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Carlos Juliano Barros

REPORTAGEM

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Projeto de Onyx para jovens tira emprego de quem precisa, diz sociólogo

Recém-empossado Ministro do Trabalho, Onyx Lorenzoni planeja programa chamado de "alistamento civil voluntário" - Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Recém-empossado Ministro do Trabalho, Onyx Lorenzoni planeja programa chamado de "alistamento civil voluntário" Imagem: Fábio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

03/08/2021 04h00

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Espécie de programa de primeiro emprego para jovens, o "alistamento civil voluntário" anunciado pelo recém-empossado Ministro do Trabalho, Onyx Lorenzoni, pode prejudicar pessoas sem ocupação de outras faixas etárias que necessitam de uma oportunidade.

Essa é a avaliação de Adalberto Moreira Cardoso, sociólogo e professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), em entrevista exclusiva à coluna.

Ainda não há um desenho claro de como funcionaria o alistamento civil voluntário - tampouco há previsão de entrada em vigor. No entanto, as linhas gerais do projeto vieram à tona na semana passada, com a oficialização do nome de Onyx para o ministério recriado.

A ideia é lançar uma base de dados para casar a oferta de postos de trabalho feitas por empresas com a demanda de jovens entre 18 e 24 anos em busca de inserção no mercado. Não haveria vínculo empregatício formal.

Uma vez aprovada, a medida pode gerar uma oferta de mão de obra barata e desestimular a contratação de trabalhadores que não se enquadram no perfil do programa, alerta Cardoso.

Com clara inspiração militar em seu nome, o alistamento civil voluntário segue a tese defendida pelo Ministro da Economia, Paulo Guedes, de que é preciso baratear a contratação por parte das empresas para incentivar a geração de postos de trabalho.

"A política de empregos do governo é desregular o mercado de trabalho. É isso que eles acham que vai gerar emprego", afirma o sociólogo. "Mas nós sabemos que isso não gera emprego. O que gera emprego é crescimento econômico", completa Cardoso.

Confira abaixo a íntegra da entrevista.

Como o senhor enxerga a recriação do Ministério do Trabalho e a nomeação de Onyx Lorenzoni para o comando da pasta?

Eu vejo isso só como uma jogada política. O presidente não tem apreço pelo trabalho organizado. E o Ministério do Trabalho era um player muito importante nas relações de trabalho do Brasil. Ao submetê-lo ao Ministério da Economia, o Bolsonaro deu um sinal. Então, [a recriação] foi pura e simplesmente uma medida para acomodar o Centrão. Mais do que isso, acomodar o presidente do Progressistas - o famigerado PP.

As pessoas não se lembram, mas o PP foi o partido que mais teve políticos implicados no escândalo da Petrobrás. Mais que o PT, mais que o MDB. É um partido que está no centro dos escândalos de corrupção desde sempre. Como o Onyx não pode ser demitido e está até o pescoço envolvido com o Bolsonaro, o Bolsonaro tinha que arrumar um lugar para ele.

Até o presente momento, o governo não lançou nenhum programa de geração de empregos. Por que isso não está no centro da agenda?

A política de empregos [do governo] é desregular o mercado de trabalho. É isso que eles acham que vai gerar emprego. O Paulo Guedes está convicto disso. A grande política de emprego dele era a Carteira Verde Amarela [modelo de contratação com menos encargos para os empregadores e menos benefícios para os empregados]. E nós sabemos que isso não gera emprego. O que gera emprego é crescimento econômico. Mas ele acha que isso vai gerar crescimento econômico. Só que o que gera crescimento econômico é investimento.

Um dos planos anunciados por Onyx é a criação de um serviço de alistamento civil, uma espécie de programa de primeiro emprego. Qual é a sua avaliação?

Você tem que dar escola ou ocupação para as pessoas que estão em condição "nem-nem" [nem estudando, nem trabalhando]. O número aumentou muito nesta pandemia. Há quase 15 milhões de desempregados e uma proporção grande disso é de jovens. Algum tipo de programa é bem-vindo. Mas não um programa que tem esse nome estranhíssimo, em que você emprega uma linguagem militar para criar postos de trabalho. Essas pessoas vão trabalhar quantas horas? Isso não está claro. É um grande balão de ensaio.

Acho que seria mais produtivo, do ponto de vista do futuro desses jovens, colocá-los em programa de qualificação profissional. Há muito recurso estatal e privado no Brasil para constituição de programas decentes de qualificação profissional. Eu acho que o dinheiro seria mais bem empregado nisso do que dar subsídios a empresas para que elas contratem e explorem essas pessoas. Isso tira emprego de pessoas que precisam de emprego.

O ministro Paulo Guedes insiste em medidas de desoneração da folha de pagamento de funcionários das empresas para baratear a contratação e impulsionar a geração de empregos. Como o senhor avalia essa ideia?

Isso é pura ideologia. No período de 2003 a 2013, o Brasil gerou 21 milhões de postos formais de trabalho com um crescimento econômico de 3,5% ao ano, em média. E não se mexeu em uma linha na CLT. Não se reduziu nenhum direito trabalhista.

Você não gera emprego aumentando o lucro das empresas numa situação de baixo ou zero crescimento econômico. Nós estamos com um crescimento alto agora por causa do ponto de comparação com o ano passado. Teve uma queda muito grande no PIB no ano passado, qualquer crescimento dá um salto relativo muito alto.

Mas o que está acontecendo é uma ocupação de capacidade ociosa das empresas. Nós não temos mais uma indústria digna do nome. Os serviços estão retomando as atividades, mas teve uma quebradeira muito grande de pequenas e médias empresas ao longo da pandemia. Então, a redução do desemprego não vai acontecer no ritmo que o governo espera, e nem a geração de novos postos - mesmo que seja por esses programas subsidiados - tem potencial para gerar empregos suficientes para os jovens desempregados.

Por sinal, o modelo de desoneração de folha para alguns setores foi testado pela ex-presidente Dilma Rousseff e não deu certo

Foi um fiasco. O efeito foi o contrário. As empresas que não tiveram o benefício da desoneração suspenderam o investimento. Na verdade, nem as empresas que tiveram a desoneração aprovada investiram. Ninguém investiu.

O empresário joga com o horizonte de expectativas. Ele olha para frente. No caso da Dilma, a partir de 2015, você tem um processo de boicote do parlamento, liderado pelo Eduardo Cunha, a todas as políticas do governo.

Os empresários olharam para aquilo e disseram: "esse governo não vai a lugar nenhum". Mas a taxa de investimento já tinha começado a cair em 2014, em função dessas políticas equivocadas de desoneração - e de outras políticas também.

Onyx também anunciou planos de regulamentar o trabalho por aplicativos. O governo vai conseguir destravar esse debate?

Alguma regulamentação vai haver. O número de pessoas trabalhando por aplicativos está aumentando muito. Não sabemos se vai ser uma regulamentação no sentido de proteger os trabalhadores. Não devemos esperar isso de um governo que está tomando as medidas para desproteger os trabalhadores.

Todas as medidas anunciadas, exitosas ou fracassadas, foram de desproteção. Não só a Reforma da Previdência, mas a Reforma Trabalhista de 2017 que ainda não acabou - sempre tem uma Medida Provisória, um decreto presidencial, um cancelamento de alguma portaria que exista, tudo na direção de desproteção. Mas alguma coisa deve acontecer e esse debate deve pegar fogo em breve.