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REPORTAGEM

Por que as passagens aéreas estão tão caras agora?

Passagens aéreas acumulam alta de 123,26% até junho de acordo com o IPCA-15 - Getty Images
Passagens aéreas acumulam alta de 123,26% até junho de acordo com o IPCA-15 Imagem: Getty Images

Alexandre Saconi

Colaboração para o UOL, em São Paulo

09/07/2022 04h00

O preço das passagens aéreas no Brasil disparou em um ano. A inflação acumulada dos bilhetes nos 12 meses encerrados em junho foi de 122,4% segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). A média geral da inflação no mesmo período foi de 11,89%.

As empresas áreas dizem que houve aumento de custos e muita procura de passageiros no pós-pandemia.

Peso dos combustíveis

Entre os itens que compõem a passagem, o principal é o combustível, no caso, o querosene de aviação (QAV), que acumulou alta de 70,6% em 2022 segundo levantamento da Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas) a partir de dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo).

Em 2021, a alta registrada foi de 91,9% em comparação com o ano anterior, de acordo com dados disponibilizados pela Anac (Agência Nacional de Aviação Civil).

Segundo a associação, o combustível compõe cerca de 40% do valor de um bilhete aéreo no país, enquanto a média mundial gira em torno de 20% a 24%.

Em conjunto com o preço mais elevado do petróleo no mercado internacional, é preciso levar em conta a alta do dólar nos últimos anos.

Setor critica política de preços da Petrobras

Para Eduardo Sanovicz, presidente da Abear, a disparidade na alta dos preços dos combustíveis recai com maior força sobre a aviação em um momento de retomada do setor.

"O preço [das passagens] subiu tanto porque a Petrobras adota uma política de paridade de preços com o mercado internacional, chamada de PPI (Preços de Paridade de Importação). Nós pagamos no Brasil o combustível com o valor 100% em dólar. Enquanto isso, 90% do querosene de aviação consumido no Brasil é produzido por aqui mesmo", diz Sanovicz.

A política de PPI aplicada pela Petrobras calcula o preço dos combustíveis com base no mercado internacional, resultando em uma maior oscilação nos valores pagos nas bombas.

Retomada gera pressão

Para Joelson Sampaio, professor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, dois componentes principais explicam o valor elevado das passagens hoje. Um deles é a própria alta nos combustíveis, que pressiona os custos.

O outro componente é o interesse dos passageiros. "O setor que sofreu muito com a pandemia, com restrições de mobilidade, entre outros aspectos. Agora as pessoas voltaram a viajar e estão utilizando mais esse meio de transporte", diz Sampaio.

"Se há uma procura maior, as empresas vão recompor suas margens, pois sofreram muito na pandemia. Como as pessoas estão pagando, as empresas vão extrair esse excedente", afirma o professor da FGV.

Quanto à política de preços da Petrobras, Sampaio discorda que mudar essa política seja a melhor alternativa no momento.

"A política de paridade de preços da Petrobras também afeta diretamente o preço dos combustíveis, mas não vejo a mudança como solução imediata para o problema. Talvez a criação de subsídios seja uma alternativa, mas alterar a política de preços eu vejo como sendo algo arriscado", diz Sampaio.

Petróleo caro no mundo

Apesar da relativa independência na produção de querosene de aviação no Brasil, as empresas têm de acompanhar o valor pago no mercado mundial. Segundo o IBP (Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás), mundo afora, o valor das passagens está elevado em decorrência da retomada da demanda. As empresas não estando preparadas para suprir todo o mercado.

Ao mesmo tempo, o combustível dos aviões também está mais caro devido a uma restrição na oferta de derivados de petróleo, como ocorre com o diesel. O instituto ainda afirma que, no Brasil, o efeito se acentua pela taxa de câmbio em relação ao dólar.

Para contornar esse problema, o IBP acredita ser necessário aumentar os investimentos em infraestrutura e na cadeia de suprimentos para baratear o custo dos combustíveis e, consequentemente, as passagens.

O custo dos insumos nos preços é sempre um dos componentes, mas o preço da passagens é livre e aumenta conforme a procura, diz o instituto.

ICMS e processos judiciais também atrapalham

Outros dois fatores permanentes contribuem para a alta do custo da passagem no Brasil: o ICMS e a judicialização.

O imposto estadual sobre os combustíveis é uma prática que ocorre apenas em voos nacionais. Um voo de São Paulo para Recife paga ICMS, mas para Buenos Aires (uma distância similar), não. Isso deixa os voos nacionais mais caros.

A judicialização também interfere negativamente no preço das passagens no país, segundo Dany Oliveira, diretor-geral da Iata (Associação Internacional do Transporte Aéreo) no Brasil.

"O Brasil é recordista em processos contra companhias aéreas, com prejuízos para o contribuinte e o consumidor. Dados de 2019, mostram uma ação para cada 1,35 voo operado no Brasil. Já nos EUA, a estatística é de uma ação judicial para cada 7.883 voos", diz Oliveira.