Se a economia está melhorando e o PIB cresce, por que o desemprego não cai?
Resumo da notícia
- Indicadores econômicos mostram recuperação do PIB mesmo em meio à crise da pandemia
- Contratações no ano até abril se aproximam de 1 milhão, mas taxa de desemprego só cresce
- Desemprego ainda vai piorar antes de começar a cair, segundo economistas
A economia do Brasil está melhorando, mas o emprego não. O PIB (Produto Interno Bruto) cresceu 1,2% no primeiro trimestre deste ano em relação ao último trimestre de 2020, emendando o terceiro resultado positivo seguido e recuperando o nível de 2019, antes da pandemia. Mas o desemprego, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), aumentou de 13,9% em dezembro para 14,7% em março.
Segundo especialistas, esse quadro negativo de emprego vai continuar predominando até que a vacinação avance e permita ao Brasil retomar as atividades econômicas e novos investimentos sem restrições.
Setores que mais empregam foram mais afetados por pandemia
Setores afetados pela covid-19 empregam mais gente: A crise provocada pela pandemia prejudicou com mais força justamente os setores que mais empregam no país -aqueles ligados aos serviços.
Essa área é composta por sete atividades (comércio; transportes; serviços de informação; intermediação financeira (bancos); serviços imobiliários; outros serviços; administração pública). O setor representa 68% dos empregos do país.
Negócios menos afetados pela pandemia ou até mesmo ajudados pelo isolamento social, como o da agropecuária e o da mineração, contratam menos mão de obra.
A recuperação está sendo muito desigual. Enquanto alguns setores estão bombando, como o de comércio eletrônico, químicos, farmacêuticos, siderurgia e agropecuária, outros sofrem muito, especialmente os de serviços, cuidados pessoais, transportes, viagens, entretenimento. O setor de serviços representa mais de dois terços dos empregos no Brasil. Então, mesmo com abertura de vagas nas áreas que estão indo bem, isso não é suficiente para compensar o desemprego em serviços.
José Pastore, presidente do Conselho de Emprego e Relações do Trabalho da FecomercioSP (Federação do Comércio de SP) e professor titular da FEA/USP
Por que economia cresce, mas desemprego não cai?
Economistas ouvidos pelo UOL apontam três fatores por trás desse crescimento do PIB sem redução do desemprego.
1. Informais sem trabalho: Entre os empregados do setor de serviços estão os informais, aqueles que não têm carteira assinada e autônomos. Esse grupo foi um dos mais atingidos pelas medidas de restrição à circulação.
Na volta das atividades, as grandes empresas -que empregam trabalhadores formais e têm mais poder financeiro- conseguem retomar os negócios, enquanto os pequenos empresários, com mais funcionários informais, ou já fecharam ou têm maior dificuldade para manter o mesmo quadro de pessoal.
Segundo o IBGE, o número de informais no Brasil era de 33,96 milhões de pessoas ao fim do primeiro trimestre deste ano, quantidade levemente abaixo de dezembro de 2020 (34,03 milhões).
Historicamente, o trabalho informal volta mais rapidamente após uma crise do que o emprego formal. Mas agora está ocorrendo o oposto, porque o emprego informal é exatamente o mais afetado pela pandemia.
Fausto Augusto Junior, diretor-técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos)
2. Utilização de estoques: Parte do crescimento da economia no segundo semestre de 2020 e no primeiro trimestre de 2021 está sendo alimentada pela recomposição de estoques. Na indústria, as empresas voltaram a produzir para atender ao crescimento do consumo de itens como eletrodomésticos ou roupas, por exemplo. Assim, tiveram que recompor os estoques, que ficaram baixos em 2020.
Essas compras de estoques não geram muitos novos empregos porque não representam aumento de produção real, mas retomada de pedidos de insumos e matérias-primas.
A recomposição dos estoques de fato ajudou a retomada da indústria em especial no fim do ano passado. Mas isso é diferente de ampliar a capacidade instalada. Uma coisa é religar uma máquina. Outra coisa é fazer uma nova fábrica, que gera mais empregos.
