Preferem escala 4x3 a aumento salarial: empresa adota semana de 4 dias
Pensando em atrair e reter talentos, uma empresa em Portugal começou a oferecer um novo benefício em 2022: a escala 4x3. O tema entrou em discussão no Brasil depois que a deputada Erika Hilton (PSOL-SP) propôs o fim da escala 6x1.
Experiência portuguesa
O modelo foi adotado na RandTech Computing, empresa de software para seguradoras na cidade do Porto. Lá, o funcionário trabalha quatro dias na semana e tem uma folga a mais, além do sábado e do domingo —modelo que tem se popularizado na Europa.
Desde que a medida foi aplicada, em 2022, a empresa viu a produtividade da equipe aumentar em 20%. O relato é de João Barbosa, diretor de comunicação, marketing e estratégia digital da RandTech Computing. Outros benefícios notados pela empresa foram: retenção de talentos, maior sensação de pertencimento, funcionários mais participativos e crescimento.
A escala 4x3 foi pensada para oferecer mais benefícios aos funcionários, além de atrair novos talentos para a empresa. "Todo mundo ganha. Minha empresa aderiu a isso e nós só crescemos."
Algumas pessoas pensam que, quando trabalham menos, vão produzir menos, mas não é isso. Percebemos os funcionários mais descansados e criativos e, consequentemente, a produtividade cresce. É uma medida que pode ser boa para todo mundo. Não temos aquela ideia de que se é bom para o funcionário é ruim para o patrão. É bom para os dois lados.
João Barbosa, diretor de comunicação
O dia de folga também é flexível: o funcionário pode escolher quando pretende tirá-lo. A única questão é que isso precisa estar marcado no sistema interno da empresa. "Há empresas que colocam o dia fixo na sexta-feira, mas achamos que poderia ser uma má ideia porque a empresa acaba ficando parada por três dias, mas aqui não podemos parar. Então, preferimos que seja algo maleável", diz Barbosa.
Mudança aos poucos
Barbosa acredita que o modelo de escala não é para qualquer empresa. Há instituições que, na opinião dele, talvez não consigam se adaptar.
Comunicação é um ponto de atenção, caso a empresa decida aderir ao modelo 4x3, na opinião de Barbosa. "Isso precisa ser feito com muita comunicação envolvida, explicando aos funcionários o que está sendo feito e como vai funcionar. As pessoas precisam ser educadas sobre a mudança." Ele lembra que alguns funcionários pensaram que, com a diminuição de dias trabalhados, o salário diminuiria —mas isso não ocorreu. Por isso, ele reforça a importância de fazer uma transição organizada.
Outro ponto é a organização das folgas. "Ela precisa estar marcada para a equipe ver com quem vai trabalhar."
Precisamos tratar os funcionários como adultos, que são responsáveis e podem repassar os trabalhos uns aos outros, quando for necessário. João Barbosa
Barbosa conta que a empresa aumentou a equipe neste ano —atualmente, são 27 funcionários, com tendência para mais contratações. Foram seis novos clientes e três novos produtos lançados para o mercado.
A sede da companhia também mudou para um local maior, em uma região mais central na cidade do Porto. A empresa espera crescer, anualmente, em um ritmo próximo dos 50%.
É uma subida brutal. Somos um caso de sucesso e os quatro dias de trabalho tiveram impacto nisso. As pessoas se sentem mais valorizadas, com maior equilíbrio entre vida pessoal e profissional, e nossa produtividade cresce. João Barbosa
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Em 2023, a empresa fez uma pesquisa para entender a satisfação da equipe. Foram 14 perguntas, divididas por 5 seções, com 19 participantes. Veja os principais resultados:
78,9% dos funcionários disseram preferir a escala 4x3 a um aumento salarial;
Quase 90% respondeu que considerou a medida positiva;
Quase 80% disse que recomendaria a empresa a outra pessoa por causa do benefício;
Semana de 4 dias aparece entre os principais benefícios que os funcionários sentem que mais os valorizam;
Funcionários usam dia de folga para: realizar atividades burocráticas (26,3%), estudar (26,3%), ter tempo de lazer (15,8%) e passar mais tempo com a família (10,5%).
Assunto em destaque no Brasil
A PEC da deputada Erika Hilton (PSOL-SP) prevê o fim da escala 6x1. A proposta já atingiu número de assinaturas necessárias para tramitação no Congresso Nacional.
A proposta reduz de 44h para 36h por semana o limite máximo de horas semanais trabalhadas. Segundo Erika Hilton, o formato atual não permite ao trabalhador "estudar, se aperfeiçoar, se qualificar profissionalmente para mudar de carreira".
Número máximo de dias trabalhados por semana passaria a ser quatro. Hoje, a regra prevê que ninguém pode trabalhar mais que 8h por dia e 44h por semana — mas não proíbe que alguém trabalhe seis dias por semana, desde que não ultrapasse os limites previstos.
Pela proposta, salários não mudam. "A definição de valor salarial visa proteger o trabalhador de qualquer tentativa de redução indireta de remuneração", diz o texto.
No Brasil já tem
Medidas como a adotada pela empresa portuguesa também já foram aplicadas em algumas poucas empresas no Brasil que testaram o modelo em um projeto-piloto. O teste foi feito em parceria entre a FGV-EAESP e a 4 Day Week Global, dentre outras entidades. O piloto já foi realizado em diversos países. Um novo teste no Brasil está previsto para o início de 2025.
Participantes desse piloto relataram menos estresse e exaustão. Os dados do projeto mostram que 72,8% dos trabalhadores participantes relataram uma redução na exaustão frequente, enquanto 71,3% relataram mais energia para família e amigos. No trabalho, 80,7% relataram melhoria na criatividade e inovação e 52,6% viram melhora na capacidade de cumprir prazos.
Lideranças relataram melhora na produtividade. Houve também percepção de melhor qualidade no trabalho e redução nas faltas, além de ganhos na retenção de talentos. Ao final do piloto, 46,2% das empresas participantes disseram que manteriam a semana de quatro dias, enquanto 38,5% optaram por estender o piloto.
"Sextou" foi um dos desafios. Um dos desafios encontrados foi a manutenção da produtividade às quintas-feiras, para as empresas que adotaram a folga na sexta-feira. Em alguns casos houve a sensação de que a perda de produtividade que usualmente ocorre na sexta-feira foi transferida para a quinta-feira.
Garantir cobertura durante toda a semana também foi desafiador. A dificuldade apareceu principalmente em setores que requerem cobertura contínua, como atendimento ao cliente. "As empresas precisaram implementar escalas de trabalho diferenciadas e por vezes contratações adicionais. É difícil, contudo, identificar até que ponto as contratações ocorrem por aumento de demanda, notado por diferentes empresas, ou redução da jornada", diz o relatório do estudo.
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