Dona da Itaipava vai quebrar? Entenda a crise do Grupo Petrópolis
O Grupo Petrópolis, dono da cerveja Itaipava, entrou em recuperação judicial na segunda-feira (27). Sempre que uma empresa pede recuperação judicial, isso indica uma crise. Mas não significa necessariamente que ela vá quebrar. Segundo analistas, a dívida não é tão grande, e há boas perspectivas.
O que causou a crise?
- O mercado de cervejas sofreu mudanças importantes durante a pandemia. O consumidor reduziu consumo em bares e passou a beber em casa.
- Isso levou a um crescimento do interesse por bebidas premium. Ao comprar mais no supermercado, onde a bebida é mais barata do que no bar, o consumidor passou a se permitir gastar com rótulos mais caros. As marcas mais dependentes do consumo fora de casa sofreram.
- Cervejarias como a Ambev conseguiram aproveitar bem esse movimento. A Ambev multiplicou o número de marcas em seu portfólio, com destaque para as bebidas premium.
- O Grupo Petrópolis teve lançamentos e investiu em inovação, mas não com a mesma força. É o que diz Hudson Romano, gerente sênior de Consumo Fora do Lar da consultoria de mercado Kantar.
Guerra de preços
- O Grupo Petrópolis diz que seus principais concorrentes seguraram seus preços. Isso mesmo com o aumento de preços dos insumos para produção de cerveja. É o que diz o pedido de recuperação judicial apresentado à Justiça.
- Isso foi possível porque suas concorrentes são beneficiadas por incentivos fiscais. O pedido de recuperação judicial diz que as principais concorrentes do grupo recebem incentivos por produzirem na Zona Franca de Manaus e adotam práticas consideradas "planejamento tributário abusivo" pelas autoridades fiscais.
- Para não perder espaço, a empresa também segurou preços. Isso comprometeu sua saúde financeira.
- A Ambev tem reduzido suas margens no Brasil desde 2012. É o que diz um relatório do Itaú BBA sobre o tema. Isso levou a uma redução na rentabilidade de toda a indústria, diz o banco.
- O Grupo Petrópolis alimentou os ganhos de mercado da Ambev e da Heineken nos últimos três anos. É o que diz o relatório do Itaú BBA.
- Durante a pandemia, a Ambev, a maior do setor, recuperou espaço no mercado. A participação de mercado da Ambev no Brasil era de 66% em 2010, foi a 49% no início de 2020, voltou a 66% no final de 2022, segundo dados do BTG Pactual.
Em nossa visão, a notícia [da recuperação judicial] pode ser interpretada como um sinal de que o nível de rentabilidade do setor cervejeiro brasileiro está em níveis abaixo do ideal.
Relatório do Itaú BBA
Relatório do Itaú BBA
Juros e inflação
- A alta na taxa básica de juros, a Selic, contribuiu para deteriorar a situação da empresa. A Selic está em 13,75% desde agosto de 2022.
- A dívida do grupo é de R$ 4,2 bilhões. São R$ 2 bilhões em obrigações financeiras e do mercado de capitais e R$ 2,2 bilhões com grandes fornecedores.
- A taxa atual gera uma despesa de cerca de R$ 395 milhões por ano para a empresa. Com isso, a empresa estima que, até 10 de abril, precisaria de R$ 580 milhões a mais do que o projetado para o seu capital de giro.
- A inflação também afetou a empresa. O principal público das marcas do Grupo Petrópolis são as classes D e E, e elas foram as mais afetadas pelo aumento da inflação nos últimos anos, diz o especialista da Kantar.
Tudo em volta desse consumidor aumentou, e ele começa a selecionar. Isso leva a perda no grande foco do Grupo Petrópolis, enquanto Ambev e Heineken conseguem trabalhar com diversos públicos.
Hudson Romano, gerente sênior de consumo fora do lar da Kantar
O que acontece com a empresa agora?
- A empresa precisará apresentar um plano de recuperação judicial. O plano deve ser aprovado em uma assembleia de credores. Se o plano não for aprovado, a empresa pode ter sua falência decretada.
- A crise do Grupo Petrópolis ocorre em um momento de crescimento do setor. O consumo de cerveja por habitante cresceu de 58 litros por habitante por ano em 2018, para 67 litros por habitante por ano em 2021, segundo dados do BTG Pactual.
- A tendência para o ano é que o bom momento do mercado continue. Isso deve facilitar a recuperação da dona da Itaipava, segundo a Kantar.
- Para sair da crise, o grupo provavelmente terá que reforçar o lançamento de novos produtos. Hoje o grupo é focado quase completamente em cervejas mais baratas, segmento que perdeu espaço.
- A empresa também pode ser vendida. Um potencial comprador seria a Heineken, atualmente a segunda maior cervejaria no país. Engarrafadoras da Coca-Cola também podem se interessar por ativos da empresa, diz o BTG. Há ainda a possibilidade de um comprador estrangeiro se interessar pelo negócio, segundo o Itaú.
O tamanho da crise
- A empresa teve queda na venda de bebidas nos últimos 18 meses. O volume foi de 31,2 milhões de hectolitros em 2020 para 24,1 milhões de hectolitros em 2022. Um hectolitro equivale a 100 litros.
- Isso levou a uma queda de 17% na receita do grupo. A receita bruta caiu de R$ 15,6 bilhões em 2020 para R$ 13 bilhões em 2022.
- A dívida de 4,2 bilhões reportada pela empresa é considerada pequena para o porte da companhia, na visão dos analistas do BTG Pactual. Com a recuperação judicial, o grupo tem a possibilidade de adiar pagamentos e melhorar sua situação financeira para voltar a competir, disse o banco em relatório.
- O grupo é dono marcas de cerveja, vodka e outras bebidas. A marcas de cerveja são Itaipava, Petra, Cabaré , Black Princess, Crystal, Lokal, Weltenburger, Brassaria Ampolis (com os rótulos Cacildis, Biritis, Ditriguis e Forevis). As vodcas são Blue Spirit Ice, Nordka e Cabaré Ice. O grupo também possui energéticos, isotônicos e água.
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