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Manobras e pedaladas em Orçamento que privilegia militares e parlamentares
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Orçamentos anuais são, quase por definição, peças de ficção. Elaborados num ano, para vigorar em outro, dependem de projeções de certos parâmetros - inflação, variação da economia, salário mínimo - e da escolha de premissas. É comum e natural a superestimação de receitas e a subestimação de despesas.
O Orçamento de 2021, aprovado na noite desta quinta-feira (25), no Congresso Nacional, é forte candidato ao título de ficção das ficções. O conjunto de despesas públicas limitadas pela regra do teto de gastos, e acomodadas pela arrecadação de tributos estimada à meta de déficit primário, só fecha no papel.
Na verdade, os valores de referência contidos no Orçamento estão defasados e tanto gastos quanto receitas passaram por maquiagens variadas. O governo, por intermédio do ministro da Economia, Paulo Guedes, já sabia que as contas do projeto orçamentário apresentado em agosto do ano passado estavam desatualizadas. Esse fato ficou público na segunda-feira (22), com a publicação do relatório de avaliação de despesas e receitas do primeiro bimestre de 2021. A tempo, portanto, de ser modificado no texto do relator, senador Márcio Bittar (MDB-AC).
Mas Guedes não enviou ao Congresso pedido de modificação das previsões e parâmetros. A falta de transparência envolveu os ajustes promovidos pelo Congresso no texto. Não sabe, por exemplo, por que razão o ministro não encaminhou nota modificativa ao relator. Uma das especulações é a de que a ideia era mesmo alterar o Orçamento depois de aprovado.
É fato que o Orçamento não ficará do jeito como saiu do Congresso. Houve acordo com a oposição segundo o qual o governo, por meio de créditos extraordinários, melhoraria as dotações para os setores da Saúde, Educação e necessidades da máquina pública, como a realização do Censo Demográfico. A desidratação promovida nos recursos destinados ao Censo, que já deveria ter sido realizado em 2020, foi de tal ordem que o inviabilizou.
Não há hipótese também de que os recursos destinados ao custeio da máquina pública se restrinjam ao destinado no Orçamento aprovado. O jogo de ajustes e acomodações de despesas para contê-las nos limites determinados pelo teto de gastos resultou numa sobra inferior a R$ 80 bilhões manter o governo funcionando. Especialistas, no entanto, garantem que, com o nível de gastos fixado, a máquina entraria em shutdown, ou seja ficaria sujeita a paralisações em sequência.
Embora o Orçamento apresente folga em relação à meta de resultado primário - um déficit de quase R$ 250 bilhões -, para conter despesas dentro dos limites do teto, até mesmo alguns gastos obrigatórios foram subestimados, jogados para a frente, em manobras burocráticas, ou, simplesmente, passados pela tesoura. Foram atingidos assim benefícios previdenciários, seguro-desemprego e abono salarial.
No caso dos dois primeiros, as restrições e cortes são apenas pró-forma, uma vez que os benefícios terão de ser pagos a todos os legalmente habilitados. O abono salarial, porém, sofreu o que já está sendo chamado de pedalada. Os pagamentos, feitos no segundo semestre, foram postergados para 2022.
Em meio à pandemia de covid-19, os parlamentares se preocuparam em abrir espaços no Orçamento para dois setores: eles mesmos e militares. Únicos servidores públicos com previsão de reajuste salarial, os militares também foram blindados de eventuais congelamentos salariais e gatilhos de cortes. Além disso, o ministério da Defesa ficou com R$ 8 bilhões dos parcos recursos destinados a investimentos. O valor representa mais de um quinto do total previsto.
Empurra e puxa daqui e dali, os próprios parlamentares conseguiram emplacar R$ 50 bilhões em emendas para obras em seus redutos eleitorais. Daí porque o ministério do Desenvolvimento Regional foi mais aquinhoado do que, por exemplo, Saúde e Educação, setores aos quais foram direcionados recursos em valor suficiente apenas para cumprir o piso constitucional.
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