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ENTREVISTA-Governo tem argumento "moral e técnico" para defender BPC e aposentadoria rural, diz Marinho

12/03/2019 17h13

Por Marcela Ayres e Ricardo Brito

BRASÍLIA (Reuters) - A equipe econômica vai defender as mudanças propostas na reforma da Previdência para o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e para a aposentadoria rural apesar dos pontos serem alvo de duras críticas dos parlamentares, afirmou nesta terça-feira o secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, argumentando estar confortável para o debate do ponto de vista fiscal e moral.

"Qualquer item que foi apresentado poderá ser modificado pelo Parlamento, mas a minha posição é defender o que nós apresentamos", disse o secretário especial em entrevista à Reuters, em seu gabinete.

"Nós estamos moralmente convictos que estamos apresentando o melhor para a sociedade e temos os argumentos técnicos para serem arguidos por ocasião da discussão da comissão especial para mostrar que estamos praticando justiça social e não estamos prejudicando ninguém", acrescentou.

Nos cálculos de Marinho, independentemente de eventuais atrasos, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que modifica as regras de acesso à aposentadoria deverá estar pronta para ir ao plenário da Câmara dos Deputados até o fim de maio.

O secretário minimizou o fato de a PEC não ter sequer começado a tramitar no primeiro colegiado da Câmara, uma vez que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) ainda não foi formalmente instalada.

Deputados já anunciaram que a PEC só vai andar após o envio pelo governo da proposta que trata do regime dos militares. O governo prevê que isso aconteça em 20 de março.

Marinho avalia que a PEC poderá ter o aval da CCJ, que vai discutir a legalidade do texto, na primeira semana de abril, recebendo o sinal verde da comissão especial, que analisará o mérito propriamente dito do texto, até o fim de maio, mesmo em um cenário de atrasos. Em seguida, já poderá ir ao plenário da Câmara.

"Em relação ao cronograma, nós temos condições de cumpri-lo", disse.

Para Marinho, o presidente Jair Bolsonaro --que intensificou nos últimos dias seu apoio à reforma nas redes sociais-- tem a "exata importância" que a reestruturação da Previdência tem para o sucesso do governo e da retomada econômica.

"Não é à toa que ele tem ocupado as redes sociais onde ele tem capilaridade, tem credibilidade com grande público dos brasileiros. Ele ganhou a eleição com 57 milhões de votos. Sem dúvida nenhuma, ele é o maior líder deste processo e qualquer ação dele nesse sentido será extremamente benéfica no sentido de galvanizar, mobilizar as pessoas em prol dessas mudanças tão necessária ao país", disse o secretário.

BPC E RURAL

Sobre o BPC, ele avaliou que ainda há incompreensão em relação ao que o governo quer. Hoje, o BPC garante a transferência de um salário mínimo aos que têm acima de 65 anos e aos deficientes de qualquer idade que comprovem condição de miserabilidade --renda familiar inferior a 1/4 do salário mínimo por pessoa.

Com a reforma, outro critério a ser cumprido para requerimento do benefício será um patrimônio familiar inferior a 98 mil reais. A partir daí, as regras de acesso continuarão as mesmas para os deficientes, mas mudarão para os idosos. Com 60 anos eles já serão elegíveis ao recebimento do BPC, mas de 400 reais. Somente a partir dos 70 anos o montante pulará para um salário mínimo, hoje em 998 reais.

Após o ministro da Economia, Paulo Guedes, ter avaliado em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo que o estabelecimento de idades diferentes para esse sistema fásico, de 62 e 68 anos, e um valor maior para o benefício inicial, de 500 ou 600 reais, faria a proposta passar no Congresso, Marinho disse que isso não estava na mesa da equipe econômica e que Guedes estava apenas reverberando o que o Parlamento colocara.

O secretário afirmou que dos atuais 4,5 milhões de beneficiários, 2,5 milhões são deficientes e continuarão usufruindo das mesmas regras. Para o restante, defendeu que a antecipação dos recursos, mesmo que a um valor menor, representará um ganho ao fim de todo o período considerado.

"Se você antecipar 400 reais para quem não ganha nada aos 60 anos cinco anos antes, a primeira providência é perguntar se ele quer ao invés de tutelá-lo porque muita gente tutela os idosos sem saber exatamente qual é o sentimento dele", disse.

