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Ex-secretários do Tesouro dizem que pacote de Haddad é sinal positivo, mas não estabiliza dívida

Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em coletiva de imprensa em Brasília - 12.jan.2023 - Adriano Machado/Reuters
Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, em coletiva de imprensa em Brasília Imagem: 12.jan.2023 - Adriano Machado/Reuters

Bernardo Caram

Em Brasília

13/01/2023 17h23Atualizada em 13/01/2023 18h12

O conjunto de medidas anunciadas nesta semana pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para reduzir o déficit fiscal representa um sinal positivo do novo governo ao indicar preocupação com as contas públicas, mas as iniciativas são insuficientes para estabilizar a dívida pública, afirmaram à Reuters os ex-secretários do Tesouro Nacional Jefferson Bittencourt e Paulo Valle.

A avaliação dos ex-secretários se contrapõe à declaração feita na quinta-feira pelo atual secretário do Tesouro, para quem o conjunto de medidas tem capacidade de manter a dívida bruta do governo em trajetória sustentável ao redor de 75% do PIB, não ultrapassando 80%.

O economista da ASA Investments Jeferson Bittencourt, que foi secretário do Tesouro em 2021, afirmou que, de partida, é positivo o sinal dado pela nova equipe econômica de preocupação com as contas públicas.

"Ante o cenário de completa incerteza que havia sobre a questão fiscal, a simples iniciativa de apresentar um conjunto de medidas já é algo positivo. Era fundamental o governo mostrar com medidas o quão inaceitável considerava o déficit primário projetado para 2023 com a PEC da Transição", disse.

No entanto, Bittencourt apontou fatores de atenção. Após Haddad estimar que o saldo final das medidas deve levar o resultado primário do governo a um déficit entre 0,5% e 1% do PIB em 2023, o economista sugeriu que esse patamar ainda exigirá um ajuste fiscal significativo para colocar as contas no lugar.

Pelos cálculos do economista, se o rombo fechar o ano em cerca de 1% do PIB, o esforço fiscal para evitar que a dívida pública tenha trajetória de crescimento será superior a 3,5% do PIB, um ajuste relevante.

Bittencourt acrescentou que o pacote anunciado na quinta-feira, com incentivos para renegociação de dívidas e medidas que geram ganhos extraordinários, pode ser considerado ?low hanging fruits?, uma referência a objetivos relativamente fáceis de serem cumpridos.

"A maior parte das medidas é neutra do ponto de vista de popularidade (do governo) ou facilitam a vida do contribuinte que quer renegociar dívidas. Os 3,5% do PIB restantes de ajuste exigirão muito mais capital político do governo. Para ter certeza de que o ajuste está no caminho certo, é preciso que o governo mostre que está disposto a empenhar esse capital político", afirmou.

O primeiro conjunto de medidas apresentado por Haddad traz um plano de ajuste de até 242,7 bilhões de reais nas contas de 2023, o que faria o resultado primário reverter o déficit previsto atualmente e fechar o ano no azul.

Haddad mencionou, porém, a possibilidade de haver frustração em parte das iniciativas e fez uma previsão mais modesta, afirmando que o resultado primário do governo central de 2023 deve ficar em déficit de 0,5% a 1% do PIB — a atual previsão é de déficit de 2,16% do PIB. Segundo ele, o rombo do ano em valores monetários pode ser inferior a 100 bilhões de reais.

Secretário do Tesouro no último ano da gestão de Paulo Guedes à frente do Ministério da Economia e auditor federal na secretaria há 26 anos, Paulo Valle disse à Reuters ser importante o recado passado pela nova equipe de governo.

"Mudou o discurso de dezembro (durante a campanha eleitoral) para janeiro. Eles começam a dar um norte para o fiscal, isso é ótimo", disse.

Valle ponderou que o pacote não prioriza cortes de gastos e que a maior parte das medidas é pelo lado das receitas, sendo que uma parcela delas já estava no gatilho na gestão anterior, como a retomada da tributação sobre combustíveis e o uso de recursos esquecidos por trabalhadores no Pis/Pasep.

Na avaliação do ex-secretário, do pacote de 242 bilhões de reais anunciado, cerca de 100 bilhões de reais em economia são factíveis, restando incerteza sobre o restante.

Para ele, mesmo em cenário otimista, a dívida pública deve engatar uma trajetória de crescimento se o novo governo não fizer mudanças estruturais que melhorem os quadros das contas públicas.

Atualmente, a dívida bruta do governo está em 74,5% do PIB, segundo dados de dezembro do Banco Central.

Valle afirmou que um plano para melhorar as contas públicas precisará passar por cortes de despesas ou criação de receitas permanentes, como a taxação de dividendos, que foi proposta pela gestão anterior e também está na pauta de economistas do PT.

"Tem que diminuir o déficit, tem que cortar despesa, melhorar o cenário para cair juros e voltar a crescer", disse.