Ações do Magalu caíram por causa da visão política de Luiza Trajano?
Em meio à queda de cerca de 75% no valor das ações do Magazine Luiza neste ano, vários comentários em redes sociais tentaram ligar o desempenho ruim a campanhas afirmativas que a empresa realiza, como o programa de trainees só para negros. Com o mote "quem lacra não lucra", esses perfis atribuem a queda das ações a essas iniciativas.
O próprio presidente Jair Bolsonaro (PL) chegou a citar em discurso que uma "empresária socialista" havia perdido "R$ 30 bilhões agora, quando anunciou amor pelo nove dedos", referindo-se a Luiza Helena Trajano, acionista do Magalu e que, de acordo com o presidente, poderia apoiar o candidato Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Veja a seguir o que dizem os especialistas.
Outros fatores da economia são a causa
Para especialistas do mercado financeiro ouvidos pelo UOL, contudo, a desvalorização das ações do Magazine Luiza não está ligada a nenhuma ação afirmativa. De acordo com eles, a queda está ligada a fatores macroeconômicos, como o aumento dos juros e o desaquecimento do consumo, além do aumento da competição no setor do varejo no Brasil.
Segundo Virginia Prestes, estrategista de renda variável da The Hill Capital e professora de finanças da Faap, os agentes do mercado financeiro não compram ou vendem uma ação de qualquer empresa baseados apenas em possíveis preferências ideológicas da companhia.
"O mercado de capitais não tem uma questão político-ideológica. As ações de uma determinada empresa não vão cair ou subir por causa dessas questões. O que o mercado observa são fatores financeiros", disse Prestes.
"Obviamente, se você tiver um governo que seja mais pró-mercado, reduzindo a taxa de juros, fomentando setores, é bom para as empresas. Mas, no caso do Magazine Luiza, não foi isso que fez a empresa cair. Foi uma mudança do cenário."
Alta dos juros e menor consumo
Segundo os especialistas, o setor de varejo depende muito do crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) para aumentar as vendas. Dessa forma, com a redução da expectativa de crescimento do PIB brasileiro para este ano e o próximo, as varejistas listadas na Bolsa passaram a sofrer com o corte das expectativas.
Além disso, a inflação na casa dos 10% no acumulado deste ano fez com que o Banco Central (BC) aumentasse a taxa básica de juros (Selic), que passou de 2% ao ano para os atuais 9,25%. Com os juros mais altos, qualquer produto financiado fica mais caro, reduzindo as vendas no comércio.
"O motivo da queda é muito mais por causa do cenário macroeconômico, que tem tido uma deterioração muito acelerada. O mercado espera que esse movimento continue. Se compararmos com 2020, quando tínhamos uma taxa básica de juros de 2% ao ano, agora temos juros elevados e inflação também em alta. Assim vemos uma perda do poder de compra do consumidor", afirmou Rodrigo Crespi, analista da Guide Investimentos.
Esse fenômeno, portanto, afeta todo o setor, não apenas o Magazine Luiza. Não à toa, as ações de Via (-70%) e Lojas Americanas (-77%) também acumulam queda no ano.
Mais competição e menos compras
Outros fatores apontados para a queda das ações são as mudanças na forma de consumo e, também, o aumento da concorrência no setor aqui no país.
Para Rodrigo Glatt, sócio da gestora GTI, o relaxamento das medidas para conter o avanço do coronavírus (covid-19) no Brasil também trouxe uma mudança nos itens comprados.
Além disso, como itens de maior valor, como geladeira e televisão, não são comprados todo ano, 2020 já antecipou a tendência de consumo de 2021.
"As preferências no comércio mudaram um pouco. As pessoas compravam vários eletroeletrônicos porque ficaram em casa no auge do covid-19, e hoje estão preferindo comprar vestuário ou outros itens do varejo que não esses. Tivemos as empresas com bastante estoque desses produtos, fazendo algum tipo de liquidação e cortando os preços, reduzindo as margens nos próximos trimestres", disse.
Segundo Crespi, da Guide Investimentos, a presença cada vez maior de empresas estrangeiras, como Amazon, Mercado Livre e Shopee, também assusta os agentes do mercado.
"Há uma competição mais intensa e agressiva com players importantes do exterior, o que deve pressionar as margens das lojas brasileiras e, não à toa, vimos uma queima de caixa elevada de Magalu com promoções para tentar se livrar do estoque, que está elevado. O giro do estoque, que era por volta de 70 dias, subiu para mais de cem dias. Então, houve um descasamento entre as vendas", afirmou.
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