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Por que preço de etanol sobe junto com os de petróleo e gasolina?

Etanol acompanha petróleo por causa da relação entre oferta e procura do mercado, dizem economistas - iStock
Etanol acompanha petróleo por causa da relação entre oferta e procura do mercado, dizem economistas Imagem: iStock

João José Oliveira

Do UOL, em São Paulo

24/03/2022 04h00

Resumo da notícia

  • Mesmo produzido no Brasil e a partir de uma fonte diferente de petróleo, preço do etanol segue gasolina
  • Etanol acompanha tendência de preços por causa da relação entre oferta e procura, dizem economistas
  • Eles afirmam que o país deveria atualizar o Proálcool
  • Política dos anos 1970 reduziu dependência nacional do petróleo

O reaquecimento da economia mundial após a pandemia e, agora, a guerra na Ucrânia, invadida pela Rússia, colocaram o petróleo em um ciclo de alta. O barril saltou dos US$ 60, antes da covid, para cotações acima dos US$ 100 neste começo de ano. Esses reajustes que vêm de fora encarecem a gasolina e o diesel, que são derivados do petróleo. Mas também o etanol, produzido dentro do país, e a partir da cana-de-açúcar. Por que isso acontece?

Segundo economistas, o etanol segue a cotação do petróleo porque compete com a gasolina. Como grande parte da frota de carros é flex, os motoristas podem optar por um ou outro combustível de acordo com os preços.

Assim, quando a gasolina sobe, o consumidor busca o etanol, que passa a vender mais. Com o etanol vendendo mais, os produtores podem subir o preço cobrado dos postos. Por sua vez, os postos aumentam o preço para os consumidores.

O fator determinante para a definição do preço do etanol na bomba é o preço da gasolina. Se fizermos uma correlação entre o preço da gasolina comum e do etanol hidratado nas bombas entre janeiro de 2013 e semana passada, teremos uma correlação quase perfeita, de 0,97. Ou seja, o preço do etanol sobe ou desce praticamente na mesma proporção da subida ou descida do preço da gasolina.
Eric Gil Dantas, economista do Observatório Social da Petrobras e do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos e Sociais (Ibeps)

Veja abaixo a variação dos preços dos combustíveis

Aumento acumulado em 12 meses até fevereiro

  • Etanol: +36,17%
  • Gasolina: +32,62%
  • Diesel: +40,54%
  • Gás veicular (GNV): +38,41%
  • IPCA (inflação oficial): +10,54%

(Fonte: IBGE)

Variação em um ano até março do preço médio

  • Etanol hidratado: +17,43%
  • Gasolina comum: +25,23%
  • Diesel: +42,90%
  • Gás veicular (GNV): +44,36%

(Fonte: ANP)

Na última safra, o Brasil produziu 28 bilhões de litros de etanol, sendo 39,3% de anidro e 60,7% de hidratado. O etanol responde por 45% do consumo de combustíveis entre os veículos leves no Brasil.

  • Hidratado: Vendido diretamente aos motoristas, tem adição maior de água, daí seu nome.
  • Anidro: É o etanol adicionado à gasolina A, na proporção de 27% (desde março de 2015). O resultado é a chamada gasolina comum.

Por que etanol sobe com o petróleo?

Antes de mais nada, é preciso entender por que gasolina, diesel e gás veicular (GNV) oscilam conforme a cotação do petróleo no mercado internacional, visto que o Brasil já extrai petróleo suficiente para o consumo local há mais de 15 anos. São dois motivos principais:

  • Política de preços da Petrobras: a empresa controlada pelo governo é a maior exploradora de petróleo no Brasil, respondendo por cerca de 75% da produção interna. Controladora de 13 das 18 refinarias do país, pratica uma política de preços que reajusta os combustíveis no Brasil de acordo com as cotações praticadas no mercado internacional. As cotações são em dólar, então a variação da moeda norte-americana também afeta o preço dos combustíveis.
  • Refino de petróleo: 14 das 18 refinarias brasileiras são antigas, de antes dos anos 1980. Elas foram construídas para processar o petróleo que era importado, um produto do tipo leve. Já o óleo produzido no Brasil é do tipo pesado. Assim, o país precisa importar petróleo para fazer uma mistura que possa ser processada nas refinarias de forma eficiente.
Antonio de Pádua Rodrigues, diretor técnico da Unica (União da Indústria de Cana-de-Açúcar), diz que o fator determinante para o preço do etanol nas bombas é o preço da gasolina. Por isso, se o petróleo sobe, leva junto a gasolina e o etanol.

