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Bolsa ignora caos nos EUA e sobe; Trump é "pato manco", dizem analistas

06 jan. 2021 - Apoiadores do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, invadiram o Congresso - Win McNamee/Getty Images
06 jan. 2021 - Apoiadores do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, invadiram o Congresso Imagem: Win McNamee/Getty Images

João José Oliveira

Do UOL, em São Paulo

07/01/2021 14h48

Resumo da notícia

  • Bolsas sobem e dólar se valoriza mesmo após tentativa de apoiadores de Trump de barrar sucessão presidencial norte-americana
  • Para profissionais de mercado, foco de investidores segue nos rumos da economia, que não mudaram
  • Donald Trump de saída é como um "pato manco", dizem, que não pode mais andar nem voar

A invasão de apoiadores do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao Capitólio, sede do poder Legislativo do país, chegou a ser classificada por analistas e políticos como uma tentativa de golpe na maior democracia do mundo.

Mas para investidores que movimentam os mercados financeiros, o dia seguinte ao caos em Washington passa como se nada tivesse acontecido. A maioria das Bolsas sobe no mundo, inclusive aqui no Brasil, enquanto a moeda norte-americana se valoriza em relação a muitas moedas, incluindo o real.

Segundo profissionais de mercado, o comportamento dos ativos mostra que os investidores consideram Donald Trump um governante em fim de mandato e sem qualquer poder para influenciar os rumos da economia, ou seja, dos juros, das moedas, dos gastos do governo americano, de tratados comerciais ou de qualquer outro fator que influencie a vida financeira de empresas, trabalhadores e consumidores.

Trump é hoje, segundo o mercado, um "pato manco" ("lame duck", em inglês), expressão tradicional na política norte-americana para definir um governante que ainda está no cargo, mas sem chance de se reeleger ou sem poder. O presidente eleito Joe Biden assumirá a Presidência em 20 de janeiro.

A explicação vem do pragmatismo e da frieza do mercado financeiro, onde o gravíssimo problema nada fez na realidade para mudar as expectativas em torno das políticas econômicas no curto prazo.
Jason Vieira, economista-chefe da gestora de recursos Infinity Asset

Apesar dos distúrbios, a verdade é que Biden foi confirmado como novo presidente dos Estados Unidos, e isso elimina qualquer risco de contestação do resultado.
Thomás Gibertoni, analista da Portofino Family Office

Mercado já olha para a frente

Como Trump nada mais é agora que um "pato manco", para investidores, gestores de recursos e analistas não faz sentido ficar discutindo o que aconteceu no Capitólio ontem.

Mais prático e útil, para eles, é olhar para a frente e traçar o que será a economia mundial com os EUA governados pelo democrata Joe Biden.

E o que está no radar parece agradar quem gosta de investir em ações. Pelo menos por enquanto.

As Bolsas estão subindo pelas perspectivas de novos incentivos fiscais nos Estados Unidos. Com a onda azul trazida pela vitória dos Democratas na Câmara e no Senado, e mais a confusão provocada pelo Trump, aumentou agora a chance de ser aprovado um plano mais amplo de auxílio aos americanos. O primeiro plano aprovado era de US$ 900 bilhões, e agora ele pode ir a mais de US$ 1,2 trilhão.
Roberto Motta, chefe da mesa de derivativos da Genial Investimentos

Alguns analistas dizem que a maioria democrata também no Senado, além de na Câmara, poderia facilitar algumas medidas que o mercado considera negativas, como impostos corporativos mais pesados e medidas mais rígidas sobre algumas empresas, principalmente as de tecnologia, o que preocupa Wall Street.

Mas a margem estreita do controle no Senado pelos Democratas e o fato de que uma parcela relevante dos senadores democratas representa estados onde o eleitorado conservador tem maior peso devem dificultar a aprovação de medidas mais polêmicas.
Paula Zogbi, analista da Rico Investimentos

Bolsa brasileira aproveita onda azul

E dinheiro no bolso de norte-americanos significa mais capital circulando no mundo todo. "Nas duas primeiras sessões do ano, já entraram na Bolsa brasileira mais de R$ 2,5 bilhões, de estrangeiros", diz Motta, da Genial Investimentos. Segundo ele, o mundo quer commodities, um ativo que o Brasil tem de sobra.

Como o governo dos EUA vai gastar mais e haverá mais dinheiro circulando no mundo, investidores, em tese, ficam mais confortáveis para assumir mais riscos, aplicando em ativos de países emergentes, considerados menos seguros que o dólar. Isso deveria provocar uma queda do dólar.

De fato, analistas dizem que o movimento de alta do dólar no mundo todo hoje deve ser apenas pontual, e que a moeda deve cair nos próximos dias.

O dólar vinha de um movimento longo de queda, de forma que a alta de hoje deve ser encarada meramente como uma pequena correção a esse movimento mais amplo.
Daniel Herrera, analista da Toro Investimentos

No caso do Brasil, a situação é diferente, dizem profissionais de mercado, por que há outro ingrediente que favorece a alta do dólar. O real está se desvalorizando também pelas fragilidades nacionais, como a situação fiscal e as incertezas em torno do plano de vacinação.

O dólar não vem dando trégua aqui contra o real muito por causa da nossa questão fiscal, que coloca em risco o crescimento do país. Isso já pode ser observado com o desempenho de alguns setores mais próximo à economia, como varejo, construção, que estão com desempenho pior que o do setor de commodities, por exemplo.
Rafael Ribeiro, analista da Clear Corretora