Setores que 'seguraram' PIB de 2014 têm perspectivas de queda
Júlia Dias Carneiro
Da BBC Brasil no Rio de Janeiro
Setor de consumo das famílias foi um dos que ajudou o PIB a não entrar em recessão
O consumo das famílias e o setor de serviços foram algumas das poucas áreas da economia que tiveram um desempenho positivo no ano passado, contribuindo para que o PIB de 2014 ficasse ligeiramente acima de zero. Mas o resultado favorável dificilmente se manterá em 2015, de acordo com analistas ouvidos pela BBC Brasil.
Os dados do PIB divulgados nesta sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o país cresceu 0,1% em 2014, evitando, por uma margem ínfima, cruzar a fronteira da recessão.
Na visão dos analistas, no entanto, a tendência de desaceleração deve persistir, o que pode tornar uma recessão neste ano inevitável.
De acordo com os dados do IBGE, o consumo das famílias teve uma expansão de 0,9% no ano passado, enquanto o setor de serviços cresceu 0,7% no período. Apesar de ter havido uma pequena margem de crescimento, estes foram os menores índices de expansão em mais de uma década.
Por outro lado, as retrações mais significativas foram no volume de investimentos que caiu 10 pontos percentuais, atingindo 4,4% negativos e da indústria, que teve recuo de 1,2% no ano passado.
Carlos Thadeu de Freitas Gomes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio, diz que o consumo das famílias vinha segurando o PIB tendo crescido em média 4,3% entre 2003 em 2013.
Ainda que o avanço de 0,9% no ano passado tenha sido mínimo, ajudou a manter o PIB positivo. Mas esse modelo está se esgotando.
"A economia só vai voltar a crescer se os investimentos voltarem a crescer, porque o consumo da família, que esquentou o PIB nos últimos anos, tende a ficar mais baixo agora que as famílias estão enfrentando situações mais difíceis. O desemprego começa a aumentar e a renda real deve começar a crescer menos", afirma Gomes, que é ex-diretor do Banco Central.
O economista Mauro Rochlin, professor dos MBAs da Fundação Getúlio Vargas (FGV), diz que um resultado perto de zero era esperado, mas considera que o atual cenário de estagnação tem perspectiva negativa.
"O problema é que quando observamos a variação do PIB por trimestre, vemos que a desaceleração é consistente. Ou seja, ainda que não estejamos em recessão, a desaceleração é flagrante, e a expectativa para este primeiro trimestre é de um número negativo", considera.
'Alento temporário'
Diante da crise política e econômica que o governo Dilma atravessa, analistas consideram que o fato de o número ter sido acima de zero, ainda que por um mero décimo, poupa a presidente do estardalhaço negativo que seria gerado por uma recessão técnica.
'Ainda que não estejamos em recessão, a desaceleração é flagrante', diz economista.
"Em vista de um quadro mais pessimista, 0,1% pode até ser comemorado. Ainda que o resultado seja pífio, para o governo pode ser um certo alívio em termos de marketing político", diz Rochlin.
"É um alento mas temporário, porque neste ano o crescimento vai ser negativo", diz Gomes. "Mas a economia brasileira está entrando nos trilhos, e o PIB daqui a alguns anos vai refletir isso."
Diretor para América Latina da consultoria Eurasia Group, João Augusto de Castro Neves diz que o número é emblemático por permitir fechar o PIB de todo o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.
A média anual de expansão do PIB foi de 2,1% em seu governo, contra 4% no governo Lula e 2,3% no de Fernando Henrique Cardoso.
"Tem um significado ruim, simbólico, de que ela não conseguiu manter o bom momento do segundo mandato de Lula", aponta.
Novo método
O PIB mede a produção de bens e serviços no país, subtraídos os gastos com insumos e mão de obra, entre outros.
Os números do IBGE indicam que o PIB alcançou R$ 5,52 trilhões em 2014. O PIB per capita sofreu queda, recuando 0,7% e passando a R$ 27.229.
