Petrobras tem o menor nível de investimentos em uma década
Em uma mistura de falta de recursos com opção por uma versão mais enxuta de empresa, a Petrobras chegou neste ano ao seu menor nível de investimentos em pelo menos uma década.
No primeiro semestre de 2018, os investimentos totais da petroleira somaram R$ 21,3 bilhões, no quinto ano de redução seguido. É 7,5% menos que no primeiro semestre do ano passado e o menor valor para o período desde 2008, quando os investimentos na primeira metade do ano somaram R$ 20,9 bilhões.
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Endividamento recorde, anos seguidos de petróleo barato e até a Operação Lava Jato, que atingiu a gestão da companhia em cheio, são alguns fatores enumerados por analistas e especialistas para explicar os investimentos minguantes.
Há ainda um plano objetivo da empresa, em curso desde 2015, de reduzir o seu tamanho. O chamado plano de parcerias e desinvestimentos prevê a venda de diversos negócios e a saída de áreas mais afastadas de sua vocação central, que é de exploradora de petróleo, e isso também puxa os investimentos para baixo.
Atividades como biocombustíveis, GLP (gás liquefeito de petróleo), fertilizantes e petroquímica são algumas das que estão na lista de cortes.
Estatal representa 10% dos investimentos do país
Por outro lado, quando uma empresa do tamanho da Petrobras investe menos, a economia inteira do país sofre, já que se trata de uma indutora sem comparação de investimentos e crescimento.
Uma conta feita pelo economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, estima que os investimentos da Petrobras, sozinha, já chegaram a representar cerca de 10% de tudo o que é investido por empresas e governos no país.
“A Petrobras tem um papel importante no desempenho do PIB, e uma parte da dificuldade de retomada da economia é reflexo de ela estar investindo menos”, afirmou.
Além disso, investimentos muito racionados, a depender de como são distribuídos, podem implicar em problemas mais à frente, como falhas de manutenção e acidentes.
Muitas análises, por exemplo, ligam o foco excessivo nos lucros pós-privatização da britânica BP, na década de 1980, à sucessão de desastres que a petroleira teve nos anos 2000: uma refinaria explodiu no Texas em 2005, um duto se rompeu no Alasca em 2006 e uma plataforma explodiu no Golfo do México em 2010. Este episódio foi retratado no filme “Horizonte Profundo”, de 2016.
Dívida alta encareceu financiamentos
O alto nível de endividamento a que a Petrobras chegou nos últimos anos e também uma sucessão de prejuízos estão no topo da lista de razões práticas para investimentos menores, já que ela acabou sem muitas fontes de recursos.
A empresa teve quatro anos seguidos de prejuízo, entre 2014 e 2017, e sua dívida chegou a passar dos US$ 100 bilhões em 2015.
Os dois fatores colaboraram para secar o caixa e também para a perda do grau de investimento da companhia pelas agências de avaliação de risco, o que aconteceu em 2015 e não foi revertido até agora.
“Os principais fundos do mundo só investem em empresas que têm grau de investimento, e, quando é rebaixada, a empresa acaba obrigada a pagar juros maiores para conseguir financiamento”, disse o economista Edmar de Almeida, pesquisador do Grupo de Economia e Energia do Instituto de Economia da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
“Os títulos de uma companhia com grau de investimento pagam 2% de juros ao ano nos Estados Unidos, enquanto os da Petrobras estão pagando algo em torno de 5% a 6%”, afirmou o pesquisador.
“Redução será compensada”
Procurada, a Petrobras informou, por meio de nota, que "a decisão do volume a ser investido tem relação com diversos fatores, internos e externos, como, por exemplo, o grau de alavancagem [medida financeira para o endividamento], a disponibilidade de caixa e o preço internacional do petróleo".
O preço do barril do petróleo, que operava acima dos US$ 100 até 2014, entrou em uma espiral de queda nos anos seguintes que o derrubou abaixo dos US$ 30 em 2016 e congelou investimentos de petroleiras no mundo todo. A tendência só se reverteu no início deste ano, quando o barril voltou para a casa dos US$ 70 aos US$ 80 pela primeira vez em quatro anos.
Todos esses fatores, afirmou a Petrobras, são acompanhados constantemente e balizam as revisões anuais dos planos de investimentos da companhia.
"A redução dos investimentos no primeiro semestre de 2018 foi ocasionada pelas características dos projetos em andamento e deverá ser compensada nos próximos semestres, de forma a estarmos aderentes ao Plano de Negócios e Gestão 2018-2022", declarou a empresa.
Pelo plano de negócios atual, os investimentos, orçados em dólares, devem ficar na faixa de US$ 10 bilhões a US$ 17 bilhões ao ano até 2022.
Enxugamento não é única solução
Tanto o endividamento quanto o prejuízo da Petrobras já estão melhores agora, e o dinheiro em caixa voltou a crescer --graças, em parte, "à menor realização dos investimentos no período", segundo o último balanço da companhia.
No primeiro e no segundo trimestre deste ano, a petroleira voltou a registrar lucros, e a dívida já caiu do pico dos US$ 100 bilhões para a casa dos US$ 70 bilhões.
A opção pelo caminho da redução de investimentos e negócios, porém, não é consenso do setor. "É uma visão ortodoxa de como uma empresa convencional deve agir, mas não é a única visão possível", disse o engenheiro Ildo Sauer, vice-diretor do Instituto de Energia e Ambiente da USP (Universidade de São Paulo) e diretor de Gás e Energia da Petrobras de 2003 a 2007, durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Ele menciona a China e seu atual apetite por investimentos como uma fonte alternativa de parcerias e de capital para novos projetos que poderia ser mais explorada.
Também alerta para o risco de se desfazer de negócios em um momento em que a companhia está em baixa, o que leva a preços de venda mais baratos do que o real potencial.
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