Igualdade salarial eleva ou reduz contratação de mulher? Analistas comentam
O projeto de lei de igualdade salarial apresentado pelo governo vai aumentar ou reduzir a oferta de trabalho para mulheres?
O que aconteceu?
O projeto foi apresentado na semana passada e ainda precisa ser analisado pelo Congresso e regulamentado. Mas já gera questionamentos sobre como pode ser aplicado de maneira a evitar consequências como a redução na contratação de mulheres. Ainda não há prazo para a medida entrar em vigor.
O projeto prevê sanções às empresas que pagarem menos a mulheres do que a homens na mesma função. A diferença já é proibida pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), mas, na prática, falta fiscalização sobre as empresas para garantir que a legislação seja cumprida. De acordo com o IBGE, as mulheres recebem, em média, 78% do salário dos homens.
As empresas terão que construir planos de cargos e salários. Esses planos devem definir objetivamente as diferenças entre pessoas que ocupam a mesma função e têm a mesma carga horária de trabalho, diz Rosane Silva, secretária de autonomia econômica e política de cuidados do Ministério das Mulheres.
Se o homem ocupa cargo de auxiliar administrativo 1, com salário maior, enquanto a mulher ocupa a faixa 2, com ganhos menores, a empresa precisa justificar isso. Caso contrário, vai ser autuada por discriminação, diz Silva. Ela afirma que as empresas hoje não precisam revelar seus planos de cargos e salários. Iniciativas como o projeto permitem romper com a discriminação.
O que queremos não é que as empresas paguem multa, mas que de fato tenham um programa em que o plano de trabalho mostre cargos e salários do conjunto dos trabalhadores e que vá acabando com a disparidade salarial. A multa é o último recurso. Queremos que as empresas cumpram com o papel social que é ter política igualitária de salários e condições objetivas entre homens e mulheres
Rosane Silva
Risco de evitar mulheres
Há risco de as empresas evitarem as mulheres. A avaliação é de Renan Pieri, professor de economia da FGV (Fundação Getulio Vargas). Ele diz que a punição com multa pode levar algumas empresas a ter um comportamento não esperado, como a redução na contratação ou a segmentação das mulheres nas companhias.
As empresas podem optar por não contratar mulheres ou segmentar as ocupações conforme gênero: um setor só tem mulher e o outro só tem homem. Isso tem potencial para aumentar a desigualdade salarial global entre homens e mulheres. A intenção é correta, mas outras políticas públicas podem ser mais efetivas neste sentido.
Renan Pieri
Outro especialista aponta esse risco. Sergio Schwartsman, coordenador da área trabalhista do escritório de advocacia Lopes da Silva & Associados, diz que a contratação de mulheres pode sofrer efeitos como os das empregadas domésticas registradas: a contratação por carteira assinada caiu depois da aprovação da PEC das domésticas.
Ele diz que a CLT já exige igualdade de gênero e isso não evitou a contratação de mulheres. Mas as mudanças sugeridas podem ter esse efeito.
A lei já existia com penalidades e não inviabilizou a contratação de mulheres. Mas o aumento da multa e a possibilidade expressa de condenação em danos morais podem 'assustar' empregadores, que podem preferir não contratar mulher.
Sergio Schwartsman
Rosane Silva reconhece o risco. Ela diz que cabe ao Estado brasileiro construir as condições para mudar essa condição.
Só se evita esse tipo de problema rompendo com o machismo estrutural da sociedade brasileira. Nós, mulheres, já estamos segmentadas nas profissões ou nos cargos com menos ascensão profissional. Esse tipo de risco sempre vai existir porque vivemos numa sociedade machista e patriarcal.
Rosane Silva
Principais pontos do projeto
- A empresa que provocar discriminação de funcionário, seja por questão de gênero, raça ou etnia, terá que pagar a diferença salarial e multa de dez vezes o salário da pessoa. O valor será dobrado em caso de reincidência.
- Mesmo com o pagamento desses valores, a funcionária poderá pedir indenização por danos morais.
- As empresas com mais de 20 funcionários deverão publicar relatórios de transparência salarial e remuneratória.
- O Ministério do Trabalho vai regulamentar o tema e fiscalizar as empresas.
- Os relatórios conterão dados e informações que permitam a comparação objetiva entre salários e remunerações recebidos por mulheres e homens, observada a legislação de proteção de dados pessoais.
- Se a discriminação ficar comprovada, a empresa vai ter que apresentar e implementar um plano de ação para mitigar a desigualdade, com metas e prazos, garantindo a participação de representantes das entidades sindicais e de funcionários.
Se não cumprir as medidas, a empresa vai pagar multa administrativa equivalente ao valor de cinco vezes o maior salário pago pelo empregador. Em caso de reincidência, terá que pagar multa 50% maior, "sem prejuízo das sanções aplicáveis aos casos de discriminação salarial e remuneratória entre mulheres e homens", diz o texto.
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