José Paulo Kupfer

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Opinião

Lula fragiliza governança e potencializa especulação com ações da Petrobras

As frequentes e polêmicas intervenções de governos na Petrobras são fertilizantes para a especulação com as ações da companhia, negociadas na Bolsa de Valores. Da escolha de Jean Paul Prates para presidir a empresa, na entrada do terceiro mandato de Lula, até sua demissão, nesta terça-feira (14), as cotações têm vivido violenta gangorra, num exemplo mais recente e repetitivo na história da empresa.

Esse vaivém reflete os múltiplos interesses envolvidos na empresa de economia mista, controlada pela União, mas com um exército de investidores privados, nacionais e estrangeiros.

Gangorra nas cotações

Já a indicação e nomeação de Prates derrubaram as cotações, na virada de 2023 para 2024. No dia em que o conselho de administração da empresa aprovou o indicado de Lula, os papéis preferenciais da Petrobras chegaram a cair perto de 5%.

O "temor" era o mesmo que se renovou a cada chacoalhada na governança da companhia, de lá para cá. O mercado financeiro se "assustava" com a intervenção do governo na Petrobras, principalmente com o anúncio de mudanças na política de paridade internacional de preços, mantida desde o governo Temer. Aqui vale lembrar que, por atender aos interesses dos acionistas privados, a mudança na política de formação de preços empreendida por Temer não foi considerada como intervenção.

Trocar uma política de que fixava preços de acordo com as cotações internacionais, sem considerar os custos internos de produção muito mais baixos, por algum outro sistema que incorporasse esses ganhos de produtividade e evitasse os riscos, para o restante da economia, de altas fortes e frequentes nos preços, era visto como prejudicial aos acionistas.

Essa era — e é — apenas uma hipótese, mas foi suficiente para deflagrar uma onda de vendas de ações. Nos primeiros dias de janeiro do ano passado, o valor de mercado da Petrobras recuou para menos de R$ 495 bilhões.

De volta ao pico

O movimento, contudo, não durou muito. Já em meados de janeiro, as ações da Petrobras, em que pese a confirmação da mudança na política de preços, voltaram a ser compradas. O fato é que um mês depois, na segunda quinzena de fevereiro, o valor de mercado da empresa bateu num pico histórico, atingindo R$ 567 bilhões.

Foi então que começaram a circular informações das desavenças entre Prates e o ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira sobre a distribuição dos dividendos extraordinários — acima da obrigação legal — de 2023. Silveira, com o apoio de Rui Costa, ministro-chefe da Casa Civil, queria reter a totalidade desses lucros, para engordar o caixa da Petrobras e sustentar planos de investimento em gasodutos, energias alternativas e, indústria naval, um velho fantasma acalentado por Lula.

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De novo para o chão

Enquanto a Petrobras continuava a entregar aumento de produção e exportação, os pregões mudaram mais uma vez de direção. Entre meados de fevereiro e a primeira semana de março, a cotação do papel preferencial despencou, reduzindo o valor de mercado da companhia em quase R$ 40 bilhões, para R$ 530 bilhões.

Quando, em 7 de março, o bloqueio dos dividendos extraordinários foi anunciado, o movimento de baixa se acentuou. Em 11 de março, três pregões depois, o tombo no valor de mercado somou mais de R$ 60 bilhões, com recuo para R$ 466 bilhões, o ponto mais baixo desde janeiro.

O ambiente, como se confirmou, com a demissão de Prates, não estava pacificado, mas, depois de um verdadeiro bombardeio com a perda de valor de mercado da Petrobras, a situação amainou e a saída de Prates entrou em hibernação. Mesmo assim, uma nova reviravolta, agora para cima, ocorreu nas cotações da ação da empresa.

Do vale do valor de mercado, em 11 de março, a pouco antes da demissão de Prates, na primeira semana de maio, a cotação do papel da Petrobras registrou um novo intervalo de sucessivas altas. Com aumento de R$ 95 bilhões, o valor de mercado praticamente voltou ao recorde de fevereiro, alcançando R$ 562 bilhões. Nesse meio tempo, é verdade, o governo decidiu distribuir aos acionistas metade do lucro extraordinário retido.

Mais uma vez para baixo

Com a confirmação da saída de Prates e a indicação da engenheira e ex-diretora-geral da ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), no governo Dilma Rousseff, a cotação dos papeis da Petrobras voltou a desabar. Na esteira de especulações sobre a submissão de Chambriard aos desejos de usar os ganhos da Petrobras para ampliar investimentos, deixando os acionistas a ver navios, a perda do valor de mercado, desta vez, foi de quase R$ 50 bilhões, em dois pregões.

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A extrema volatilidade das cotações da ações da Petrobras nestes pouco menos um ano e cinco meses de governo Lula não é apenas reflexo de "oportunidades" aproveitadas por operadores de mercado. A base para que o estabelecimento desse sobe e desce das ações é a bagunça que se instalou na governança da companhia.

Limites para intervenções

Cabe ao governo não esquecer que há limites para intervenções na Petrobras, mesmo que sua ação, com base no poder de controle que detém na empresa, seja legítimo. Mesmo estratégica para o país — pelo setor chave em que opera, por seu impacto no conjunto da economia e até por sua história —, a Petrobras não deixa de ser uma empresa de economia mista, na qual os múltiplos interesses de governo e de investidores privados devem ser devidamente ajustados.

A Petrobras, por seu tamanho, características e inserção na economia, não pode ser apenas uma mola impulsionadora dos investimentos públicos, como quer Lula, nem tampouco somente uma vaca leiteira de dividendos para acionistas privados, como Temer e Bolsonaro planejaram e tentaram pôr em prática.

Desequilibrar os pratos dessa balança fragiliza a governança da empresa, dificultando sua gestão, com perdas de produtividade e retorno dos investimentos. Além disso, potencializa condições para que as ações da empresa sofram ataques especulativos.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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