PIB per capita sofreu queda em 2014
Os dados são baseados em uma nova fórmula adotada pelo IBGE, seguindo o padrão internacional para cálculo de contas nacionais recomendado pelas Nações Unidas em 2008. Países como EUA, México e França já adotaram o novo padrão.
A adoção do novo método atrasou em um mês a divulgação do PIB do quarto trimestre de 2014. As contas nacionais foram recalculadas seguindo o novo padrão até 1995, e tiveram pequenas variações ano a ano.
Investimento x confiança
Uma das principais mudanças no novo cálculo é incorporar itens antes considerados "despesas" à categoria de "investimentos" como pesquisa, inovação, compra de equipamentos militares e desenvolvimento de softwares.
Porém, mesmo com os novos itens incorporados, a queda nos investimentos foi brusca, despencando de 6,1% de crescimento em 2013 para 4,4% de queda em 2014.
O recuo é atribuído à reduções na produção interna, na importação de bens de capital e ao desempenho negativo da construção civil em 2014.
Para Carlos Thadeu de Freitas Gomes, a queda não foi surpreendente, porque investimentos dependem em grande parte de confiança.
"No ano passado tivemos uma série de incertezas, com o período das eleições, as dúvidas sobre o modelo econômico que estava se seguindo, o déficit do governo aumentando. Isso fez os investimentos terem uma queda muito importante", diz Gomes.
Acostumado a orientar empresas do mundo todo sobre investimentos no Brasil, João Augusto de Castro Neves não acredita que a percepção sobre o Brasil se torne mais favorável no curto prazo.
"2015 vai ser um ano difícil. Ainda temos uma lista grande de notícias negativas no horizonte, as notícias vindo da crise da Petrobras, do Congresso, o risco de racionamento", considera.
"Ano que vem o nevoeiro da incerteza começa a se dissipar, mas acho que 2015 continua com essa sombra da dúvida."
Da BBC Brasil no Rio de Janeiro
Setor de consumo das famílias foi um dos que ajudou o PIB a não entrar em recessão
O consumo das famílias e o setor de serviços foram algumas das poucas áreas da economia que tiveram um desempenho positivo no ano passado, contribuindo para que o PIB de 2014 ficasse ligeiramente acima de zero. Mas o resultado favorável dificilmente se manterá em 2015, de acordo com analistas ouvidos pela BBC Brasil.
Os dados do PIB divulgados nesta sexta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o país cresceu 0,1% em 2014, evitando, por uma margem ínfima, cruzar a fronteira da recessão.
Na visão dos analistas, no entanto, a tendência de desaceleração deve persistir, o que pode tornar uma recessão neste ano inevitável.
De acordo com os dados do IBGE, o consumo das famílias teve uma expansão de 0,9% no ano passado, enquanto o setor de serviços cresceu 0,7% no período. Apesar de ter havido uma pequena margem de crescimento, estes foram os menores índices de expansão em mais de uma década.
Por outro lado, as retrações mais significativas foram no volume de investimentos que caiu 10 pontos percentuais, atingindo 4,4% negativos e da indústria, que teve recuo de 1,2% no ano passado.
Carlos Thadeu de Freitas Gomes, economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio, diz que o consumo das famílias vinha segurando o PIB tendo crescido em média 4,3% entre 2003 em 2013.
Ainda que o avanço de 0,9% no ano passado tenha sido mínimo, ajudou a manter o PIB positivo. Mas esse modelo está se esgotando.
"A economia só vai voltar a crescer se os investimentos voltarem a crescer, porque o consumo da família, que esquentou o PIB nos últimos anos, tende a ficar mais baixo agora que as famílias estão enfrentando situações mais difíceis. O desemprego começa a aumentar e a renda real deve começar a crescer menos", afirma Gomes, que é ex-diretor do Banco Central.
