Mariana Barbosa

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Reportagem

Codeshare de Azul e Gol leva à redução de 11% dos voos e abandono de rotas

A partir de junho, Azul e Gol vão reduzir em 11% os voos nas 40 rotas incluídas no acordo de codeshare selado por elas a partir de julho — ao mesmo tempo em que ampliarão a oferta total de voos em toda a malha em 5%. Esse rearranjo vem reduzindo a concorrência em diversas rotas, com uma empresa deixando a outra operar sozinha nas rotas do codeshare.

Os dados da malha foram capturados por meio da plataforma Diio/Cirium, que faz análise de dados de voos de companhias aéreas do mundo todo. Na comparação do terceiro trimestre do ano com o mesmo período do ano passado (quando o codeshare estava em vigor), as duas empresas reduziram a oferta de 14.564 voos para 12.986 (11%) nas 40 rotas.

A Azul saiu de rotas como Campina Grande-Salvador, além de Galeão para Guarulhos e Maceió, que são operadas pela Gol. Já a Gol reduziu sua operação em Confins (BH), deixando a Azul operando sozinha nas rotas do aeroporto mineiro para Recife, Maceió, João Pessoa, Natal e São Luís. A Gol também reduziu em 50% sua operação em Viracopos, principal hub da Azul. Em dezembro passado, a Gol operou só 50 dos 116 voos que haviam sido programados para a rota Viracopos-Brasília, por exemplo. A empresa também deixou a Azul sozinha em outras ligações como Salvador-Vitória da Conquista.

"Era evidente que as empresas estavam com a intenção de racionalizar rotas e deslocar aeronaves para outras ligações. Por isso sempre defendi que era preciso notificar previamente o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) sobre o codeshare. O resultado é uma redução da competição que se traduz em alta de preços", diz Cleveland Prates, ex-conselheiro do Cade.

A coordenação de malha também extrapola o escopo do codeshare, que é um acordo comercial pelo qual uma empresa vende assentos da outra, podendo incluir voos operados pelas duas empresas em um mesmo bilhete. A coordenação de malhas acontece em contratos de joint venture ou entre empresas do mesmo grupo.

Anunciada em maio do ano passado, a operação de codeshare não está sendo acompanhada de perto pelo Cade, pois as empresas entenderam que não era necessário fazer uma notificação prévia.

Ontem, 10 meses após o início efetivo do acordo, a superintendência-geral do Cade concluiu uma análise sobre a necessidade ou não de notificação prévia desse tipo de acordo com base na verificação se o acordo configura um "contrato associativo".

A conclusão foi de que a operação deve ser obrigatoriamente notificada por se tratar de um contrato associativo. No entanto, a autarquia disse que as empresas têm dois anos, contados a partir do início da operação, para fazerem a notificação. A superintendência disse ainda não ter identificado uma "consumação de ato de concentração econômica", prática conhecida como 'gun jumping' (queima de largada) antes do aval da operação.

A sobreposição de malhas das duas empresas é um dos principais indicadores que o Cade deverá analisar para avaliar o impacto de uma eventual fusão das duas empresas sobre a concorrência. As empresas assinaram em janeiro um memorando de entendimentos não vinculativo com a intenção de unir as operações. Até hoje, contudo, o órgão não foi notificado oficialmente.

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Ao reduzir a sobreposição (rotas onde as duas empresas concorrem) antes da apresentação do negócio para o Cade, as empresas melhoram a fotografia de quando for dada a largada da análise: quanto menos sobreposição, menor o impacto da fusão para a concorrência.

"Esse é um caso clássico que mereceria uma análise dos efeitos da concorrência potencial. Essa redução da sobreposição só reforça o argumento de que os incentivos à concorrência se reduzirão. Só de haver a possibilidade de uma empresa entrar na sua rota, você já se comporta como se estivesse num ambiente competitivo. E o inverso também é verdadeiro", diz Prates.

Procuradas, Gol e Azul não quiseram comentar.

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