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Nem técnicos entendem renda da poupança, diz matemático que propõe mudanças

Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Téo Takar

Colaboração para o UOL, em São Paulo

01/08/2017 04h00

Já ouviu falar em Taxa Referencial ou TR? Ela está presente no rendimento da poupança, do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) e nas prestações da casa própria. A poupança, por exemplo, rende 0,5% ao mês (ou 6,17% ao ano) mais a TR. E como se calcula a TR?

Absolutamente ninguém sabe. Nem os técnicos. Muito menos a população. Não faz sentido que a poupança, o investimento mais popular desse país, tenha um cálculo tão complicado, que praticamente ninguém sabe fazer.

A opinião é do professor José Dutra Vieira Sobrinho, especialista em matemática financeira e vice-presidente da Ordem dos Economistas do Brasil (OEB).

Simplificar a conta, sem alterar o rendimento

Um projeto lançado pelo economista na última semana, com apoio da OEB, propõe mudar o cálculo do rendimento da poupança. O professor quer discutir a ideia com outros economistas e a sociedade em geral e, depois, apresentar ao Ministério da Fazenda um modelo mais simples de cálculo.

A ideia, segundo Dutra, não é fazer a poupança render mais nem menos. "A proposta não é para alterar o rendimento. Ela continuará rendendo, na média, a mesma coisa que é hoje. A palavra de ordem é descomplicar, dar transparência ao cálculo", afirma.

Cálculo diário é inútil, diz professor

Um dos pontos defendidos por Dutra é a redução da tabela de cálculo da poupança. Em vez de um índice para cada "aniversário" da caderneta, ou seja, para cada dia do ano, ele afirma que seria suficiente uma taxa que valesse para todos os dias do mês.

"Se você pegar as tabelas de correção da poupança, vai ver que a diferença de rendimento entre o primeiro e o último dia do mês não passa de 0,01%. Ou seja, é desprezível. Seria muito mais prático ter um índice que valesse para todo o mês. Para que calcular mais de 300 taxas por ano? É um complicador desnecessário."

Se a proposta vingar e for bem aceita, talvez outras peculiaridades brasileiras possam ser discutidas no futuro e simplificadas. "Há uma série de coisas que só existem no Brasil. Uma delas é o cálculo de rendimento de aplicações por dias úteis, que considera 252 dias. No mundo, o cálculo é feito considerando os 365 dias. É preciso descomplicar certos conceitos."

Quer saber como é o cálculo da TR hoje?

Há toda uma explicação técnica por trás do cálculo da TR. A Resolução 2.809, publicada em 2000 pelo Banco Central, determina que ela seja obtida a partir da Taxa Básica Financeira (TBF), que consiste na média ponderada das taxas mensais de juros pagas nas aplicações em CDB pelas 30 maiores instituições financeiras do país, expurgada pela aplicação do chamado "redutor".

Os cálculos da TR e do redutor, representado pela letra "R", seriam processados com base nas seguintes fórmulas:

TR = (1+TBF)/R - 1

R = a + b × TBF

Os parâmetros "a" e "b" foram fixados pelo Conselho Monetário Nacional (CMN). O primeiro foi arbitrado em 1,005, e o parâmetro "b" assume diversos valores em função da taxa Selic (taxa básica de juros), conforme a tabela abaixo:

"Embora os valores do parâmetro 'b' sejam definidos em função da taxa Selic, o cálculo da TR leva em conta o valor da TBF, que é publicada diariamente pelo Banco Central", diz Dutra.

Parte da regra foi modificada em 2012 para incluir a possibilidade de taxa Selic abaixo de 10%, que não estava prevista originalmente na resolução feita em 2000. Além disso, foi definido que, quando a Selic for igual ou inferior a 8,5%, o rendimento da poupança deixa de ser vinculado à TR e passa a representar 70% da Selic vigente mais juros de 0,5% ao mês.

Qual o cálculo proposto?

Para o professor Dutra, a TR não precisa ser calculada com base em um critério tão sofisticado, bastaria usar como base de cálculo a relação poupança/TBF, que corresponde ao complemento dos valores do parâmetro "b". Assim, o complemento do parâmetro 0,48 é 0,52 (ou 52%). O complemento de 0,20 é 0,80 (ou 80%). Seguindo esse raciocínio, Dutra chegou à seguinte tabela:

Como a TBF é uma média das taxas mensais de CDBs praticadas no mercado, seu valor tende a ficar muito próximo ao da Selic.

"O rendimento da poupança pode ser obtido de forma bem simples, como um percentual da taxa Selic. A diferença no rendimento mensal ocorre na terceira ou quarta casa decimal. Algo desprezível."

Rendimento calculado a partir da Selic

O projeto que o professor Dutra pretende levar ao governo prevê que o rendimento da poupança deixe de ser calculado com base na TBF e passe a ser feito em função da Selic vigente, como já prevê a lei hoje, quando a taxa Selic fica igual ou inferior a 8,5%.

"Nossa proposta é que essa proporção poupança/Selic seja estendida às demais faixas (acima de 8,5%) e que haja uma única taxa de rendimento da poupança para cada Selic vigente, independentemente do dia em que o depósito foi feito na poupança."

Veja na tabela abaixo como ficaria a relação poupança/Selic, na proposta feita pelo professor: