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Reforma: O que se sabe até agora sobre aposentadoria por capitalização

Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Ricardo Marchesan

Do UOL, em São Paulo

11/06/2019 04h00

Um dos pontos mais incertos da proposta de reforma da Previdência, enviada pelo governo ao Congresso, é o da criação do sistema de capitalização, em que o trabalhador poupa para a própria aposentadoria. A mudança é defendida pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, como solução para o problema do rombo da Previdência.

O texto cria a possibilidade da capitalização, mas dá poucos detalhes de como ela deve funcionar. Isso seria definido por uma lei complementar, criada depois de aprovada a reforma.

A ideia, porém, enfrenta resistência, e pode ser retirada da atual proposta de mudanças na aposentadoria, para ser analisada no futuro, separadamente, de maneira a facilitar a aprovação da reforma da Previdência no Congresso.

Além disso, a medida pode vir a ser questionada na Justiça. Em parecer enviado ao Congresso, o MPF (Ministério Público Federal) afirmou que a capitalização é inconstitucional. Estudo publicado pela OIT afirma, ainda, que o sistema falhou em países que tentaram a mudança para o sistema nas últimas décadas.

Veja o que se sabe até agora sobre a proposta do sistema de capitalização sugerida pelo governo.

O que é capitalização?

Na capitalização, o trabalhador poupa para sua própria aposentadoria. Ele tem uma conta individual em seu nome e uma fatia do salário é descontada e depositada nela. Esse dinheiro é administrado pelos gestores do fundo e rende, da mesma forma que aplicações financeiras. Assim, quando se aposentar, o trabalhador terá uma renda mensal conforme o valor que poupou.

Atualmente, o modelo da Previdência do Brasil é diferente, de repartição, em que todos os trabalhadores financiam as aposentadorias de quem já parou, por isso também é chamado de solidário. Ou seja, o dinheiro do INSS descontado do salário vai para um fundo coletivo, usado para pagar os aposentados.

A aposentadoria atual deixa de existir?

Segundo o projeto do governo, não. Apesar de algumas mudanças nas regras para conseguir se aposentar, como a criação de uma idade mínima para todos se aposentarem, a reforma da Previdência não acaba com o sistema de repartição.

Se for implantado, o sistema de capitalização, segundo o ministro da Economia, Paulo Guedes, será uma opção para os mais jovens que não queiram seguir na repartição.

Nós vamos seguir a nossa viagem, sem deixar o nosso sistema quebrar. Vamos botar mais impostos se for preciso, vamos rediscutir isso no futuro. Nós seguimos. Não existe a menor possibilidade de desativarmos a Previdência que existe

Paulo Guedes, ministro da Economia

A capitalização será obrigatória?

Não, de acordo com Guedes.

"Nós estamos criando uma alternativa para as futuras gerações. Elas podem ficar no antigo ou irem para a nova. É isso que está sendo submetido aos senhores [deputados]", afirmou Guedes em audiência na Câmara em maio, para discutir o projeto.

Todos terão direito à capitalização?

Guedes defende que apenas os mais jovens tenham acesso à capitalização.

"O sistema de capitalização não está aberto para todos. Esta geração não merece ter acesso ao sistema novo, porque não tem juízo, deixou a Previdência quebrar", afirma.

Nós temos que carregar esta cruz. Nós criamos isso e vamos seguir com isso. O que nós estamos propondo é justamente libertar os jovens, deixá-los num sistema alternativo em que se tenha total controle

Paulo Guedes

Quanto o aposentado ganha na capitalização?

Isso depende de quanto ele conseguiu poupar e da rentabilidade de sua conta, que vem da aplicação dos recursos no mercado financeiro, feito por operadores que vão gerir os fundos.

O valor da aposentadoria pode ficar abaixo do mínimo?

O projeto da reforma diz que os aposentados receberão, ao menos, um salário mínimo. Assim, mesmo que o dinheiro na conta do trabalhador não renda o esperado, um fundo garantiria o pagamento da diferença.

"No futuro, pode perfeitamente haver a garantia de salário mínimo, independente da acumulação. Ninguém deve recear, nós somos uma nação fraterna", afirma Guedes. "Se a acumulação no regime de capitalização, no regime de poupança garantida, lá na frente --que deve dar muito mais que um salário mínimo-, se der menos, haverá a camada adicional de fraternidade para garantir o salário mínimo."

Quem vai administrar as contas?

O projeto diz que os fundos nas contas dos trabalhadores serão geridos por entidades públicas e privadas. O governo afirma que os bancos não farão essa gestão.

"A gestão das reservas é feita por entidades de previdência públicas e privadas habilitadas por órgão regulador, ou seja, não são os bancos que vão comandar, são entidades que vão ser criadas para esse fim", afirmou Rogério Marinho, secretário especial de Previdência e Trabalho.

Nós não vamos entregar para banqueiros, não. Nós vamos entregar para instituições especializadas nisso, puramente de seguridade

Paulo Guedes

O trabalhador poderá escolher qual entidade vai gerir sua conta, podendo mudar ao longo do tempo, se assim quiser.

As empresas vão contribuir?

No sistema de capitalização, além do depósito de parte do salário, é possível que a empresa também deposite um valor igual na conta do trabalhador, como acontece em planos de previdência privada.

A proposta do governo é que essa contribuição do empregador seja opcional, não obrigatória.

Para o ministro da Economia, isso estimularia a geração de empregos aos mais jovens. Como, na ideia de Guedes, apenas os jovens teriam acesso à capitalização pura (com contribuição apenas do trabalhador), seria mais barato para as empresas contratarem profissionais com menos idade.

"É como gerar 1, 2, 3 milhões de empregos, em dois anos, para os jovens, porque eles estão chegando ao mercado de trabalho, eles não têm experiência, mas eles custam a metade do que custariam", afirmou. "Sem experiência e com o dobro do custo do salário -eles chegam pedindo R$ 1.000, mas, na verdade, custam R$ 2.000 para a empresa, e eles não têm experiência nenhuma. Então, eles vão ficar desempregados."

O relator da reforma da Previdência, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), porém, já afirmou anteriormente que o sistema de capitalização com a contribuição apenas do empregador "não para em pé".

Quanto vai custar mudar o sistema?

Uma das preocupações de economistas é que a mudança do sistema atual para o de capitalização seria muito cara para o governo, fazendo com que o objetivo da reforma, de economizar recursos, se perdesse.

Isso porque, como os trabalhadores (ou parte deles) deixariam de contribuir com as aposentadorias de quem já parou e passariam a juntar dinheiro em uma conta própria, o governo teria que pagar sozinho os aposentados.

O governo estima que o custo seria de R$ 115 bilhões em dez anos, e R$ 985 bilhões, em 20 anos.

Por isso, segundo Guedes, as mudanças nas regras de aposentadoria precisam gerar uma economia de ao menos R$ 1 trilhão nos próximos dez anos, como projeta o governo.

"Hoje, há um buraco de R$ 100 bilhões [na Previdência]. Com R$ 1 trilhão em dez anos, zera-se esse déficit. São R$ 100 bilhões por ano. Então, se estiver zerado, há um espaço para analisar o regime de capitalização", afirma.

Entenda a proposta de reforma da Previdência em 10 pontos

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