Selic, inflação e clima: quais desafios Galípolo poderá enfrentar no BC
Gabriel Galípolo, indicado para assumir a presidência do Banco Central, foi sabatinado nesta terça-feira (8) no Senado. Durante a sessão, ele respondeu a questionamentos sobre os desafios que enfrentará à frente da instituição.
Especialistas consultados pelo UOL Economia comentaram sobre o que pode esperar o futuro presidente do BC na instituição. Entre os desafios estão a relação com o mercado financeiro, o diálogo com o presidente da República e o impacto das mudanças climáticas na economia.
Selic muito alta
Segunda maior taxa de juros do mundo. A Taxa Selic está em 10,75%, após a última reunião do Copom. Esse valor foi fixado em 18 de setembro, com um acréscimo de 0,25 pontos percentuais. Apesar de ter sido o primeiro aumento desde 2022, a taxa é considerada uma das mais altas do mundo, ficando atrás apenas da Rússia, país que está em guerra com a Ucrânia há dois anos.
Selic está desconectada do problema inflacionário. Segundo o economista Pedro Faria, a inflação do Brasil não é necessariamente de demanda, que é o tipo combatido com juros altos. "Muitas vezes, nossa inflação possui outra natureza, para a qual os juros não são a ferramenta mais adequada", afirmou.
Banco Central enfrentará desafios para ajustar a Selic. O também economista André Perfeito defende que um dos maiores desafios de Gabriel Galípolo será adequar a taxa de juros ao patamar da inflação real do país. Atualmente, o IPCA acumulado em 12 meses é de 4,24%, ainda dentro da meta estipulada, que é de 3%, com intervalo de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos.
Pressões políticas
Galípolo é a primeira indicação de Lula ao Banco Central independente. Gabriel Galípolo foi indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para o comando do Banco Central, sendo a primeira nomeação feita por Lula desde que a instituição foi estabelecida como independente. Seu antecessor, Roberto Campos Neto, foi indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e, desde antes da posse de Lula, vem sendo alvo de críticas do petista, que acusa o BC de tomar decisões políticas, e não técnicas.
Campos Neto nega acusações, mas ações sugerem envolvimento político. Entre elas, sua participação em um grupo de WhatsApp com ministros do governo Bolsonaro, mesmo após a derrota de Bolsonaro nas eleições de 2022, e sua presença em um jantar oferecido pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Ele chegou a ser cogitado como futuro ministro da Economia de Tarcísio caso o governador dispute e vença a presidência em 2026. Campos Neto, no entanto, diz que nunca conversou com o governador de São Paulo sobre ser seu futuro ministro.
Desavenças entre Lula e Campos Neto colocaram em cheque a indicação do petista ao BC. Há uma desconfiança de parte do mercado financeiro se a independência do banco será mantida. Pedro Faria, no entanto, acredita que o governo não interferirá no BC. "O Banco Central precisa manter uma distância saudável das instituições que ele regula. Espero que Galípolo saiba gerir melhor esses relacionamentos", comenta.
O principal desafio é conquistar a confiança do mercado de que não cederá às pressões políticas que qualquer presidente de BC recebe para baixar juros. Estamos num momento em que as expectativas inflacionárias estão desancoradas e longe da meta de 3%. Como trazer a inflação para esse patamar sem ceder às pressões políticas não é trivial.
Alexandre Espírito Santo, coordenador de economia e finanças da ESPM e economista da Way Investimentos
As expectativas do mercado
O controle das expectativas do mercado financeiro será um desafio para Gabriel Galípolo no Banco Central. As decisões do BC, como o aumento ou não da taxa de juros, podem ser impactadas pelas expectativas dos agentes de mercado, especialmente do setor financeiro. Um dos papéis da instituição é consultar essas previsões em relação à inflação, ao déficit governamental, ao PIB e outras variáveis econômicas.
Algumas previsões do mercado têm se distanciado da realidade. Em 2023, por exemplo, o mercado financeiro previu que a economia brasileira cresceria 2,64%, mas o país acabou superando essa estimativa, registrando um crescimento de 2,9%.
Galípolo deve adotar uma postura diferente da de Campos Neto. Segundo Faria, ao aceitar as projeções do mercado, a gestão anterior se mostrou equivocada. Ele acredita que Galípolo precisará moldar essas expectativas, influenciando o mercado, e não o contrário. "O agente mais relevante e influente deve ser o Banco Central", comenta o economista, ressaltando que, embora haja interação, a liderança do BC é essencial.
Creio que o mercado já conhece bem Galípolo, e não acredito que haverá grandes surpresas ou ruídos adicionais. A transição foi bastante cautelosa: ele começou no Ministério da Fazenda, depois assumiu como diretor do Banco Central, então não se pode dizer que foi algo inesperado.
André Perfeito, economista
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O Banco Central está em processo de implementar uma nova tecnologia: o Real Digital. Assim como ocorreu com o Pix, o BC está desenvolvendo o Digital Real X (DREX), uma moeda digital brasileira, regulamentada pela instituição, que funcionará como a versão digital do real.
Lançamento do Real Digital está previsto para ocorrer até o final de 2024. Apesar disso, sua plena consolidação acontecerá durante a gestão de Gabriel Galípolo à frente do Banco Central.
DREX estará integrado a outras inovações financeiras, como o Pix e o Open Banking. Para que essa nova tecnologia seja bem-sucedida, será importante que o BC mantenha uma comunicação clara com a população.
Mudanças climáticas
Brasil enfrenta série de eventos climáticos extremos que impactam setores econômicos importantes. As recentes enchentes no Rio Grande do Sul e a seca persistente, acompanhada de queimadas, afetam tanto a agricultura quanto a indústria, causando danos materiais e humanos.
Impacto inflacionário causado pela escassez de produtos será um dos desafios de Gabriel Galípolo. A falta de oferta, provocada por esses fenômenos, pode pressionar a inflação, e a manutenção da Selic em um patamar elevado, como tem ocorrido, pode não ser suficiente para conter a alta de preços. Além disso, essa política pode reduzir o consumo de alimentos pela população.
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