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Reforma eleva imposto e encarece empréstimos, diz presidente da Febraban

O presidente da Febraban, Isaac Sidney Menezes Ferreira, declarou que a proposta do governo aumenta a carga tributária e é ruim para vários setores da economia - Divulgação/Febraban
O presidente da Febraban, Isaac Sidney Menezes Ferreira, declarou que a proposta do governo aumenta a carga tributária e é ruim para vários setores da economia Imagem: Divulgação/Febraban

Antonio Temóteo

Do UOL, em Brasília

09/07/2021 04h00

A proposta de reforma tributária do governo pode aumentar a carga tributária para diversos setores da economia, incluindo o bancário, avaliou o presidente da Febraban (Federação Brasileira de Bancos), Isaac Sidney Menezes Ferreira.

Em entrevista ao UOL, ele declarou que o projeto governista é ruim para a retomada da economia e tem potencial para afetar a concessão de crédito, com aumento de juros.

Numa análise preliminar, a proposta gera aumento da carga tributária dos setores produtivos da economia, aí incluído o setor bancário, o que é ruim para a retomada da economia, especialmente para o tomador de crédito
Isaac Sidney Menezes Ferreira, presidente da Febraban

Apesar das críticas, Ferreira disse que a proposta vai na direção certa, com redução do imposto das empresas e ao tributar dividendos, mas peca na calibragem das alíquotas e na falta de transição. "Enxergo grande espaço para o debate e seu apromiramento", declarou.

Ferreira também afirmou que os juros são altos no país porque o Brasil é o que menos recupera garantias oferecidas nos empréstimos e tem uma carga tributária com alíquota de 50% sobre os bancos.

Leia abaixo os principais pontos da entrevista:

UOL - O processo de alta da Selic vai levar ao aumento dos juros nos próximos meses?

Isaac Sidney - Muitos criticam o alto patamar dos juros bancários, mas não fazem nada de concreto para atacar as causas, até porque se alimentam da narrativa fácil de críticas aos bancos. É preciso ter a coragem de encarar esse tema.

As taxas ainda são altas no Brasil? Diria altas demais e precisam ser mais baixas, mas isso não depende da vontade dos bancos. A questão é por que os juros são altos.

O Brasil é o país que menos recupera garantia no mundo, o que mais tempo demora e o que mais custo tem para recuperá-la. A inadimplência responde por 1/3 do custo do crédito, e o setor bancário brasileiro é o que tem a maior carga tributária, hoje com 50% de alíquota nominal de tributação corporativa.

Somos um dos poucos países que tributam a receita com a intermediação financeira. Isso tudo vai parar no custo do dinheiro para quem toma crédito. A taxa Selic não é a única variável que influencia os juros bancários, embora o movimento recente de alta deva ter algum reflexo na ponta.

Como a Febraban avalia a proposta de mudança na tributação das empresas e na tributação de dividendos?

Ao reduzir o Imposto de Renda das empresas e ao tributar dividendos, a proposta vai na direção certa de alinhamento com outros países, mas peca na calibragem e na falta de transição do atual para o novo regime.

Nosso sistema de impostos é caótico, complexo, inseguro e nada transparente, além do alto custo de observância. A reforma que está posta, infelizmente, ainda não se mostra capaz de destravar o crescimento econômico, aumentar a produtividade e melhorar o ambiente de negócios, mas enxergo grande espaço para o debate e seu aprimoramento.

Numa análise preliminar, a proposta gera aumento da carga tributária dos setores produtivos da economia, aí incluído o setor bancário, o que é ruim para a retomada da economia, especialmente para o tomador de crédito.

Por que as micro e pequenas empresas recebem menos empréstimos e pagam taxas de juros maiores no Brasil?

Isso é retórica daqueles que insistem em jogar os bancos contra esse importante segmento. O saldo da carteira de crédito para micro e pequenas empresas apresentou aumento significativo em 2020, se comparado a 2019.

A elevação foi de 51,5% para microempresas, 37,7% para as pequenas e 29,6% para as médias, patamares bem superiores aos 14,6% da carteira de empresas de grande porte.

De março e dezembro de 2020, foram liberados R$ 325,2 bilhões em concessões para micro e pequenas empresas. Quanto aos juros, dados do BC mostram que a taxa média praticada pelos bancos nas operações de crédito livre para todas as empresas caiu de 17% para 14,3% na comparação entre fevereiro de 2020 e maio de 2021.

A concentração bancária no Brasil é muito debatida. Há quem defenda que a concentração impede a redução dos juros. Como o senhor avalia essa tese?

