Profissionais se reinventam na contramão da pandemia
A crise do coronavírus acometeu não somente a saúde dos brasileiros; também dizimou vagas de emprego do país. Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), em 2020 o Brasil teve a maior taxa média de desemprego dos últimos oito anos, com 13,5%. Apesar do cenário desfavorável, alguns profissionais driblaram a pandemia e deram uma guinada na carreira - trocaram de emprego, empreenderam, se apaixonaram pelo trabalho remoto e até aproveitaram novas vagas criadas justamente pela crise sanitária. A seguir, listamos quatro dessas histórias:
Vida fora do escritório
A psicóloga Luana Torres, de 34 anos, tomava café da manhã no carro, a caminho do trabalho, todo dia útil. Entre uma parada e outra no semáforo, abocanhava algo e tomava um gole de café - já estava no piloto automático. Além do tempo que o trabalho lhe tomava, sentia necessidade de aproveitar aquela horas diárias perdidas no trânsito em Contagem, região metropolitana de Belo Horizonte.
Quando a pandemia chegou, Luana passou a trabalhar de casa. E o dia se estendeu: aquelas duas ou duas horas e meia gastas no deslocamento até o escritório ficaram livres. "Eu acordava mais tarde, comecei a fazer atividades físicas, tomar sol, preparar meu café com mais tranquilidade", recorda. Gostou até de iniciar o expediente da cama, quando não acordava se sentindo tão bem.
Tomou tanto gosto por ser dona do próprio tempo que pediu as contas logo depois das férias, em outubro de 2020, do cargo de especialista em carreiras, no Ibmec. "As pessoas perguntavam se eu tinha ficado rica", brinca.
Não era bem isso. Há cinco anos, Luana já prestava consultoria particular a profissionais interessados em mudar de emprego ou de área de atuação. Mas só depois de sentir uma melhora na própria qualidade de vida com o trabalho remoto é que decidiu apostar tudo nessas consultorias.
"Muitos profissionais, assim como eu, notaram que existe vida fora do trabalho. A gente vivia numa pilha, numa cobrança muito grande e isso vira rotina. Nesse ritmo, você deixa de lado coisas importantes, como a família ou você mesmo", conta. Hoje, ela ganha mais, mas também trabalha dobrado. Só que sem precisar tomar o café da manhã no carro.
Emprego pandêmico
A crise sanitária acabou com os rendimentos do engenheiro mecânico Marcos Ferreira e com os de sua esposa Helen Tavares, designer de interiores. Os projetos pararam de aparecer para ela e ele estava desempregado desde dezembro de 2019. Começaram, então, a vender o que podiam: carro, câmera, roupa de mergulho. Até que não sobrou nada para comercializar.
Quase nada. Na hora do maior aperto, "decidimos aproveitar os dons da minha esposa", conta o carioca Marcos. Abriram, então, a Boleria Gourmet. Os primeiros clientes eram amigos e parentes. Esse apoio inicial já foi suficiente para aliviar a tensão do casal: conseguiam pagar as contas, incluindo a escola dos dois filhos, e comprar comida. Atualmente, a empresa caseira fatura perto de R$ 2 mil por mês.
E no meio da bonança confeiteira, uma vaga de emprego apareceu para Marcos em outubro de 2020: ele assumiu como técnico temporário em um hospital de campanha do Rio Centro. "Na virada do ano, fui 'promovido' à analista de suporte e ganhei um cargo de confiança pelo esforço e pela qualidade dos serviços prestados", conta.
Helen segue com os bolos - e Marcos cuida das entregas nas horas em que não está no hospital. A projeção familiar é acabar com as dívidas até o fim de 2021 e abrir uma loja no ano seguinte. "Se tudo der certo, vamos até poder curtir um pouco em família novamente", comemora Marcos.
Doutora sorveteira
Um mestrado e doutorado em administração, com bolsas de estudo e intercâmbio na Holanda, realizaram o sonho de Annaysa Salvador de migrar para a área acadêmica. Para investir nessa ideia, ela deixou para trás nove anos de experiência no setor privado. Os planos seguiam bem, até que veio a pandemia e, com ela, a crise financeira.
"Eu só recebia notícias sobre demissões dentro das universidades. Não tinha mais vaga", conta. No começo de 2020, Salvador analisava as possibilidades futuras, o que poderia fazer ao concluir o doutorado. "Pensei em um pós-doutorado, mas só lia sobre o corte de verbas. Como não dava para contar com isso, fiquei sem perspectiva."
E aí reacendeu nela um antigo desejo: abrir uma sorveteria artesanal. "Há seis anos eu e meu marido falávamos sobre produzir sorvete e sobre ter um negócio próprio. Sempre que abria uma sorveteria a gente visitava e pensava que podia montar a nossa", relata.
Não foi fácil abrir mão dos estudos depois de tantos anos de dedicação. Salvador lembra dos julgamentos: "as pessoas diziam: 'como assim vai virar sorveteira? A doutora virou sorveteira'. Fiquei com muito medo."
Apesar do receio, Salvador manteve a decisão firme, fez cursos na área, vendeu carro e outros bens, e antecipou o final do doutorado. Em maio de 2021, abriu, aos 29 anos, o Dezato Gelato, em Santana, bairro da zona norte de São Paulo. "Ainda quero voltar para a área acadêmica. Mas tenho visto muita gente competente desempregada e não podia esperar algo cair do céu", conclui.
Passaporte carimbado
Quando o coronavírus desembarcou no Brasil, Mariel Deak, de 32 anos, trabalhava na secretaria de desenvolvimento econômico do governo do estado de São Paulo. Formada em ciências sociais, era diretora de dados, pesquisa, avaliação e uso de evidências. Um dos pontos cruciais para o governo estadual combater a pandemia era coletar e organizar todas as informações possíveis sobre a doença, bem como as experiências de outros países. Por isso, Mariel se transferiu para o Comitê da Covid-19.
"Foi desafiador, acho que, para ser bem sincera, nenhum governo, de nenhum lugar do mundo, está preparado para uma crise dessas. Então o que dá para fazer é usar todas as informações que temos", conta.A experiência na gestão da crise foi uma oportunidade para desenvolver novos conhecimentos técnicos, para elaborar regulações e deliberações a fim de conter o avanço do coronavírus, até habilidades socioemocionais para trabalhar em equipe em tempos extremos. Ela acredita que esse intenso período de aprimoramento tenha sido fundamental para ser aceita em um mestrado em Oxford, na Inglaterra, em setembro de 2020. "Acho que essa experiência contou muito. Meus professores se interessam pela história, compartilho minha vivência aqui na universidade", relata.
O Prêmio Lugares Incríveis Para Trabalhar é uma iniciativa do UOL e da FIA para reconhecer as empresas que têm as melhores práticas em gestão de pessoas. Os vencedores são definidos a partir da pesquisa FIA Employee Experience (FEEx), que mede a qualidade do ambiente de trabalho, a solidez da cultura organizacional, o estilo de atuação da liderança e a satisfação com os serviços de RH. As inscrições para a edição 2021 estão abertas e vão até 15 de junho.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.