Cão pastor afasta onças e põe ordem nos rebanhos; conheça as raças
Cachorros correndo atrás de bois, vacas e ovelhas numa fazenda nem sempre estão de brincadeira. Pode ser trabalho.
Criadores brasileiros de gado e de ovelhas têm percebido que cães pastores são parceiros valiosos para conduzir e reunir animais no campo. Em algumas fazendas, esses cães são treinados para cuidar de até cem animais.
Além de colocar ordem nos rebanhos, eles podem ajudar a diminir prejuízos nas propriedades, afastando predadores -como jaguatiricas e pequenas onças- e até ladrões.
Entre as raças de cães que mais têm instinto para o trabalho de pastoreio está o border collie. De porte médio e originário da Grã-Bretanha, ele conduz o tempo todo os animais do rebanho apenas impondo sua presença.
“Ele só vai latir ou mordiscar se for necessário. Caso contrário, 'toca' os animais em silêncio, apenas cercando. Ele conduz o rebanho com o olhar, basicamente”, afirma o treinador e vice-presidente da Appas (Associação Paulista de Pastoreio), Leandro José dos Santos, que treina cães pastores há dez anos.
O “mordiscar” a que Santos se refere não envolve uma mordida, efetivamente, muito menos causa ferimento aos animais atingidos; é apenas um alerta. “O cão corrige o caminho do animal com esta técnica só se ele não obedecer ao olhar, mas isso não chega a machucar o boi ou a ovelha”, afirma.
Há raças de cães apropriadas ao pastoreio, dizem especialistas
Não é qualquer cão que pode trabalhar no campo. Há raças que são específicas para isso e que respondem melhor aos treinamentos.
“Tem a ver com o instinto do animal. No caso do border collie, ele gosta de cercar; faz isso com carro e moto, se deixar. Então, ele se torna mais fácil de trabalhar”, diz o especialista em comportamento animal Alexandre Rossi, conhecido como Dr. Pet, que já apresentou quadros sobre animais domésticos em diversos programas de TV.
Além do border collie, Rossi destaca como cães pastores as raças kuvasz e puli, as duas com origem húngara. O kuvasz (pronuncia-se "cúvas") é um cachorro grande, de pelo branco e muito valente; o puli tem porte médio, e chama a atenção por seus pelos longos e "crespos".
“No caso do puli é engraçado porque ele tem o pelo parecido com o das ovelhas e acaba se camuflando no rebanho. Quando aparece um predador, o cão dá um susto nele”, afirma.
Os predadores podem ser onças de pequeno porte, jaguatiricas, cachorros-do-mato e até outros cães, que são afastados pelo pastor. O treinador Santos ressalta que a raça border collie não faz este trabalho, apenas cães maiores, como o kuvasz e o maremano abruzês, cão de raça de origem italiana, de pelos brancos.
Além dessas raças, Leandro dos Santos destaca outras duas uitilizadas para o pastoreio no Brasil: australian cattle dog, chamado também de boiadeiro australiano, e kelpie.
O treinador afirma que, entre as raças, o border collie é a mais completa para pastorear, apesar de não defender os bichos de outros animais. “O australian cattle serve mais para gado e é mais de tocar o rebanho, assim como o kelpie. O border é tanto para ovelha quanto gado e, além de tocar, também consegue reunir os animais”, diz.
Treinamento com cão começa aos seis meses de vida
Julio Cesar Simão, da escola Minas Border, localizada em Piranguçu (MG), treina cerca de 15 cães por ano, tanto para trabalhar no campo quanto para participar de competições que simulam as condições de pastoreio. O treinamento é igual nos dois casos, já que as mesmas habilidades são testadas.
Simão afirma que o animal deve começar a se acostumar com o rebanho quando tem seis meses de vida, em média. “O início é sempre feito com ovelhas, que formam um rebanho mais fácil de lidar; é quando são testadas as noções de obediência do cão”, afirma.
Depois dessa fase, com cerca de um ano de vida, o cão já pode começar a trabalhar e ser treinado com comandos de apito ou de voz. “Ele precisa ter estrutura física e mental para o trabalho, precisa estar sempre atento. Um filhote de seis meses não tem isso”, diz.
Além de treinar os cães, Simão também tem um rebanho de gado em suas propriedades e usa o border collie para arrebanhá-lo. “Um cachorro consegue cuidar de até 100 cabeças de gado”, diz.
O especialista em comportamente animal Alexandre Rossi, que já trabalhou com este tipo de treinamento na Austrália, afirma que o treinamento dos cães consiste em desenvolver o instinto de pastorear que o animal já possui. “É um trabalho que tem que ser natural. O estilo que cada raça tem de pastorear é genético e isso deve ser levado em consideração”, afirma.
Isso quer dizer que cães vira-latas, por exemplo, seriam mais difíceis de desempenhar bem o trabalho. “Só se ele tivesse a sorte de ter entre seus ascendentes um border collie, por exemplo. Não adianta nada se o animal não tem esse instinto de pastorear. Só o contato com os bichos não é suficiente”, completa Leandro dos Santos, da Appas.
De acordo com ele, os cães pastores ainda não são tão utilizados em fazendas aqui no Brasil porque há o mito de que o animal precisa ser agressivo com o rebanho. "O animal precisa conduzir com tranquilidade e é treinado para isso", diz.
Cuidados com os cães incluem vacinas e alimentação adequada
Como todo trabalhador, os cachorros utilizados no campo também devem ter alguns direitos garantidos. Entre eles está a vacinação em dia, visitas periódicas ao veterinário e uma alimentação balanceada, com ração de boa qualidade.
De acordo com a veterinária Janaína Reis, do Mister Vet Centro Veterinário (SP), é preciso cuidar para que o animal não se contamine com as fezes do rebanho e para que não tenha problemas nas articulações, já que se movimenta bastante.
“É preciso fazer o controle de parasitas, como carrapatos e pulgas, e ele deve ser examinado por um veterinário de seis em seis meses”, diz.
Sobre os períodos de descanso, Janaína Reis alerta para a necessidade de o cão ter pausas de descanso e tomar conta dos rebanhos no máximo por seis horas diárias. “As pausas devem ocorrer a cada duas ou três horas de trabalho, e é importante sempre oferecer água ao cão. Sobre a alimentação, ela deve ter alto valor energético”.
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