Guedes perde influência à medida que Bolsonaro assume rédeas dos gastos
Paulo Guedes enfrentou sua cota de desafios políticos desde que assumiu o ministério da Economia, mas raramente sua influência sobre a agenda econômica do governo esteve tão colocada em dúvida quanto agora.
Guedes viu sua proposta de reformulação de um programa de assistência social ser rejeitada publicamente pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e está no banco de trás nas negociações com congressistas sobre as reformas fiscais.
E, abominação máxima para ele, a corrente política parece estar indo na direção de um maior apoio governamental à economia no pós-pandemia.
Guedes já provou que céticos sobre sua força estavam errados, principalmente no ano passado, quando o debate no Congresso sobre a reforma da Previdência estava no auge e cresceram as especulações de que ele poderia simplesmente deixar o governo.
Ele se recuperou com mais vigor, otimista de que sua agenda de austeridade fiscal, desregulamentação e cortes no Estado estava progredindo e proporcionaria um crescimento econômico forte e sustentado.
A política pandêmica mudou as coisas, no entanto. Talvez para sempre.
"Este é o momento de maior isolamento para Guedes", disse Creomar de Souza, fundador da consultoria Dharma Political Risk and Strategy, com sede em Brasília. "A maior diferença agora é que toda a sua visão de controlar os gastos públicos parece ter sido derrotada no palácio presidencial."
Esta semana, Bolsonaro se distanciou de Guedes, criticando a forma como seu ministro da Economia planejava executar o "Renda Brasil", um programa de assistência social que o governo queria implementar em substituição ao popular "Bolsa Família".
O Ministério da Economia, de acordo com a imprensa local, propôs financiá-lo com cortes em aposentadorias e em benefícios para deficientes físicos, o que Guedes disse ser uma "distorção" da mídia.
Ventos Políticos
Na tentativa de conter as especulações em torno do futuro de Guedes no fim do mês passado, o Ministério da Economia divulgou nota afirmando que ele não renunciaria.
Seu favoritismo aos olhos dos investidores pode ser avaliada pela forma como os mercados brasileiros reagiram naquele dia às especulações sobre sua possível saída. O real atingiu a mínima em três meses, o Ibovespa recuou 1,5% e alguns juros futuros tiveram a máxima desde maio.
Bolsonaro e Guedes insistem que não há grande divergência entre eles e que ambos estão empenhados em reduzir o déficit e a dívida orçamentária recorde do Brasil para levar as finanças públicas de volta aos trilhos.
Mas Guedes, um fiscalista conservador formado em Chicago, teve suas asas cortadas por seu chefe populista, cujos índices de aprovação melhoraram com os bilhões de reais em auxílio fornecido aos mais pobres do Brasil para ajudá-los durante a crise econômica causada pela pandemia do coronavírus.
Guedes tem insistido que todos os gastos relacionados à pandemia devem encerrar em 31 de dezembro, e não há provisão para qualquer programa de assistência social adicional nas propostas de Orçamento de 2021. Mas o terreno político está mudando.
"Acho que Paulo Guedes já perdeu a guerra. A questão é se ele continua na frente ou abandona", disse um parlamentar sênior que trabalhou de perto com Guedes.
"O Congresso é reformista quando está focado nas reformas. Mas há muita pressão para os gastos públicos e não vejo mais muito entusiasmo por reformas", disse ele.
Perspectiva prejudicial
Esse não é um rompimento repentino. Em abril, Guedes se ausentou do lançamento de um programa de investimento em infraestrutura, conhecido como "Pró-Brasil", que contava com as impressões digitais dos generais do Exército do gabinete de Bolsonaro, não da equipe econômica.
Uma proposta de reforma administrativa anunciada este mês, com medidas para cortar os gastos do setor público e que daria ao presidente novos poderes para definir extinção de cargos e órgãos, também carrega as marcas tanto de Bolsonaro quanto de Guedes.
Segundo Guedes, o projeto vai economizar pelo menos 300 bilhões de reais em dez anos.
Mas o ministro tem sido conhecido por se enganar para o lado otimista das estimativas: de previsões de crescimento econômico a previsões de trilhões de reais de investimento e gastos do setor privado à espera de serem liberados assim que as condições forem adequadas.
O problema é que, do ponto de vista fiscal, as condições não parecem estar certas há algum tempo.
"As perspectivas fiscais continuam piorando", escreveram economistas do Citi em uma nota esta semana, emitindo previsões fiscais mais difíceis.
Eles agora veem o déficit orçamentário do governo, excluindo o pagamento de juros, chegando a 948 bilhões de reais, ou 13,7% do PIB este ano, maior do que as previsões do governo de 866 bilhões, ou 12,1% do PIB.
Bolsonaro também pediu recentemente ao Congresso que retirasse o pedido de urgência da reforma tributária encaminhada em julho. Guedes tem sido um defensor da simplificação do complexo sistema tributário brasileiro.
Segundo economistas do Citi, o Congresso pode não aprovar essas reformas até o ano que vem, quando as finanças públicas estarão ainda piores e os desafios de Guedes, ainda maiores.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.