'Chego ao fim de 2015 preocupado com a situação do país', diz Levy, em nota
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, divulgou um comunicado na tarde desta sexta-feira (18) em tom de despedida, mas sem afirmar se deixa o cargo, em meio a rumores crescentes sobre sua saída. Pouco depois, foram divulgadas notícias de que o atual ministro do Planejamento, Nelson Barbosa, deve substituí-lo, e que o anúncio oficial deve ser feito ainda nesta sexta-feira (18).
“Chego ao fim de 2015 preocupado com a situação do país, particularmente com a da economia”, disse Levy no texto. “Mas mantenho grande confiança na capacidade de recuperação da nossa economia e do potencial de seu crescimento.”
Levy disse que “seria uma injustiça” com ele, com sua equipe e com Dilma “achar que o país enfrenta uma recessão pelo fato de termos proposto e implementado um ajuste fiscal”.
“É difícil gerar crescimento ou investimento gastando mais, quando ainda há tanto a ser pago do passado”, afirmou, referindo-se ao desequilíbrio das contas públicas, e complementou dizendo que “o Ministério continua crendo que o caminho do crescimento é avançar nas reformas”.
O comunicado trouxe críticas ao governo, dizendo que “a falta de maior sinalização de disposição mais imediata de esforço fiscal por parte do Estado brasileiro também piorou as expectativas dos agentes econômicos" e que “como alertou recentemente o Bacen (Banco Central), o custo de opções equivocadas pode ser alto”.
Levy teve diversos atritos com a presidente Dilma Rousseff e com líderes do PT, incluindo o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O principal ponto de discordância foi a intensidade do ajuste das contas públicas.
Clima azedou
Já há algum tempo o governo fala que é preciso parar de falar em ajuste e começar a valorizar o retorno ao crescimento, alternativas para retomada da geração do emprego e renda. Nesta manhã, o ministro-chefe da Casa Civil, Jaques Wagner, disse que um ministro da Fazenda precisa ser "jeitoso", além de técnico e político".
Levy também foi alvo de críticas por parte do ex-presidente Lula e de lideranças do PT, segundo quem sua política econômica é muito ortodoxa e focada na questão fiscal, sem um discurso mais positivo.
A relação entre Dilma e Levy teria piorado nesta semana, segundo a "Folha", depois de ele afirmar que o governo não podia usar o Bolsa Família para evitar cortes de gastos. "Acho ela (a redução da meta) um inconveniente e um equívoco essa mistura da meta por causa do Bolsa Família. A meta é a meta, Bolsa Família é Bolsa Família", disse.
A declaração teria irritado a presidente, assim como a insistência de Levy em lutar contra a redução da meta fiscal do governo. O ministro defendia uma meta de 0,7% do PIB (Produto Interno Bruto) em 2016 para a economia destinada a pagar juros da dívida pública.
O governo conseguiu baixar a meta para 0,5%, mas saiu derrotado na proposta de criar abatimentos de até R$ 30 bilhões no Orçamento de 2016, o que, na prática, poderia zerar a meta fiscal.
Crise econômica e política
O país passa por grave recessão econômica, com inflação elevada, além de intensa crise política, que culminou com abertura de um processo de impeachment contra a presidente.
A crise política também tem dificultado a aprovação no Congresso de medidas para tentar ajustar as contas públicas, com a redução de gastos e o aumento de impostos.
Em uma vitória para o governo, o Congresso aprovou o Orçamento de 2016 que inclui recursos a serem recebidos pelo governo graças à volta da CPMF, conhecida como "imposto do cheque".
Em meio a esse cenário conturbado, o Brasil perdeu o selo de bom pagador por duas importantes agências de classificação de risco: Standard & Poor's, em setembro, e Fitch, nesta semana. Isso significa que o país deixou de ser considerado um lugar recomendável para os investidores aplicarem seu dinheiro, e tornou-se maior o risco de um calote.
Isso deve elevar os custos de financiamento para o governo e para as empresas locais, além de reduzir o fluxo de entrada de dólares no país, deixando a moeda ainda mais cara.
Saída era esperada
Rumores sobre a saída iminente de Levy já circulavam na imprensa desde quarta-feira, quando o jornal "Valor Econômico" publicou que o ministro já teria acertado sua saída há alguns dias com Dilma. Segundo o jornal, ele permaneceria no cargo por mais um breve período até que a presidente definisse um substituto e na expectativa de que o cenário político ficasse mais definido.
Segundo a "Folha", Levy teria dito aos integrantes do Conselho Monetário Nacional (CMN), na quinta-feira (17), que não estaria na próxima reunião, dando a entender que está deixando o governo.
Questionado sobre uma possível saída do governo em diferentes situações, ele manteve-se em silêncio ou deu respostas evasivas. "Espero continuar confortável em tudo que faço", disse a jornalistas em café da manhã. "Meu objetivo não é criar constrangimento ao governo... É importante ter clareza quais são as prioridades, qualquer caminho vai ser muito em função disso."
Do mercado financeiro ao setor público
Joaquim Levy tem experiência tanto no mercado financeiro quanto no setor público. Formado em Engenharia Naval, começou a carreira como economista em 1987, quando concluiu o mestrado em Economia pela Fundação Getulio Vargas. Dois anos mais tarde, obteve o doutorado em Economia pela Universidade de Chicago.
De 1992 a 1999, trabalhou no Fundo Monetário Internacional (FMI). Em 1999 e 2000, foi economista visitante no Banco Central Europeu.
No governo de FHC, foi secretário adjunto da Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda, no ano 2000. Em 2001, foi nomeado economista-chefe do Ministério do Planejamento, sendo mantido na equipe econômica na transição para o governo Lula. Foi secretário do Tesouro Nacional entre 2003 e 2006. Em 2007, foi secretário de Fazenda do Rio de Janeiro. De 2010 até 2014, foi diretor superintendente do Bradesco Asset Management, braço de fundos de investimentos da instituição.
(Com Reuters)
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