O acidente ocorrido no último domingo (9) no aeroporto de Congonhas acirrou os ânimos entre diferentes ramos da aviação. Um jato de uma empresa saiu da pista após o pneu estourar no pouso e parou rente ao barranco na lateral da área de taxiamento.
Quais são as propostas sobre o aeroporto? De um lado, a Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas) defende a restrição de aviões de pequeno porte na pista principal do aeroporto, principalmente em horários de pico.
De outro lado, associações do setor, de proprietários de aeronaves e pilotos se opõem à proposta, e defendem que a vocação do aeroporto é a aviação de negócios e regional.
O que vai acontecer na prática? Em 29 de setembro, a Abear já havia enviado um ofício à Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária), que administra Congonhas, recomendando essa restrição. A partir disso, a estatal convocou uma reunião com os agentes envolvidos nas operações no local para a última sexta-feira (14).
No encontro, foi definido que serão desenvolvidos estudos para aprimorar o compartilhamento das pistas de Congonhas, além da criação de um comitê de crise com todos os envolvidos para atuar nas eventuais ocorrências no aeroporto.
Quais os interesses em jogo? Mas, afinal, a operação de aviões de menor porte deve ficar ou sair de Congonhas?
"O problema de fundo é qual é o número adequado de operações que devem ser feitas por hora naquele aeroporto, considerando que você tem imprevistos, como incidentes, questões meteorológicas, pássaros, entre outros", diz André Castellini, sócio da Bain, consultoria do setor aéreo.
Segundo o executivo, não tem nada a ver com questão de segurança, pois o histórico de acidentes envolvendo a aviação executiva é impecável.
"Esses aviões menores podem até operar em condições melhores do que os aviões de grande porte. Por isso, a operação da aviação executiva não tem a ver com a segurança, mas com a aviação comercial querer ampliar as suas operações em Congonhas", diz Castellini.
É possível conciliar as duas operações? Marcus Quintella, diretor da FGV Transportes, também acredita na coexistência das duas aviações ao mesmo tempo no aeroporto. "É uma situação muito controvertida, pois a pressão da aviação comercial é grande para retirar a aviação geral de Congonhas, mas existe uma grande demanda pela aviação executiva e entendo que possa haver uma conciliação para que sejam mantidas ambas as operações", afirma.
"O recente acidente foi um caso isolado, e os problemas causados foram decorrentes do protocolo atual para a retirada da aeronave. Isso deve ser revisto", diz Quintella.
Os aviões pequenos têm para onde ir? O diretor da FGV Transportes também nega que outros aeroportos próximos consigam absorver essa demanda do local. "Congonhas é estratégico para a aviação executiva, e os aeroportos de Campo de Marte e SP Catarina não conseguirão substituir totalmente Congonhas. Esses aeroportos são complementares. A aviação comercial é mais rentável para o aeroporto, mas a aviação executiva traz boa sinergia para toda a operação aeroportuária de Congonhas", afirma o professor.
Como são as regras hoje? Congonhas é um aeroporto que possui slots, ou seja, autorizações para pouso e decolagem em horários específicos. Atualmente, ele opera com 41 slots por hora, sendo que oito são exclusivos para aviões pequenos e os outros 33 são para linhas aéreas com aviões de grande porte.
Ou seja, 19,5% das operações podem ser realizadas pela aviação geral, também chamada de executiva. Quando um avião de linha aérea não opera em um dos slots, outros aviões podem ser autorizados a voar naquele horário, mas essa liberação não é regra.
Aviões menores costumam utilizar a pista auxiliar de Congonhas, que é menor e não comporta aviões de grande porte. Ocasionalmente, eles são autorizados a pousar na pista principal, como aconteceu no domingo.
Aviões de pequeno porte operam há décadas: O aeroporto de Congonhas é central e um dos mais lucrativos para as empresas. Conviver com outros ramos da aviação, principalmente a aviação de negócios, é natural ao local desde muitos anos antes desse debate.
Diversos hangares de empresas de táxi aéreo de grande porte operam há décadas no aeroporto. Alguns exemplos de empresas do ramo que estão ali atualmente são Tam Aviação Executiva, Voar Aviation e Líder Aviação.
Guarulhos tem aviões pequenos? O aeroporto de Guarulhos (SP) possui um terminal de aviação executiva, com a operação restrita em horários de pico. Como comparação, o local já transportou mais de 21 milhões de passageiros até o fim de agosto de 2022, enquanto Congonhas ultrapassou pouco mais de 11 milhões de passageiros no mesmo período.
Em Londres (Inglaterra), o aeroporto de London City, em plena região central da cidade, opera tanto voos regulares como aviões particulares e de táxi aéreo.
Nos EUA, o aeroporto de Dallas Forth Worth, um dos mais movimentados do país, também tem uma forte movimentação da aviação geral, com mais de 51 mil pousos e decolagens de aviões particulares e de táxis aéreos em 2022 até o momento.
Demora na retirada do avião: Flavio Pires, diretor-geral da Abag (Associação Brasileira de Aviação Geral), diz que muitas coisas poderiam ter sido feitas para mitigar o problema de domingo, inclusive a retirada mais rápida da aeronave.
"Mas o sistema legal não dá garantia para que operador do aeroporto retire a aeronave por conta própria sem correr riscos de sofrer uma sanção jurídica por isso, embora a legislação preveja sua responsabilidade também", diz Pires.
"O debate tem de ser feito de maneira mais aprofundada", afirma o diretor-geral da Abag.
Sobre isso, ele questiona por que o local não foi liberado antes, por que as operações não foram retomadas utilizando outras vias de taxiamento para chegar e sair da pista principal, entre outros pontos.
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