Por que esta pedra, que cresce na vesícula do boi, vale o dobro do ouro
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José Oliveira, 59, fundou a Oxgall no interior de Goiás há dez anos para explorar um ramo extremamente lucrativo no meio da pecuária tradicional: ele é um broker de pedra de fel bovino, como são conhecidos os cálculos que surgem nas vesículas dos bois, altamente valorizados por seu uso na medicina tradicional chinesa.
Um grama desses nódulos de bile endurecida chega a ser negociado por US$ 230 nas grandes cidades da China —o dobro da cotação atual do ouro.
"Antigamente isso era uma coisa que se jogava fora. Hoje os frigoríficos têm até segurança para a extração das pedras. Há uns dez anos, um indiano me procurou perguntando se eu não conseguia encontrar essas pedras e foi aí que eu entrei no negócio", disse ao UOL.
A Oxgall, de Oliveira, é uma empresa familiar que compra o produto de frigoríficos e pequenos produtores de todo o país. As pedras variam de qualidade e são classificadas pela empresa, que paga entre R$ 30 e R$ 900.
Ao chegar à Ásia, o grama da bile endurecida de maior qualidade —que tem uma coloração amarelo-escura— é cotado a partir de US$ 200 o grama (no caso das pedras de maior qualidade).
O goiano desconversa quando perguntado se o negócio o deixou rico. Ele se prepara para mudar para Hong Kong, de onde pretende vender a mercadoria diretamente para os mercados de Xangai e Pequim.
Na semana passada, o jornal americano The Wall Street Journal publicou uma reportagem sobre esses cálculos biliares produzidos pelo rebanho brasileiro. Segundo o relato da repórter Samantha Pearson, a demanda é crescente, impulsionada pelo envelhecimento da população e pelo aumento de doenças como hipertensão e obesidade na China.
Citando dados da OMS (Organização Mundial da Saúde), o jornal financeiro americano afirmou que ingredientes usados pela medicina tradicional chinesa movimentam uma indústria de US$ 60 bilhões anuais.
A extração dos cálculos biliares não é uma atividade ilegal no Brasil, mas o comércio opera em grande parte na informalidade.

O WSJ citou casos de assaltos a fazendas e frigoríficos, além de contrabando sofisticado, com pedras escondidas em produtos diversos para evitar fiscalização. Em alguns países da América do Sul, como o Uruguai, já houve condenações por tráfico ilegal do produto, evidenciando o crescimento desse mercado paralelo.
"Com os frigoríficos, que operam com nota fiscal, não há problema. Mas uma parte do problema é a própria burocracia da Receita Federal, que prefere deixar de arrecadar quando o produto é vendido por pequenos produtores estabelecendo obrigações que eles não têm como cumprir. Uma vaca de leite idosa quebra a perna e você acha que ela será descartada ou aquela família vai aproveitar o que der?", disse Oliveira, da Oxgall.
Sair abatendo indiscriminadamente bois e vacas para ver se há algo dentro da vesícula não é uma boa ideia. Não existe uma explicação no campo da medicina veterinária sobre por que essas pedras se formam apenas em uma minoria dos animais enquanto outros animais similares (às vezes com a mesma genética e alimentação) passam a vida sem desenvolver nódulos.
O que se sabe é que a prevalência é maior entre animais mais velhos e de raças leiteiras. É um perfil cada vez mais raro de animal na pecuária brasileira, marcada por alimentação mais controlada e períodos de engorda mais curtos, fatores que reduzem a incidência natural dessas pedras.
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