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PIB cresce menos que no primeiro trimestre, mas traz sinais melhores

Camilla Veras Mota

Da BBC Brasil em São Paulo

01/09/2017 09h39Atualizada em 01/09/2017 10h58

A boa notícia é que "estamos saindo do fundo do poço". A má: a recuperação vai ser lenta, com risco de retrocesso caso a crise política e a situação das contas públicas se agrave.

Esse é o retrato que o Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre, divulgado nesta sexta-feira (1º), traz da economia brasileira.

Apesar de tímido, o crescimento registrado entre abril e junho, de 0,2% em relação ao primeiro trimestre, quando o PIB avançou, por sua vez, 1% sobre o fim de 2016, tem um perfil mais benigno do que o observado de janeiro a março, dizem economistas.

Isso porque o desempenho no início do ano deveu-se em grande parte ao impacto positivo da supersafra no setor agropecuário.

Desta vez, o crescimento é mais disseminado.

O consumo das famílias, por exemplo, aumentou pela primeira vez depois de nove trimestres consecutivos de queda (1,4%).

Também há mais de dois anos sem crescimento, o setor de serviços - que responde por mais de 60% do PIB, pelo lado da oferta - avançou 0,6% sobre o primeiro trimestre, na série que já exclui a sazonalidade do período.

Parte da retomada desse último setor ainda é reflexo do boom agro, resultado do escoamento da safra, observa a economista-chefe da Rosenberg Associados, Thais Marzola Zara.

Não por acaso, o segmento de "transporte, armazenagem e correio", uma das sete subdivisões desse componente do PIB, teve bom desempenho - alta de 0,6%.

O melhor resultado, entretanto, veio do comércio, que também é contabilizado dentro de serviços no PIB e avançou 1,9% depois de nove trimestres negativos. A reação se deve a vários fatores, diz Zara. A liberação para saque das contas inativas do FGTS no primeiro semestre deu um impulso importante, mas a melhora na trajetória do emprego, a desaceleração da inflação, a redução no nível de endividamento das famílias e a retomada das concessões de crédito contribuíram.

"A sazonalidade do segundo semestre é ainda mais favorável para o emprego", destaca a economista, que espera desempenho melhor da economia até o fim do ano e estima crescimento de 0,7% para o PIB em 2017.

Também no cenário da economista-chefe da ARX Investimentos, Solange Srour, o consumo das famílias segue se recuperando na segunda metade do ano, graças à inflação comportada, ao aumento do poder de compra dos salários e ao crédito.

A avaliação é reiterada pelas surpresas positivas trazidas pelas pesquisas mensais de comércio e serviços de junho e pelos dados preliminares de atividade de julho e agosto. "Eles reforçam a expectativa de que a economia esteja melhorando, de que estamos saindo do fundo do poço", ela ressalta.

Investimentos

A perspectiva para os investimentos é mais turva. Mesmo com a queda significativa da taxa básica de juros desde o início do ano - de janeiro a julho, o Comitê de Política Monetária (Copom) diminuiu a Selic de 13% para 9,25% -, eles não reagem.

Contabilizados no PIB pela Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF), os investimentos recuaram 0,7% de abril a junho, em relação ao intervalo imediatamente anterior, a quarta retração consecutiva.

De um lado, pondera Srour, o custo de capital para as empresas não tem cedido na mesma velocidade dos juros. O acesso a crédito ainda é relativamente restrito e as taxas de captação, mais altas para as companhias que têm um histórico recente de inadimplência, ela exemplifica.

A incerteza política, por outro lado, é um incentivo para que os projetos continuem na gaveta. O cenário de instabilidade reduz a previsibilidade dos investimentos, que em geral têm maturidade no médio e longo prazos.

"Mesmo se houvesse uma oferta maior de crédito, o risco político inibe os investimentos".

Sem esse componente, que costuma ter efeito positivo sobre a produtividade e sobre o crescimento, a recuperação tende a ser mais lenta, afirma Paulo Picchetti, pesquisador da Fundação Getulio Vargas (FGV). "Não é uma saída de recessão robusta como a gente viu em outros anos", diz.

Saímos da recessão?

Embora se considere que, de forma geral, dois trimestres consecutivos de aumento do PIB sinalizam o fim das recessões, o crescimento verificado entre abril e junho não necessariamente marca a saída definitiva do Brasil da crise, pondera Picchetti, que também é membro do Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace) da FGV, que estuda o início e o fim das recessões no Brasil.

Enquanto a alta forte do primeiro trimestre foi bastante concentrada na agropecuária, o crescimento do segundo foi muito próximo de zero - tanto que as estimativas de consultorias e instituições financeiras estavam relativamente dispersas, ressalta o economista, com projeções positivas e negativas.

A identificação do início da crise também não seguiu a regra geral de dois trimestres consecutivos de queda do produto. Segundo o Codace, a recessão começou no segundo trimestre de 2014, intervalo localizado entre dois períodos de crescimento do PIB - de 0,5% nos primeiros três meses do ano e de 0,3% no terceiro trimestre.

Picchetti pondera, entretanto, que os sinais dados por diferentes setores são cada vez melhores e que, além dos serviços, a indústria também dá sinais de reação, com a ajuda do setor externo, apesar dos resultados ainda bastante voláteis. Depois de crescer 0,9% no primeiro trimestre, o PIB do setor recuou 0,5% de abril a junho.

"A mensagem (que os dados de atividade têm passado) é que em algum momento do terceiro trimestre teremos a confirmação de que saímos da recessão", ele afirma.

O risco é o recrudescimento da crise política e uma deterioração ainda maior das contas públicas. Caso a reforma da Previdência não passe de fato no Congresso, ele ilustra, ou que seja aprovada uma versão muito desidratada da proposta inicial, a situação fiscal do governo se complica.

Para conseguir pagar as aposentadorias e pensões, a solução seria intensificar o remédio amargo que vem sendo usado, de corte nas despesas discricionárias (aquelas em que o governo pode mexer) e aumento de impostos, uma combinação que não favorece o crescimento econômico. 

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