Marcelo Azevedo, gerente de Análise Econômica da CNI (Confederação Nacional da Indústria)
3. Mais gente procurando emprego: Na pandemia, muita gente deixou de procurar emprego -para se proteger da covid-19; porque não tinha com quem deixar o filho; ou porque cansou de receber negativas. Se a pessoa passar mais de 30 dias sem procurar emprego, ela não entra nas estatísticas da taxa de desemprego. É como se ela se tornasse invisível para as contas do mercado de trabalho.
Agora, com a reabertura aos poucos, muitos voltaram a procurar emprego. Mesmo com mais aberturas que fechamentos de vagas, a taxa de desemprego aumenta.
No primeiro trimestre de 2021, o número de desempregados cresceu 880 mil na comparação com dezembro de 2020, atingindo 14,8 milhões de pessoas. Mas nesse mesmo período, o saldo de novas vagas abertas no Brasil foi positivo, em 957,9 mil empregos -resultado de 6,406 milhões de contratações menos 5,448 milhões de demissões.
A taxa de desemprego não cai porque há os inativos desempregados que voltaram a procurar emprego quando a economia passou a reagir. Enquanto não abrirem mais vagas do que o número de novas pessoas voltando a procurar trabalho, o desemprego não cai.
Marcio Pochmann, professor titular do Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e Economia do Trabalho
Até o fim do ano dificilmente a taxa de desemprego deve ceder.
Fausto Augusto Junior
O que falta para o desemprego cair?
Vacinação: Economistas dizem que o desemprego não vai cair enquanto o setor de serviços não recuperar a normalidade de funcionamento. Isso só deve acontecer depois que a maior parte da população economicamente ativa estiver vacinada.
Vacinação é fundamental. Se houver a partir de julho ou agosto uma vacinação acelerada e maciça, teremos boas surpresas para o mercado de trabalho no fim do segundo semestre.
José Pastore
Mais investimentos: Mesmo com a reabertura do setor de serviços, economistas dizem que a queda do desemprego depende também da expansão da indústria além da recomposição de estoques. Para isso, será necessário aumentar o volume de investimentos na economia.
O Brasil ainda vive fase de decrescimento, que reduziu o tamanho da capacidade produtiva. Veja o caso de empresas que saíram do país, como a Ford, reduzindo a capacidade de produção de automóveis. Para retomar capacidade de produção, precisamos de investimento.
Marcio Pochmann
Onde estão os empregos na retomada
Veja algumas áreas em que a abertura de vagas pode ajudar a reduzir a taxa de desemprego no país.
Setores não afetados pela pandemia: Segundo economistas, os negócios que estão indo bem mesmo com a pandemia vão continuar contratando. Estão nesse grupo:
- Exportadoras de matérias-primas, como grãos e minérios;
- Fabricantes de embalagens;
- Indústria farmacêutica;
- Empresas de tecnologia que oferecem serviços de delivery;
- Comércio digital;
- Líderes no varejo de itens essenciais, como supermercados e farmácias.
Serviços: Se a vacinação ajudar o Brasil a conter a covid-19, atividades que são grandes empregadoras de mão de obra vão precisar recompor os quadros de funcionários para atender à demanda. Estão nesse grupo:
- Redes de restaurantes e lanchonetes;
- Redes de entretenimento, de cinemas, teatro e shows;
- Empresas de turismo e hotelaria
Construção civil: O estoque de imóveis novos não cresceu durante a pandemia porque muitos lançamentos de projetos residenciais e comerciais foram suspensos. No ano passado, parte desses estoques foi comercializada. Então a incorporação e construção de novos empreendimentos deve ganhar força ao longo deste ano e estimular também abertura de vagas em negócios ligados ao setor. Exemplos:
- Pequeno varejo de materiais de construção;
- Setor de móveis;
- Setor de decoração;
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