"Depois, se você faz uma conta simples, você está antecipando o recurso, você tem que fazer a conta em valor presente. Dinheiro tem custo em qualquer lugar do mundo, não somos um país socialista. Se você colocar um juros de consignado, o mais barato do mercado, faça a conta e você vai ver que em 10 anos você vai estar ganhando", acrescentou.

Nesta terça-feira, a Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia calculou que, ao considerar as taxas médias do consignado, o valor presente da antecipação de 400 reais seria de 21.537,62 reais, abaixo dos 23.129,27 reais que seriam garantidos com a antecipação feita pelo governo.

Marinho também argumentou que a mudança abre a porta para uma separação necessária entre o que é Previdência e o que é assistência.

"Mais de 60 por cento dos aposentados do regime geral já se aposentam com um salário mínimo e contribuem pelo menos 15 anos para se aposentar aos 65 anos. Quem tem assistência pode não contribuir com nenhum centavo e ter o mesmo salário mínimo aos 65 anos", disse.

"A ideia foi separar os sistemas para não ter concorrência entre eles e evitar inclusive a fragilização do sistema que nós temos."

Falando sobre a aposentadoria rural, Marinho defendeu que o governo, ao estabelecer uma idade mínima de 60 anos para homens e mulheres, continua reconhecendo que quem trabalha no campo tem uma condição diferente, já que a idade mínima na PEC é de 65 para eles e 62 anos para elas para os trabalhadores em geral.

Atualmente, a idade mínima na aposentadoria rural é de 55 anos para mulheres e 60 anos para homens, com 15 anos de contribuição. Na PEC, essa contribuição sobe para 20 anos.

Para Marinho, a principal mudança que o governo lançará será tornar o cadastro rural "honesto e rígido", tirando dos sindicatos a atribuição de averbar o tempo de contribuição.

Com a Medida Provisória contra fraudes na Previdência, isso ficará a cargo de órgãos do governo, sendo que os trabalhadores terão um piso de 600 reais por ano para a contribuição familiar.

"Se você pegar 600 por ano para uma família de 4 pessoas, dá 150 reais por pessoa por ano. Se dividir por 12 meses, 12,50 reais. Se você multiplicar por 20 anos -- que é o que estamos propondo --, ele vai ter contribuído 3 mil reais. Ao se aposentar aos 60 anos, em 3 meses ele vai ter recebido os 3 mil reais. Qual a injustiça?", questionou Marinho.

"Nós continuamos dando a ele uma condição diferenciada. O que ele está contribuindo --que é o sistema previdenciário, não é assistencial, se fosse não tinha seguro acidente, doença, tem uma série de vantagens--, ele contribui por núcleo familiar não por indivíduo, é uma vantagem; se aposenta mais cedo, é uma outra vantagem", disse.

Em outra frente, Marinho lembrou que o IBGE identifica 6,5 milhões de brasileiros como trabalhadores rurais, mas os aposentados rurais são hoje 9,5 milhões de pessoas.

"Se você desconsiderar o fluxo, gente que tem 17, 30, 28 anos e não se aposentou ainda, você pode inferir de uma maneira grosseira de que metade dessas pessoas se aposentaram de forma fraudulenta", disse.

Segundo Marinho, a bancada ruralista segue resistente ao aumento da idade mínima para mulheres e ao fim da isenção da exportação para pequenos agricultores. Mas ele destacou que o governo continuará defendendo esses dois pontos "com argumentos técnicos e morais".

PEC DO PACTO FEDERATIVO

Durante a entrevista, Marinho também reiterou a importância da economia de pelo menos 1 trilhão de reais com a PEC da Previdência, e afirmou que a forte deterioração fiscal e o ambiente mais favorável para debate do tema abrem espaço para que a desidratação da proposta seja menor.

Após o ministro da Economia, Paulo Guedes, ter dito em entrevista que o governo avalia mandar uma outra PEC ao Congresso, tratando do pacto federativo e da repartição de recursos com Estados e municípios, Marinho destacou que essa é uma ideia em curso e que ainda não há definição a respeito.

"Essa é uma ideia que ele tem e que ele vai conversar com o Senado da República, com a Câmara Federal, com governadores que já consultou, com prefeitos, mas que não necessariamente haverá apresentação de uma PEC", disse.

"Até porque ele (Guedes) entende que isso tem que começar pelo Senado. Então se apresentarmos uma PEC, vai começar pela Câmara. Então aí sim haveria uma concomitância e uma concorrência. Então eu acredito que essa vai ser uma discussão que vai ser mais maturada, mais amadurecida", completou.

(Reportagem adicional de Jamie McGeever e Brad Haynes)