Sempre que a gasolina sobe, vai haver espaço para aumento do etanol. E, sempre que a gasolina cai, o produtor de etanol não consegue vender se não baixar o preço também. O consumidor é o grande formador de preço nesse mercado.
Antonio de Pádua Rodrigues, diretor da Unica

Preço do açúcar também influencia

Um terço das usinas no país é dedicado exclusivamente à produção de etanol, segundo Rodrigues. O restante tem a capacidade de produzir tanto etanol quanto açúcar, conforme decisão do empresário.

É por isso que a cotação do açúcar também influencia a decisão do produtor de processar mais ou menos cana para produção do etanol.

Segundo dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), 88% do etanol brasileiro nesta safra virá da cana-de-açúcar e 12% virá do milho.

Quando a cotação internacional do açúcar é maior que a do etanol, o percentual de cana-de-açúcar destinado ao etanol cai, e aumenta a fatia para o açúcar. No caso da safra 2020/2021, por exemplo, o mix de produção destinado ao açúcar subiu de 35% para 46%.

Na última safra, a produção de cana-de-açúcar foi afetada pelo clima, com períodos de seca e de geada, que reduziram a oferta do setor em 16% ante a safra anterior. Quanto menos cana-de-açúcar, menor a oferta de etanol, o que acaba afetando o preço do produto.

Mas isso tudo vale apenas para um período inicial da safra, segundo Rodrigues. Além disso, afirma, o preço do açúcar no mercado internacional também depende da produção brasileira, maior fornecedor mundial do produto.

Etanol poderia se descolar do petróleo?

O Brasil poderia reduzir a correlação de preços entre o etanol e o petróleo se adotasse uma política de estímulo aos combustíveis renováveis, dizem especialistas em energia e empresários do setor.

Segundo eles, não se trataria de voltar aos tempos do Proálcool, criado nos anos 1970 para reduzir a dependência do Brasil em relação ao petróleo, após disparadas de preços provocadas por conflitos no Oriente Médio e, principalmente, pela criação da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) na década anterior.

O Proálcool perdeu o sentido original porque o Brasil não tem mais a dependência que tinha do petróleo meio século atrás, dizem especialistas. Mas programas de estímulo a combustíveis renováveis deveriam fazer parte de uma política de governo, porque a matriz energética mundial está mudando e por causa da necessidade de reduzir o impacto ambiental das atividades econômicas.

Há quem diga que o Proálcool foi caro. Mas quanto custa investir em políticas que reduzam a dependência do petróleo e, ao mesmo tempo, formem nossa liderança em um combustível com menor emissão de gás carbônico?
Ricardo Balistiero, coordenador do curso de Administração do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT)

Precisamos retomar o Proálcool, obviamente com novo formato, para que ele não tenha que oscilar conforme as crises mundiais.
Paulo Feldmann, professor da FEA-USP

Como aumentar a produção de etanol

Especialistas destacam que o Brasil assumiu o compromisso, por meio do programa RenovaBio, de aumentar a produção do etanol dos atuais 30 bilhões de litros para cerca de 50 bilhões de litros e triplicar a produção de biodiesel, para 13 bilhões de litros, até 2030.

Essa ampliação pode ser atingida por meio de políticas que ofereçam, por exemplo, garantia de preço mínimo aos produtores, linhas de financiamento para investimentos em infraestrutura e ampliação da logística de distribuição.

Desde o início do Proálcool, já aumentamos em 55 vezes a produção de etanol. Isso é importante para a segurança energética do país. E tem ainda a questão ambiental, pois biocombustíveis emitem menos carbono e podem ser mais um elemento para uma transição energética.
Eric Gil Dantas, economista do Observatório Social da Petrobras e do Ibeps

Empresários e especialistas criticam medidas pontuais, como a que busca reduzir o ICMS sobre os combustíveis, porque elas beneficiam combustíveis fósseis, em vez de programas de longo prazo voltados às fontes renováveis de energia.

Quando fala em desonerar o combustível fóssil, o governo está, na verdade penalizando o combustível renovável.
Antonio de Pádua Rodrigues, diretor da Unica