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Colômbia vive forte onda de pressão social contra reforma tributária

1.mai.2021 - Em Bogotá, na Colômbia, manifestantes fazem protesto contra a reforma tributária e contra o governo do presidente Ivan Duque - REUTERS/Luisa Gonzalez
1.mai.2021 - Em Bogotá, na Colômbia, manifestantes fazem protesto contra a reforma tributária e contra o governo do presidente Ivan Duque Imagem: REUTERS/Luisa Gonzalez

04/05/2021 02h44Atualizada em 04/05/2021 06h50

Bogotá, 3 mai (EFE).- Os protestos populares contra a agora derrotada reforma tributária do governo da Colômbia resultaram na pior crise política e social enfrentada pelo presidente Iván Duque e deixaram pelo menos 19 mortos e mais de 700 feridos.

As mobilizações sociais que começaram em novembro de 2019 em protesto contra as políticas econômicas da Duque ressurgiram com força na semana passada, após um hiato de mais de um ano devido à pandemia de covid-19 que empobreceu milhares de famílias colombianas, e o gatilho foi o controverso projeto de reforma tributária.

Na esteira da pandemia, a pobreza monetária na Colômbia subiu 6,8 pontos no ano passado, para 42,5%, o que significa que o número de pessoas pobres no país aumentou em 3,6 milhões de pessoas - de 17,4 milhões para 21 milhões, de acordo com o Dane (Departamento Administrativo Nacional de Estatística).

Neste contexto, um aumento draconiano dos impostos, que afeta principalmente a classe média e aqueles que menos ganham, acendeu a pólvora da indignação popular, e as manifestações convocadas por sindicatos ganharam adesão de pessoas de todos os estratos sociais, em um movimento que após seis dias de mobilizações nas ruas parece imparável.

Demandas dos movimentos sociais

"O governo nacional teve a possibilidade de abordar e resolver as reivindicações das grandes mobilizações realizadas desde 21 de novembro de 2019 e os acordos não cumpridos com o povo e suas organizações, mas nunca esteve disposto a instalar uma mesa de negociação", denunciou nesta segunda-feira (3) o Comitê Nacional de Greve, entidade que convocou as manifestações.

Com a reforma tributária, o governo pretendia arrecadar 23,4 trilhões de pesos (cerca de US$ 6,3 bilhões) para melhorar o estado das finanças públicas e dar continuidade aos programas sociais para os mais pobres.

Mas, diante da rejeição popular generalizada, Duque não teve outra escolha senão ordenar sua retirada do Congresso ontem, duas semanas depois de tê-la apresentado.

"As manifestações não são gerenciadas por ninguém, é o povo cansado de anos de miséria", escreveu hoje no Twitter César Pachón, um experiente líder camponês que em 2013 liderou os protestos de trabalhadores rurais contra o governo anterior e hoje ocupa uma cadeira na Câmara dos Deputados pelo Movimento Alternativo Indígena e Social (MAIS).

A reforma tributária, embora necessária, segundo especialistas econômicos, é inconveniente em tempos de crise como o atual, algo que o próprio presidente reconheceu há menos de um ano, apesar de ter defendido com unhas e dentes o projeto atual e controverso.

"Fazer uma reforma fiscal neste momento em que temos a pandemia, que está atingindo as micro, pequenas, médias e grandes empresas, a classe média, a classe alta, as classes mais vulneráveis, é suicida", disse Duque em 4 de agosto, durante um fórum da Rede Ibero-Americana de Imprensa Econômica.

'Consensos' excludentes

O Comitê Nacional de Greve também lembrou hoje que, embora Duque tenha falado ontem sobre "consensos" para apresentar outro projeto de reforma ao Congresso, mais uma vez ele não os levou em conta.

"Isso mostra o caráter antidemocrático deste governo do presidente Duque, que não gosta do diálogo com aqueles que pensam de maneira diferente. Ele gosta do diálogo com aqueles que se aproximam de sua política", disse o presidente da CUT (Central Unitária dos Trabalhadores), Francisco Maltés, em entrevista coletiva.

Embora o movimento sindical não tenha convocado protestos para esta segunda-feira, mas para a próxima quarta, a tensão continua nas ruas de todo o país, com protestos de taxistas e caminhoneiros, assim como de jovens contra a violência policial, à qual atribuem a morte de dezenas de manifestantes nos últimos dias.

Segundo a Defensoria do Povo, a violência associada aos protestos deixou pelo menos 19 mortos, assim como 254 civis e 457 policiais feridos.

"No momento temos 1.089 casos de violência policial, dentro dos quais conseguimos identificar pelo menos 124 feridos, 726 detenções arbitrárias, seis atos de violência sexual, 27 homicídios, 12 jovens perderam a visão e mais de 45 defensores dos direitos humanos tiveram sua capacidade de exercer esse trabalho limitada", denunciou Martha Alfonso, vice-presidente do Fecode, o sindicato dos professores.

Segundo Maltés, o governo "sempre estigmatizou e agiu violentamente contra os manifestantes", e embora "estivesse em suas mãos impedir esta tragédia, sua arrogância, surdez e empatia terrível para resolver as necessidades e urgências da população colombiana pesavam mais".

As manifestações espontâneas de segunda-feira foram em geral pacíficas —os poucos distúrbios ocorreram em Barranquilla, capital do departamento de Atlántico, onde houve saques de supermercados e confrontos com as forças de segurança.