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'Percepção de risco de solvência do governo piorou', diz ex-presidente do BC

Adriana Fernandes

Brasília

16/10/2020 12h00

Ex-presidente do Banco Central, o economista Affonso Celso Pastore avalia que a forte concentração de vencimentos de títulos do Tesouro Nacional no início de 2021 é um problema "seriíssimo" de administração da dívida pública.

Ao Estadão, Pastore diz que o presidente Jair Bolsonaro, senadores e deputados têm feito "ouvidos moucos" aos riscos fiscais para a economia.

O que está acontecendo no mercado de dívida?

A percepção de risco de solvência do governo piorou enormemente. No ano passado, a dívida bruta fechou em 78% do PIB. Ela vai fechar esse ano perto de 100%. O déficit primário vai ser 15% do PIB e o governo vai colocar uns 15% a mais de dívida. E o Tesouro tem de rolar toda a dívida que está vencendo. Como o risco de solvência aumentou, o mercado demanda um prêmio muito alto para comprar os papéis. Quanto mais longo, mais alto o risco. Para não aumentar mais o custo e piorar a dinâmica da dívida, o Tesouro está optando por trocar por títulos com vencimentos mais curtos, reduzindo ainda mais o prazo médio de vencimentos.

Mas o mercado está demandando cada vez mais prêmios?

O mercado está demandando prêmios porque o risco de insolvência do governo cresceu. Se ele tivesse colocando títulos com prazos longos, estaria subindo o custo médio da dívida. A opção que fez foi de encurtar o prazo médio da dívida. O prazo médio já vinha encurtando desde que o País perdeu o grau de investimento. Nós já tivemos épocas que a dívida era rolada no overnight (aplicações financeiras de curtíssimo prazo). Lá nas calendas gregas, há muitos anos. Só que aquela dívida era de 30%, 40%. Não de 100%.

Por que integrantes do governo e do Congresso não acreditam no que está acontecendo?

Nós tentamos explicar, eu tento, todo mundo tenta. Mas eles teimam em não entender. Fazem ouvidos moucos. Não estou falando do Tesouro, do BC. Esses sabem. Estou falando dos senadores, dos deputados e do presidente da República, que absolutamente não entendem o problema.

Falta uma estratégia de comunicação de saída dessa crise?

Além da estratégia de comunicação, falta uma estratégia econômica que até hoje o ministro Paulo Guedes não explicitou qual é.

As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.