Imposto sobre ricos existe há 31 anos, mas nunca valeu; reforma muda algo?
Resumo da notícia
- Imposto sobre grandes fortunas está na Constituição desde 1988, mas nunca foi regulamentado
- Tema ficou de fora das propostas iniciais de reforma tributária
- Oposição propõe cobrar 0,5% do que passar de R$ 15 milhões
- Especialistas afirmam que imposto levaria ricos a tirar dinheiro do país
- Economista do Ipea discorda e defende que o imposto pode equilibrar contas
- Nos EUA, candidata democrata propõe cobrar dois centavos para cada dólar acima de US$ 50 milhões
Previsto na Constituição há 31 anos, o imposto sobre grandes fortunas nunca foi regulamentado no Brasil e deve continuar de fora mesmo se aprovada uma reforma tributária. Apesar de ter apoio de partidos da oposição, o imposto é visto como ineficiente por especialistas e não está no centro dos debates.
A reforma tributária avançou nos últimos meses em duas frentes, uma na Câmara (PEC 45/2019) e outra no Senado (PEC 110/2019), com propostas semelhantes. Ambas focam na simplificação de tributos cobrados ao longo da cadeia produtiva que acabam refletindo no preço final pago pelo consumidor de bens e serviços. Nenhuma delas propõe no texto inicial uma regra para taxar o patrimônio ou a renda dos mais ricos.
O governo, que promete elaborar uma proposta independente, também não manifestou intenção em regulamentar o imposto sobre fortunas. O Ministério da Economia criou um grupo de trabalho que tem até fevereiro de 2020 para apresentar sugestões de melhorias para o sistema tributário.
No último dia 8, PT, PCdoB, PDT, PSB, PSOL e Rede apresentaram uma emenda ao projeto da Câmara que, na prática, é uma proposta completa de reforma tributária da oposição, incluindo um IGF (Imposto sobre Grandes Fortunas). A emenda se juntou a outras 208 que estão na comissão especial, aguardando parecer do relator, o deputado Aguinaldo Ribeiro (PP-PB).
O relator afirmou que fará "uma análise criteriosa das emendas apresentadas" e não deu previsão de quando vai apresentar o parecer.
Imposto de 0,5% para o que passar de R$ 15 milhões
A proposta assinada por deputados da oposição fala em cobrar a cada ano 0,5% do que exceder R$ 15 milhões do patrimônio líquido (todos os bens e direitos, descontadas as obrigações) de pessoas físicas. Assim, alguém que tenha R$ 100 milhões pagaria o IGF sobre R$ 85 milhões, o que representa R$ 425 mil.
A regra valeria até que uma lei complementar fosse editada sobre o tema. Metade da arrecadação seria destinada ao sistema público de educação básica.
Heranças também seriam taxadas com alíquota máxima de 40% sobre o valor acima de R$ 15 milhões.
Objetivo não é perseguir milionários, diz deputado
Segundo o deputado Gustavo Fruet (PDT-PR), que participa da comissão na Câmara, o objetivo não é perseguir milionários ou confiscar patrimônio, mas dar tratamento equilibrado ao sistema tributário. Ele afirmou que o IGF faz parte de uma proposta ampla que também simplifica impostos sobre o consumo e reformula o Imposto de Renda.
O deputado disse que a Câmara pode chegar a um texto coerente que englobe pontos propostos pela oposição. "O relator [deputado Aguinaldo Ribeiro] tem sido aberto ao diálogo, mas não sei se ele vai incorporar alguma coisa", declarou.
Ricos mandarão dinheiro para fora, dizem analistas
Segundo o economista Josue Pellegrini, diretor da Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, o imposto pode até parecer justo do ponto de vista social, mas é quase irrelevante para as contas públicas.
Ele afirma que pessoas com alto poder econômico geralmente têm patrimônio em nome de empresas, o que impediria a tributação. Além disso, existem outros meios de fugir do imposto, como pelo envio de dinheiro para o exterior. "Se fosse tão fácil assim, o imposto seria comum em outros países", diz.
Para o consultor tributário Fagner Souza, da auditoria e consultoria Mazars, o imposto sobre fortunas pode até gerar alguma arrecadação relevante no início, mas levaria à fuga de capital do Brasil em poucos anos. Com isso, além de não tributar o patrimônio dos mais ricos, o imposto também reduziria a arrecadação sobre a renda, que deveria ser o foco do sistema tributário.
"O IGF só seria eficaz se fosse global, porque não teria para onde o dinheiro escapar. Mas isso é impossível, pois cada país tem a sua soberania", afirmou.
Tecnologia poderia impedir saída de dinheiro
O economista Pedro de Carvalho Júnior, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), afirma que vale a pena criar um imposto sobre grandes fortunas para tornar mais justo nosso sistema tributário, já que as pessoas pobres pagam proporcionalmente mais impostos do que as ricas.
Ele defende um imposto progressivo sobre o patrimônio que ultrapassar R$ 4 milhões. A alíquota começaria em 0,5% e chegaria até 2,5%. Pelos cálculos do economista, doutor em política tributária, isso traria uma receita anual de até R$ 30 bilhões (o que equivale ao orçamento do Bolsa Família previsto para 2020).
Segundo o economista do Ipea, a chance de o dinheiro ser retirado do país não é tão grande quanto alertam os críticos à proposta. "A tecnologia atual utilizada pela Receita Federal reduziria a chance de evasão fiscal", disse.
Imposto é debatido nos EUA
A tributação de fortunas é assunto nos Estados Unidos, onde políticos estão em campanha para as eleições primárias presidenciais. No partido Democrata, de oposição ao presidente Donald Trump, a senadora Elizabeth Warren tem como uma de suas principais bandeiras a criação de um imposto de dois centavos para cada dólar que passar de US$ 50 milhões no patrimônio de alguém, uma vez por ano.
A proposta é criticada por alguns, mas a candidata tem ido bem nas pesquisas. Segundo o jornal "The New York Times", Elizabeth Warren alcançou o segundo lugar na disputa para ver quem será o candidato democrata, atrás apenas de Joe Biden Jr., que foi vice-presidente de Barack Obama.
O partido deve definir seu candidato até julho. A eleição presidencial nos EUA está marcada para novembro de 2020.
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