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José Paulo Kupfer

Nova CPMF: o que muda na economia caso seja aprovada

11/08/2020 11h00

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Depois de falar grosso contra a recriação de algum tipo de contribuição sobre movimentações financeiras, como a velha e rejeitada CPMF, o presidente Jair Bolsonaro acabou falando fino diante de argumentos do ministro da Economia, Paulo Guedes, ardoroso defensor desse tributo. Bolsonaro autorizou Guedes a levar adiante, no Congresso, sondagens sobre a aceitação do tributo.

Não se sabe quais argumentos Guedes usou para convencer Bolsonaro. Mas é muito provável que o principal deles seja o de que esse é um tributo fácil de cobrar, praticamente automático, que resulta em grandes volumes de arrecadação. Pagou boleto, fatura de cartão, sacou ou depositou na conta bancária, comprou a prazo, fez um cheque - pronto, um pedacinho do valor da operação já foi para o governo.

Essa característica peculiar da CPMF é a mesma que atraiu simpatias de todos os governantes brasileiros desde a sua criação em 1993, ainda como imposto e não como contribuição, no governo de Itamar Franco, tendo o ex-presidente Fernando Henrique no comando do ministério da Fazenda. Impostos e contribuições são, por natureza, declaratórios - ou seja, é preciso declarar que um dado fato gerou o tributo e recolhê-lo aos cofres públicos. Cabe ao governo fiscalizar se a declaração é verdade e, preliminarmente, se foi feita.

Nas estimativas do próprio governo, com alíquota de 0,2%, a nova CPMF arrecadaria R$ 120 bilhões por ano. Outra vantagem, como se percebe: com uma taxa bem pequena, quase imperceptível, muito dinheiro iria para os cofres públicos. Cálculos mostram que, se isso se confirmasse, seria o quarto maior volume em tributos pagos ao governo, ficando atrás apenas do Imposto de Renda (pessoa física e jurídica), Previdência e Cofins.

O problema que tributos tipo CPMF são péssimos do ponto de vista da eficiência do uso dos recursos arrecadados dos contribuintes. São péssimos também na questão fundamental da incidência sobre aqueles contribuintes de maior renda e, portanto, maior capacidade contributiva. Tudo considerado, uma CPMF ajuda a consolidar a ineficiência na economia, o que significa, no fim do processo, menos crescimento, menos empregos e menos bem-estar em geral para a população.

Como qualquer operação financeira gera recolhimento do tributo, não há distinção entre os pagantes. Ricos e pobres, em termos proporcionais, pagam igualmente. É evidente que, quando pobres pagam tanto quanto ricos, sobra menos renda aos pobres para consumo e poupança do que aos ricos. A economia como um todo se ressente da redução da renda disponível da maior parcela da população.

São muitos os problemas do ponto de vista da eficiência econômica. Estimular ou desestimular setores produtivos faz parte das atribuições de um bom sistema tributário. No caso de uma CPMF, isso inexiste. Como a contribuição é cobrada, cumulativamente, em cada etapa de produção, quanto mais longa a cadeia produtiva setorial, mais a taxa será paga. Não interessa se é a cadeia de produção do pão ou do cigarro. Detalhe: a cobrança é repetida tantas vezes quantas forem as etapas de produção, carregando para a etapa seguinte o imposto que já foi pago na anterior, numa dupla contagem sem fim.

A ineficiência econômica é inevitável - e grave - quando se observa que uma CPMF estimula a verticalização da produção. Para fugir do pagamento do imposto, uma manobra óbvia é procurar produzir "dentro de casa" o máximo de insumos e partes que poderiam ser adquiridos de fornecedores externos. Ocorre que esse fornecedor externo normalmente produz com mais eficiência e a custos mais baixos do que o integrador, agora estimulado pela CPMF a ele mesmo produzir, com menos eficiência, a peça ou o insumo antes adquirido fora.

Resumo da história: tributos do tipo CPMF são daqueles que sugerem ser uma solução simples e atraente para um problema complexo. Mas essa ideia é totalmente equivocada. O governo arrecadará mais e com mais facilidade, mas, para a economia e os brasileiros, na volta do parafuso, o resultado, sob a forma de crescimento econômico e da expansão dos empregos, será frágil.