na noite de quinta, isso deve garantir um fôlego de R$ 205 milhões de dinheiro que estão nas contas ou vão entrar nos próximos dias.
O cotista de fundos vai sentir dor
Desde que passou a ser negociada na B3 em 2021, a Agrogalaxy adotou uma estratégia agressiva de expansão pelo país, principalmente via aquisições. A empresa tem atualmente 149 lojas de insumos em 14 estados, além de silos para armazenar grãos, centros de distribuição e unidades de produção de sementes. A companhia tem 2.000 empregados. Para atingir essa abrangência, emitiu dívida corporativa através de instrumentos como o CRA.
A análise da lista de credores mostra que - diferentemente das Americanas, que provocou prejuízo bilionário majoritariamente a bancos, fornecedores e investidores de ações - agora quem buscou a segurança de investimentos da renda fixa ou apostou em Fiagros (Fundos de Investimento de ativos ligados ao agro) também vai sentir dor.
No papel, o maior credor da Agrogalaxy é a Vert Securitizadora, com R$ 516 milhões a receber na recuperação judicial. Na verdade, a Vert aparece como credora porque participou da emissão dos CRAs. Os verdadeiros credores são as instituições ou indivíduos que adquiriram estes papeis no mercado. Aí estão tanto fundos de investimento e Fiagros, por exemplo. Em última análise, o credor, neste caso, é o cotista.
Ao todo, segundo os documentos protocolados na Justiça goiana, a indústria de fundos e investidores de CRAs tem uma exposição direta de R$ 916 milhões - quase 20% da dívida total conhecida até agora. Como ninguém sabe o quanto desse dinheiro pode ser recuperado (se é que algo), o rendimento dos cotistas destes fundos deve cair a partir de agora.
Exposição de bancos é de R$ 1,2 bi
A dívida que a Agrogalaxy deixou no espeto com os bancos é de R$ 1,2 bilhão e é provável que o próximo balanço, previsto para o mês que vêm, já reflita isso.
Quanto cada banco tem a receber da Agrogalaxy:
Banco do Brasil - R$ 395 milhões
Citibank - R$ 283 milhões
Santander - R$ 278 milhões
Banco Industrial do Brasil - R$ 72 milhões
Itaú Unibanco - R$ 71 milhões
Banco ABC - R$ 59 milhões
Banco Bocom BBM - 31,5 milhões
BTG Pactual - R$ 24 milhões
A conta considera as dívidas em real e dólar - estas últimas foram convertidas pelo câmbio desta sexta (R$ 5,52) e somadas às dívidas em real.
Banco ABC puxou o gatilho
O Banco ABC foi mais rápido que os demais para perceber o que estava acontecendo dentro da Agrogalaxy. Neste tipo de empréstimo a grandes empresas, os contratos geralmente incluem cláusulas que permitem a antecipação da liquidação do débito e a retirada do dinheiro da conta em determinadas condições.
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Quero receberEntre os dias 11 e 12 de setembro, o banco executou antecipadamente R$ 36 milhões que estavam em contas vinculadas, ligadas ao fluxo de recebíveis da Agrogalaxy. Com isso, a varejista ficou impossibilitada de pagar uma parcela de R$ 70 milhões de um CRA (Certificado de Recebíveis do Agronegócio) de R$ 500 milhões.
O vencimento da parcela faria com que os demais credores corressem para fazer valer cláusulas contratuais que autorizam a execução antecipada de dívidas e recebíveis, e de bens dados à garantia.
Ao tirar esse dinheiro das contas, o ABC acionou o gatilho do pedido de recuperação judicial.
Bradesco e Safra, que foram atingidos no caso Americanas, agora escaparam praticamente ilesos. O primeiro tem a receber R$ 323 mil e o segundo, R$ 823 mil.
Fornecedores
A maior parte da dívida, contudo, é com fornecedores, como indústrias de fertilizantes e defensivos agrícolas. Entre os 100 maiores credores, os fornecedores têm a receber R$ 1,9 bilhão
Os principais credores são:
FMC Química do Brasil - R$ 254 milhões
Mosaic do Brasil - R$ 220 milhões
Albaugh Agro Brasil - R$ 140 milhões
Rainbow Defensivos Agrícolas - R$ 132 milhões
Total Biotecnologia - R$ 115 milhões
Adama Brasil - R$ 102 milhões
UPL do Brasil - R$ 78 milhões
Sumitomo Chemical Brasil - R$ 69 milhões
Longping High Tech - R$ 53 milhões
Agro Industrial São Luiz Ltda - R$ 51 milhões
BASF - R$ 43 milhões
ICL América do Sul - R$ 39 milhões
Santa Clara Agrociência - R$ 33 milhões
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