Falta um pouco de honestidade intelectual nesse debate. Os bancos precisam ter capital de no mínimo 10,5% dos seus ativos, sendo que o estoque de crédito chegou a R$ 4,2 trilhões em maio.

A exigência regulatória do BC torna naturalmente a indústria bancária mais concentrada, mas outros setores, também intensivos em capital, são até mais concentrados que o bancário, que ocupa a 8ª posição em concentração setorial no Brasil, atrás de segmentos como previdência, petróleo e gás, resseguros, capitalização e telecomunicação.

E, numa comparação internacional, nossa concentração bancária é considerada moderada e é menor do que a de países como Austrália, Canada e França e equipara-se à de Chile, México e Colômbia. Há um mito em torno disso.

O fato é que tem havido, sim, redução da concentração, acompanhada de aumento da competição, segundo dados do próprio BC. Outro equívoco comum é [desconsiderar] que concentração e competição são conceitos distintos e não devem ser entendidos como causa e efeito.

Qual é a posição da Febraban sobre o open banking? Essa inovação vai trazer mais concorrência para o mercado bancário?

Nossa posição tem sido de total engajamento e, não fossem os bancos de maior porte, o open banking não teria chegado até aqui. Enxergamos que será um passo importante no processo de relacionamento com o cliente, na medida que permitirá que ele, dono das suas informações, possa decidir com quem vai compartilhá-las e com quem deseja se relacionar.

Isso vai abrir uma grande avenida de dados e diversas possibilidades para melhor conhecer os hábitos e expectativas dos clientes, superando suas expectativas e oferecendo interfaces modernas e mais conveniência.

Mas fica o alerta de que o cronograma é muito agressivo, o que gera risco adicional na implementação. Será fundamental termos um modelo de governança razoável, equilibrado e sustentável.

O ministro Paulo Guedes afirma com frequência que no Brasil "200 milhões de trouxas são explorados por seis bancos". Isso é verdade?

Respeito o ministro Paulo Guedes, temos uma relação amistosa e produtiva, além de dividir com ele a preocupação com sustentabilidade fiscal e o teto de gastos. Por vezes, o ministro vocaliza expressões mais enfáticas; eu também às vezes sou enfático nas minhas falas.

Certo é que os bancos são parte da solução e não dos problemas brasileiros. A crise da pandemia, por exemplo, não nasceu nos bancos, mas sua saída tem passado pelo setor bancário. Sem a atuação dos bancos, que liberaram R$ 4,5 trilhões em crédito nesse período, estaríamos enfrentando uma recessão ainda maior e a retomada da economia seria bem mais difícil.

O sistema financeiro e de pagamentos funcionou plenamente, mesmo com distanciamento social. Isso só foi possível porque temos um dos setores bancários mais modernos e avançados do mundo.

O Brasil caminha para mais uma campanha eleitoral polarizada entre dois candidatos. Essa dualidade é ruim para o país?

Avalio que ainda é cedo para traçarmos um cenário das eleições do ano que vem. O que antevemos hoje é uma fotografia do momento. A democracia brasileira é jovem e está em processo contínuo de aperfeiçoamento e maturação.

Todos os presidentes eleitos desde 1989 passaram por um processo eleitoral acirrado, com muitos concorrentes. Em 2022 será assim também, o que é saudável. Democracia é debate de ideias e propostas.

O risco de apagão preocupa a Febraban? Quais podem ser os efeitos para a economia e para o setor bancário?

Nosso grande desafio, como país, é voltar a crescer de forma sustentada e isso requer uma forte expansão dos investimentos, em especial no segmento de infraestrutura. Estamos muitos atrasados nesse ponto.

A crise hídrica, com risco de racionamento, preocupa sim. Se ocorrer, terá reflexos danosos para a economia, como impactos nos preços, em um ambiente com inflação em patamares já elevados.

A política ambiental do governo foi criticada pelos presidentes dos bancos privados brasileiros. Como esse debate afeta o setor bancário e por que ele é importante?

Não enxergo críticas na fala dos presidentes, mas a expressão natural de dirigentes de um setor que sempre esteve engajado na adoção de medidas para que as atividades econômicas sejam mais resilientes do ponto de vista climático.

Isso porque temos um papel importante para direcionar recursos a projetos e atividades que contribuam para o desenvolvimento sustentável.

Além disso, negócios que adotem o uso mais eficiente dos recursos naturais representam importantes oportunidades para o setor. Temos, portanto, legitimidade para falar.