Gigantes do agro apostam na ciência para driblar crise climática
Em uma lógica de que quanto mais se produz, mais se quer produzir - no caso, os grãos -, a crise climática tem se mostrado uma ameaça às estratégias de longo prazo das gigantes do agronegócio. Na velocidade em que o clima tem sofrido alterações, é desafiador prever a eficácia de sementes e defensivos químicos e biológicos no horizonte de décadas.
Se o mercado de eletrônicos tem a fama de pensar aparelhos com 'obsolescência programada', na agricultura é mais complicado. São milhões de dólares investidos, equipes de cientistas e agrônomos dedicados ao desenvolvimento de novas tecnologias, além de anos de aprovação regulatória. Logo, a pressão para driblar a perda de eficiência no curto período face às adversidades climáticas recai sobre a ciência.
Entre pesquisas em laboratório, descoberta de uma nova molécula e a criação do ingrediente ativo, Rodrigo Marques, diretor de engenharia e tecnologia de produtos da Syngenta, estima que são investidos cerca de US$ 200 milhões, ao longo de 10 anos.
Depois de tanto trabalho, é esperado que o produto tenha durabilidade, embora seja um paliativo à questão climática. No estilo: aprender a conviver com o problema em vez de solucioná-lo. É como tomar remédio para um problema de saúde, mas não necessariamente perseguir causa e prevenção.
É fato que, em clima tropical, o vai e vem entre estiagem, enchentes, calor, geadas e umidade resulta na maior incidência de pragas e doenças no campo brasileiro - e, então, fomenta-se o ciclo de mais sementes e defensivos resistentes. Custe o que custar. Afinal, o agro no Brasil se vangloria de estar entre os maiores produtores globais de commodities.
Não por acaso, a Syngenta trouxe para o país o maior Centro de Tecnologia e Engenharia de Produtos da companhia no mundo. Há outros seis, nos Estados Unidos, Inglaterra, Suíça, China, Índia e Singapura. No município de Paulínia, interior de São Paulo, a multinacional suíça investiu R$ 65 milhões para a construção do prédio que contém seis novos laboratórios.
"Boa parte da iniciativa desse centro é para ampliar a capacidade de ampliar portfólio, aumentar em 35% mais soluções dentro do ano", diz Marques. Somente esse ano, na fábrica paulista, serão 200 milhões de litros produzidos entre fungicidas, pesticidas, herbicidas e nematicidas.
A Bayer também tem se desdobrado para manter a eficácia da tecnologia das sementes. De acordo com Fernando Prudente, líder de Produtos de Soja e Algodão da divisão agrícola da companhia, desenvolver e entregar um novo OGM no mercado requer em média 16,5 anos - metade disso somente para aprovações regulatórias. São US$ 115 milhões e 37,6% destes custos são para fins regulatórios.
Ele conta que a biotecnologia da Bayer para modificar organismos geneticamente está presente no Brasil há 25 anos. "91% da soja plantada aqui tem biotecnologia", diz.
Para manter esta hegemonia entre os produtores rurais, o objetivo é incentivar o consumo de novas versões de proteínas modificadas - sobretudo, para adaptação climática. Prudente estima que uma nova geração de biotecnologia para a soja seja lançada no mercado na safra de 2027/28.
A questão dos organismos geneticamente modificados é tratada pelo Protocolo de Cartagena, que será debatido na COP16, Convenção da Diversidade Biológica da Organização da Nações Unidas, realizada entre 21 de outubro e 01 de novembro, na Colômbia. No âmbito do protocolo, são discutidos os possíveis efeitos adversos dos transgênicos à biodiversidade do planeta.
Há de se considerar que cerca de 40% da produção agrícola global é atualmente perdida por causa de pragas, segundo dados da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO). Já as doenças impactam a economia global em mais de US$ 220 bilhões anualmente. Neste sentido, seria melhor prevenir do que remediar. Entretanto, tem quem lucre.
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