Menor taxa de desemprego da história ainda 'esconde' números ruins

O desemprego no Brasil recuou para a menor taxa de toda a série histórica para o período, coletada desde 2012. O dado positivo apresentado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) traz o recorde no número de profissionais na força de trabalho, mas ainda esconde o número de quem desistiu de procurar por emprego ou trabalha menos do que gostaria.

Com a inclusão dos trabalhadores subutilizados, a taxa de desemprego dobraria. Além disso, há milhões que desistiram de procurar um emprego. A média brasileira também esconde que certos estados estão em situação pior que outros, e esconde que o desemprego é maior para as mulheres, a população negra e os jovens com idade entre 18 e 24 anos.

O que aconteceu

Taxa de desemprego no Brasil é a menor da série histórica. A última divulgação da Pnad Continua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) mostra que 6,8% dos brasileiros buscaram, sem sucesso, por uma colocação no mercado de trabalho entre os meses de maio e julho de 2024. O percentual equivale a 7,4 milhões de pessoas nessa situação.

População na força de trabalho bate novo recorde em julho. São 109,5 milhões inseridos no ambiente profissional, 62,15% das pessoas residentes no Brasil com 14 anos ou mais. Os demais 66,7 milhões (37,85%) estão fora do mercado de trabalho.

Participação dos brasileiros se aproxima de nível recorde. Hélio Zylberstajn, professor sênior da Faculdade de Economia da USP (Universidade de São Paulo), avalia que a divisão da população economicamente ativa (176,2 milhões) pela da força de trabalho (109,5 milhões) resulta em uma taxa de participação de 62,1%, percentual próximo ao limite de capacidade do mercado nacional. "Chegamos a 63,8% uma única vez, em outubro de 2019. Esse indicador mostra até onde podemos chegar", avalia.

Todos esses números combinados indicam que estamos perto do esgotamento de utilização da nossa força de trabalho.
Helio Zylberstajn, professor especialista em mercado de trabalho

Salários ainda estão baixos

Média das remunerações subiu, mas ainda não supera patamar de 2020. Com a mercado de trabalho aquecido, o rendimento médio mensal recebido pelos profissionais brasileiros subiu 4,8% em um ano e atingiu R$ 3.206 em julho. Apesar da alta, o valor segue 1,9% abaixo dos R$ 3.267 embolsados pelos trabalhadores há quatro anos. "O Brasil é grande, com custos e realidades financeiras variadas, o que ainda gera diferenças salariais e oportunidades de emprego entre regiões", diz Cíntia Britto, diretora de recursos humanos da Aurum.

Média desconsidera divergências entre estados e grupos sociais

Estados atravessam situações distintas de desemprego. Enquanto Santa Catarina (3,2%), Mato Grosso (3,3%), Rondônia (3.3%) e Mato Grosso do Sul (3,4%) flertam com o pleno-emprego, a taxa de desocupação é três vezes maior em Pernambuco (11,5%) e na Bahia (11,1%). Os números estaduais são referentes ao segundo trimestre, os mais recentes revelados pela Pnad.

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O Brasil é um território muito grande. Quando a gente fala da média, a população do Sul vai se enxergar, mas a população do Norte e do Nordeste, não.
Paula Montagner, subsecretária do Ministério do Trabalho

Formação histórica explica os diferentes cenários do país. Para Zylberstajn, os estados do Sul têm taxas de desemprego mais baixas devido ao desenvolvimento da região, com a predominância de empresas familiares com grande número de funcionários. "A ocupação no Sul do país é grande e, portanto, a taxa de desocupação é pequena. No Nordeste ocorre o contrário, porque há uma ocupação diferente do espaço", explica ao destacar os "diferentes brasis" ilustrados pela Pnad.

Distorções ainda afastam o Brasil do pleno-emprego. Montagner reforça que a média de desemprego exclui as mulheres, a população negra e os jovens com idade entre 18 e 24 anos. "Homens brancos têm taxas de desemprego baixas, mas no conjunto a população não se sente representada. Antes de falar de pleno emprego, é importante falar sobre essas situações", observa a subsecretária.

Diferenciais "são estruturais", avalia Zylberstajn. Para o professor, as alterações aparecem em diferentes movimentos do mercado de trabalho. Ele entende que os movimentos refletem um histórico estrutural da sociedade. "Pode até haver discriminação, mas a magnitude dela é bem menor do que esses números mostram", avalia.

Subutilização

Apesar dos números positivos, o Brasil ainda tem 18,7 milhões de trabalhadores subutilizados. A soma equivale à população desocupada (7,4 milhões), subocupados por insuficiência de horas (5 milhões) e aqueles que não estão ocupados nem desocupados, apesar de possuírem potencial para integrar a força de trabalho (6,3 milhões). O total de pessoas em uma dessas situações representa 16,2% do mercado de trabalho nacional.

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Desemprego cresce com a inclusão dos subutilizados no cálculo. Durante a última apresentação de dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), Paula Montagner, subsecretária de estatísticas e estudos do Ministério do Trabalho, alertou que a taxa de desocupação dobraria com a adição dos subocupados na elaboração da Pnad. A avaliação considera que o cálculo do desemprego é uma média apenas daqueles que buscam efetivamente por uma colocação.

Mesmo assim, há melhoras

Cerca de 5 milhões trabalham menos do que gostaria - número caiu. O número representa aqueles que exercem atividades por menos de 44 horas semanais, mas têm disponibilidade e desejam trabalhar por mais horas. A estimativa é um recuo de 35% em relação a 2012. "Grande parte da subutilização desapareceu. Ela nunca vai ser zero, mas diminuiu muito", observa Zylberstajn.

Quase 4,8% dos profissionais desistiram de buscar emprego. Mesmo com a queda de 12,2% em um ano, o desalento ainda atinge 3,2 milhões de brasileiros que estão disponíveis para trabalhar, mas abriram mão da busca, seja por considerar que não conseguiriam emprego adequado, por serem muito jovens ou idosos, não ter experiência ou acreditar não ter trabalho onde moram.

Soma de desempregados e desalentados caiu de 14% para 12% em 12 anos. É a queda calcula que a soma dos desempregados e os desalentados recuou 14,3%, na comparação com a primeira divulgação da Pnad, em março de 2012. "É uma desocupação escondida", diz ele ao ponderar que a variação é semelhante à apresentada pela taxa final de desempego, que passou de 8% para 6,8% no período.

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