O economista Mauro Rochlin, professor dos MBAs da Fundação Getúlio Vargas (FGV), diz que um resultado perto de zero era esperado, mas considera que o atual cenário de estagnação tem perspectiva negativa.
"O problema é que quando observamos a variação do PIB por trimestre, vemos que a desaceleração é consistente. Ou seja, ainda que não estejamos em recessão, a desaceleração é flagrante, e a expectativa para este primeiro trimestre é de um número negativo", considera.
'Alento temporário'
Diante da crise política e econômica que o governo Dilma atravessa, analistas consideram que o fato de o número ter sido acima de zero, ainda que por um mero décimo, poupa a presidente do estardalhaço negativo que seria gerado por uma recessão técnica.
'Ainda que não estejamos em recessão, a desaceleração é flagrante', diz economista.
"Em vista de um quadro mais pessimista, 0,1% pode até ser comemorado. Ainda que o resultado seja pífio, para o governo pode ser um certo alívio em termos de marketing político", diz Rochlin.
"É um alento mas temporário, porque neste ano o crescimento vai ser negativo", diz Gomes. "Mas a economia brasileira está entrando nos trilhos, e o PIB daqui a alguns anos vai refletir isso."
Diretor para América Latina da consultoria Eurasia Group, João Augusto de Castro Neves diz que o número é emblemático por permitir fechar o PIB de todo o primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff.
A média anual de expansão do PIB foi de 2,1% em seu governo, contra 4% no governo Lula e 2,3% no de Fernando Henrique Cardoso.
"Tem um significado ruim, simbólico, de que ela não conseguiu manter o bom momento do segundo mandato de Lula", aponta.
Novo método
O PIB mede a produção de bens e serviços no país, subtraídos os gastos com insumos e mão de obra, entre outros.
Os números do IBGE indicam que o PIB alcançou R$ 5,52 trilhões em 2014. O PIB per capita sofreu queda, recuando 0,7% e passando a R$ 27.229.
PIB per capita sofreu queda em 2014
Os dados são baseados em uma nova fórmula adotada pelo IBGE, seguindo o padrão internacional para cálculo de contas nacionais recomendado pelas Nações Unidas em 2008. Países como EUA, México e França já adotaram o novo padrão.
A adoção do novo método atrasou em um mês a divulgação do PIB do quarto trimestre de 2014. As contas nacionais foram recalculadas seguindo o novo padrão até 1995, e tiveram pequenas variações ano a ano.
Investimento x confiança
Uma das principais mudanças no novo cálculo é incorporar itens antes considerados "despesas" à categoria de "investimentos" como pesquisa, inovação, compra de equipamentos militares e desenvolvimento de softwares.
Porém, mesmo com os novos itens incorporados, a queda nos investimentos foi brusca, despencando de 6,1% de crescimento em 2013 para 4,4% de queda em 2014.
O recuo é atribuído à reduções na produção interna, na importação de bens de capital e ao desempenho negativo da construção civil em 2014.
Para Carlos Thadeu de Freitas Gomes, a queda não foi surpreendente, porque investimentos dependem em grande parte de confiança.
"No ano passado tivemos uma série de incertezas, com o período das eleições, as dúvidas sobre o modelo econômico que estava se seguindo, o déficit do governo aumentando. Isso fez os investimentos terem uma queda muito importante", diz Gomes.
Acostumado a orientar empresas do mundo todo sobre investimentos no Brasil, João Augusto de Castro Neves não acredita que a percepção sobre o Brasil se torne mais favorável no curto prazo.
"2015 vai ser um ano difícil. Ainda temos uma lista grande de notícias negativas no horizonte, as notícias vindo da crise da Petrobras, do Congresso, o risco de racionamento", considera.
"Ano que vem o nevoeiro da incerteza começa a se dissipar, mas acho que 2015 continua com essa sombra da dúvida."
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