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Caso McPicanha: lei sobre propaganda no Brasil é tão rígida quanto lá fora?

McDonald"s tirou o McPicanha do cardápio após a repercussão negativa - Reprodução/YouTube
McDonald's tirou o McPicanha do cardápio após a repercussão negativa Imagem: Reprodução/YouTube

Giuliana Saringer

Do UOL, em São Paulo

29/04/2022 18h26

A polêmica sobre o McPicanha, sanduíche do McDonald's que não tem picanha, envolveu diversos órgãos brasileiros, como o Procon, o Ministério da Justiça e Segurança Pública e o Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária). No fim das contas, a empresa pediu desculpas pelo "vacilo" e tirou o sanduíche do cardápio.

Como teria sido a reação das autoridades ao caso se ele tivesse acontecido em outros países? O Brasil tem uma lei tão rígida quanto a dos Estados Unidos e da Europa em relação à publicidade e aos direitos do consumidor? Especialistas ouvidos pelo UOL consideram que a lei brasileira está no mesmo nível das melhores que existem no exterior. O que muda é a fiscalização, que por aqui é descentralizada. Saiba mais abaixo.

Como foi a reação no Brasil

Após vir a público a informação sobre a ausência de picanha no McPicanha, vários órgãos entraram em cena.

Primeiro, o Procon-SP notificou o McDonald's, pedindo esclarecimentos sobre a composição do lanche e uma cópia dos materiais publicitários divulgados. O prazo para apresentar os documentos termina na segunda-feira (2).

Depois, o Ministério da Justiça e Segurança Pública também pediu explicações, para investigar a possível prática de propaganda enganosa. Deu dez dias para que o McDonald's envie as informações.

Além disso, o Conar decidiu abrir uma ação ética contra o McDonald's para verificar a "veracidade da mensagem publicitária" no caso. O órgão é formado por membros da sociedade civil, como emissoras de TV, publicitários e imprensa.

Procon e ministério têm o poder de aplicar multas à empresa, se julgar necessário. Já o Conar pode apenas sugerir a suspensão ou alteração de anúncios publicitários.

Lei brasileira é parecida com a de países desenvolvidos

Vitor Boaventura, advogado especializado em direito do consumidor e sócio do escritório Ernesto Tzirulnik Advocacia, afirma que os controles de publicidade tendem a ser bem parecidos entre os países.

Na grande maioria dos países, o paradigma é semelhante ao do Brasil, prezando pela transparência e pela veiculação de informações verdadeiras. Em qualquer país do mundo, a propaganda enganosa tem um tratamento bem rígido.
Vitor Boaventura, advogado

O nível também é parecido em relação ao direito do consumidor, diz Maristela Basso, professora de direito internacional e comparado da USP (Universidade de São Paulo) e sócia do Nelson Wilians Advogados.

O Código de Defesa do Consumidor brasileiro tem o que há de mais moderno do mundo, é adequado. Está de acordo com os países desenvolvidos, o que significa que o consumidor está bem protegido no Brasil.
Maristela Basso, professora da USP

O que difere é a fiscalização

O que muda de um país para o outro é a estrutura que regula e fiscaliza as propagandas, dizem os especialistas.

Valdir Rocha, sócio da área de propriedade intelectual, publicidade e franchising do Veirano Advogados, explica que quase todos os países da América Latina têm um órgão semelhante ao Conar. Ou seja, prevalece a autorregulamentação.

Nos Estados Unidos e em países da Europa, porém, é diferente.

Nos EUA, existe um órgão que cria as regras, fiscaliza e pune as empresas infratoras, o FTC (Federal Trade Commission, ou comissão federal do comércio). No Reino Unido, há um órgão com a mesma função, a ASA (Advertising Standards Authority, ou autoridade para as normas publicitárias).

"Na União Europeia, existe uma norma comunitária, mas cada um dos países também cria suas próprias regras para fiscalização de publicidade", afirma.

Isto significa que, nesses lugares, o órgão que fiscaliza é o mesmo que aplica as multas.

No Brasil, três órgãos diferentes vão falar, por exemplo, sobre o McPicanha: o Conar, o Procon e o Ministério da Justiça. Um órgão federal como o FTC seria o ideal para centralizar tudo.
Valdir Rocha, advogado

'Conar tem autoridade moral'

Apesar de não aplicar multas, o Conar desenvolveu uma espécie de "autoridade moral" no mercado publicitário, o que torna o controle de anúncios rígido, afirma Luiz Cavalheiros, professor da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing) e sócio da consultoria Parangolé do Saber.

Quando o Conar fala para tirar as propagandas do ar, as empresas tiram.
Luiz Cavalheiros, professor da ESPM

"O Conar tem uma rigidez maior do que nos Estados Unidos. Lá, por exemplo, as empresas podem citar os concorrentes em propagandas, aqui não. O Conar, unido com o Procon e o Código de Defesa do Consumidor, garante um dos ecossistemas de maior proteção no mundo. É um dos melhores que existem", afirma.