Logo Pagbenk Seu dinheiro rende mais
Topo

Ameaças e falta de salário: Por que pesquisadores estão abandonando Censo?

Manifestação de recenseadores do Censo 2022 - Arquivo Pessoal
Manifestação de recenseadores do Censo 2022 Imagem: Arquivo Pessoal

Gabriela Bulhões

Colaboração para o UOL, em São Paulo

04/10/2022 04h00

O IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) teve de abrir em 14 de setembro um novo concurso para contratar mais de 8.000 recenseadores e agentes censitários para trabalhar no Censo 2022. Isso acontece bem no meio dos trabalhos do Censo, que começaram em agosto. Em quase dois meses de entrevistas, menos de 30% dos setores que compõem a pesquisa foram concluídos, segundo o IBGE. A previsão era concluir o trabalho até o final de outubro, mas o IBGE anunciou o adiamento até dezembro.

O que está acontecendo? Em agosto, quase 20 dias após o início das pesquisas, o IBGE divulgou que já havia feito 6.550 rescisões de contratos de trabalhadores temporários. Embora as demissões representem 3,7% dos recenseadores contratados (incluindo quem está em treinamento, segundo o IBGE), os problemas se acumulam. Os trabalhadores afirmam que sofrem assédio verbal e ameaças durante a pesquisa. No início de setembro, houve greve por atraso nos pagamentos e pedido de melhores condições de trabalho.

Ameaças e atrasos de salário: Os recenseadores relatam que passam por situações complicadas, como assaltos, ameaças, assédio sexual e racismo.

Os trabalhadores também reclamam de atraso nos pagamentos. Plínio Arraes, um dos fundadores da União dos Recenseadores, em Salvador (BA), afirma que as pessoas não têm dinheiro nem para trabalhar. "É uma degradação do serviço público", afirma.

Para Lucas Ferreira, outro líder do União dos Recenseadores, contratar mais pessoas para passar pelos mesmos problemas não é a solução. Ele diz que não tem como terminar o Censo na data prevista nessas condições.

Recusa em responder às entrevistas: Ferreira afirma que há uma resistência da população em responder e que é desgastante voltar para a mesma casa várias vezes até conseguir uma entrevista.

O pagamento dos trabalhadores está condicionado a metas de pesquisas feitas —eles só podem ter 5% de recusas.

Plínio - Arquivo Pessoal - Arquivo Pessoal
Plínio Arraes, um dos fundadores da União dos Recenseadores, em Salvador
Imagem: Arquivo Pessoal

Quais as dificuldades dos recenseadores? A recenseadora Tatiane Oliveira Sousa já fez o Censo 2010 e voltou a fazer parte da coleta como uma forma de garantir uma renda extra para a família, que vai aumentar, pois ela está grávida.

Ela conta nas redes sociais os perrengues da rotina, como sobrecarga de trabalho, endereços que que não existem, e a recusa dos moradores em responder ao questionário.

"Sou uma mãe de família que viu no Censo uma oportunidade de aumentar a renda, mas a gente enfrenta muitas questões. Só queremos trabalhar com dignidade."

Reivindicações dos trabalhadores: Os recenseadores reclamam de demora de pagamento nos setores já concluídos, atrasos nos repasses do auxílio-deslocamento e na remuneração referente ao período de treinamento. Além disso, alegam falta de transparência e informação. Entre os pedidos, estão:

  • correção dos valores por produção e pesquisa (segundo os recenseadores, os valores são de 2020 e precisam ser corrigidos pela inflação)
  • aumento de 50% para 80% no pagamento adiantado por setor
  • aumento da taxa máxima de 5% para 20% de recusas em responder ao questionário
  • mudança na calculadora do IBGE para inserir taxas reais e dar transparência de quanto irão receber
  • pagamento antecipado do transporte
  • canal de atendimento para o recenseador
  • comunicação extrajudicial para quem se recusar a responder ao Censo
  • pagamentos de todos os débitos atrasados do IBGE

O que diz o IBGE? Para o IBGE, a desistência de pesquisadores está dentro do esperado. "A rotatividade no quadro de recenseadores é normal, considerando-se um universo com mais de 180 mil trabalhadores temporários, que estarão trabalhando no IBGE por pouco mais de três meses", diz o instituto em resposta ao UOL.

No momento, 153.878 recenseadores estão contratados, enquanto 20.819 estão em treinamento, totalizando 174.697. O instituto afirma que, desde o início do Censo 2022, foram feitos cinco processos seletivos suplementares. O mais recente oferece 7.795 vagas para recenseadores e 436 para agentes censitários.

Por que atrasou o pagamento? Questionado sobre os trabalhadores, o IBGE responde que mais de 90% dos problemas de pagamento se deram ainda nas primeiras semanas, por erros de cadastro, muitas vezes cometidos pelos próprios recenseadores.

Além disso, o congestionamento nos sistemas de algumas unidades estaduais contribuiu para o atraso, diz o órgão.

A fundação diz que ambos os casos foram solucionados e chama atenção para o fato que os recenseadores recebem por produção, após entregarem seu setor censitário concluído e com a aprovação de seus supervisores.

"É importante, dedicar o máximo de horas possível à atividade, e procurar visitar os domicílios em horários alternativos, para conseguir encontrar os moradores em suas residências", diz o IBGE.

Qual o futuro do Censo 2022? Segundo o instituto, o maior desafio agora é que os recenseadores sejam recebidos em todos os domicílios do Brasil.

O plano do IBGE para resolver a situação é que os supervisores das unidades estaduais continuem conversando com suas equipes de recenseadores e equacionando as questões apresentadas. O órgão também diz que os processos de supervisão e pagamento já foram agilizados.

"O IBGE tem ouvido a todos e ressalta que graças às nossas equipes de recenseadores, o Censo 2022 já coletou os dados de mais de 82 milhões de pessoas, e mais de 56% dos 452.246 setores censitários do país já foram iniciados ou concluídos."

PUBLICIDADE
Errata: este conteúdo foi atualizado
O IBGE não é uma autarquia, mas sim uma fundação. O texto foi corrigido.